Um dos primeiros bairros da cidade carrega a imagem de perigoso e violento, porém, residentes discordam e estão cansados dessa taxação. Além disso, há problemas com recolhimento de lixo e falta de estrutura

Antigamente, quando Bento Gonçalves começava a se desenvolver, diversas localidades compunham a Vila Operária, que, ao longo dos anos, foi desmembrada e acabou se transformando em outros cinco bairros. Por conta disso, o Conceição é considerado um dos primeiros da cidade. O local já passou por fases mais turbulentas. Porém, moradores garantem que há anos a região está tranquila e é um bom lugar para se viver. Entretanto, a fama que ainda permeia é constantemente levantada por pessoas que sequer vivem no local. Em decorrência disso, moradores afirmam já terem sido vítimas de preconceito pela localização em que moram. Se não bastassem episódios como esse, há reclamação quanto o trabalho do Poder Público, principalmente em questões de infraestrutura e recolhimento de lixo.

Fabricio Pagliosa, administrador de 36 anos, vive há muito tempo na comunidade e discorda dos comentários feitos a respeito do bairro. “Não troco este local por nenhum outro. Os vizinhos todos se ajudam, quando um sai de casa o outro fica cuidando, é uma maravilha. É incrível viver aqui. Me sinto seguro. Às vezes meu carro fica aberto, e ninguém mexe nele. É muita gente que vê de fora e fala bobagem sobre, mas quem vive aqui é outro papo”, garante. “Antigamente, era mais perigoso e ficou uma fama, mas ninguém mexe em nada de ninguém”, explica.

Mas, para o administrador, existem problemas que necessitam de melhorias para que a população do bairro possa viver com qualidade de vida. “A estrutura e higienização das lixeiras são muito ruins. Há muito lixo pelo bairro, desde que foi mudada a forma do recolhimento. Também, muitas ruas sem calçadas que o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (Ipurb) não vem fiscalizar. Os carros estacionam em locais proibidos e fica difícil de passar no meio da rua”, alega.

Indianara da Rosa nasceu e cresceu no bairro, e também não vê os motivos das críticas ao bairro. “Moro há 30 anos e acho um bairro tranquilo, calmo. A vizinhança é legal, todos cuidamos da rua. Adoram falar que aqui é turbulento, mas não vejo isso. Acredito que esse estigma venha de pessoas de fora, que não conhecem o lugar. Tem vezes que esqueço o carro aberto em frente de casa e ninguém mexe. Outras vezes coloco roupa para secar do outro lado da rua e nunca tocaram em nenhum pertence meu”, salienta.

Ela entende que a comunidade toda é muito próxima, e que um ajuda o outro. “O bairro cresceu muito. Antigamente eram inúmeros terrenos, árvores, e agora temos muitas casas pelo local. Bastante gente de fora veio para cá. Acredito que é justamente pela vizinhança ser muito parceira, que as pessoas vêm morar aqui, é muito acolhedor. Já aconteceu de virem morar pessoas aqui só com a roupa do corpo, e em uma semana os vizinhos conseguirem mobiliar a casa deles”, garante.

“O bairro está abandonado”

José Bortolanza, 72 anos, vigilante, vive no Conceição há mais de quatro décadas. Sua filha Cassiana Bortolanza, de 38 anos, nasceu lá. Para ele, o lugar onde mora é ótimo e não vê traços da fama negativa que tanto falam. “Moro aqui há 42 anos e nunca tive problema nenhum, não troco por bairro algum. Antigamente aconteciam sim algumas coisas erradas, mas agora não existe isso mais, mas a fama ficou. E, por conta disso, ninguém quer morar aqui, mas quem mora não sai”, ressalta.
Sua filha relata situações que já passou por morar no bairro, como olhares maldosos. “É mais fama que o bairro tem, e sentimos preconceito de outras pessoas por morarmos aqui. Quando vamos no Centro e falamos que moramos no Conceição, tem gente que não entrega compras, e isso não é de hoje. Casas para vender também, geralmente só são compradas se a pessoa já vive no bairro”, aponta.

José Bortolanza afirma que o bairro não é como falam, porque se fosse, não teriam tantos moradores antigos, assim como ele

Bortolanza afirma que os moradores são antigos e, em sua maioria, pessoas muito tranquilas. “Nossos vizinhos são de anos e são todos gente boa. Nós vivemos praticamente a vida inteira aqui, então quem mora gosta e fica. Sempre me senti seguro, tampouco tive problema com qualquer pessoa. Voltava de madrugada do trabalho, nunca fui assaltado, parado, simplesmente nunca me aconteceu nada”, menciona.

O que entristece os moradores é a falta de cuidado que o Poder Público tem com o local. “Há lugares com lixo acumulado. Nosso bairro é abandonado pela Prefeitura. Tem muita coisa para fazer, mas ninguém aparece. Teria que ter um cuidado para cá, até porque aqui está crescendo. Quando cheguei não tinha nada direito, era bueiro aberto e estrada de chão”, lembra.


Ivete da Silva, 54 anos, atualmente desempregada, mora na casa que a avó passou para mãe e, por conta disso, se criou no Conceição. “Não troco meu bairro. Podem falar mal, mas sigo vivendo aqui. Conheço todo mundo, e como em qualquer lugar, existem pessoas boas e ruins. Mas acredito que muito da fama, é porque somos um bairro de pessoas mais humildes. Em muitos lugares, se tu fala que é do Conceição, já te olham de cara torta. Já ocorreu de caminhão de fruta, de gás, não entrarem aqui”, recorda.

Moradores reclamam do lixo espalhado pelo bairro

Ela acredita que o Conceição, cada dia mais, carece de necessidades e melhorias para os moradores. E isso acaba interferindo na qualidade de vida. “Praticamente todo bairro está abandonado pela Prefeitura. Tiraram a lixeira de frente para a igreja, e o que vemos é lixo por toda parte daqui. O postinho também, que abrange quatro bairros grandes. É muita gente para pouco espaço. Nos dão seis fichas por dia, chegamos às seis da manhã e já não conseguimos pegar. Todos os funcionários estão cansados, porque é muito trabalho para pouca gente”, lamenta.

Ivete complementa que além dos problemas na estrutura, o transporte público tem deixado a desejar. “Os horários de ônibus são bem precários. Trabalhei 12 anos no Centro e durante todo esse tempo eu ia a pé, porque meus horários nunca fechavam com meu emprego. Sempre foi ruim assim, mas acho deveríamos nos unir e ir atrás dos nossos direitos”, conclui.

Mairi da Silva, 70 anos, aposentada, passou sua vida no Conceição, e explica quais melhorias são necessárias para a localidade. “A questão do lixo está nos incomodando muito. Estamos tendo problemas, pois agora precisamos colocar o lixo em frente as casas. No entanto, há famílias fazendo o descarte corretamente e outras não. Há também o problema das ruas muito estreitas, sem saída, e o caminhão não consegue acessar”, declara.

Mairi da Silva lista pontos positivos no bairro como acessibilidade e boa vizinhança

Sobre o estigma que o local carrega, Mairi demonstra não compreender tão bem, já que seus vizinhos moram há anos no local. “O Conceição tem moradores muitos antigos. Claro que tem acessibilidade para trabalhar, então isso é um dos motivos para se tornar bom de morar. Seguido passam pessoas perguntando se há locais para alugar, e a verdade é que quem mora no bairro não pensa em ir embora”, sustenta.

Luciana dos Santos, de 45 anos, tem como sua maior crítica a situação dos lixos por conta das mudanças que ocorreram. “O recolhimento do lixo às vezes peca, não pelos coletores, mas por conta das ruas serem estreitas e cada morador ter um carro, então eles não conseguem acessar a rua”, conta.

Luciana dos Santos explica que pelas ruas do bairro serem estreitas, em sua visão, é difícil os coletores as acessarem

O que diz a prefeitura

Em conversa com os moradores, a lixeira do local foi retirada pois acumulava muito lixo e poderia ocasionar o surgimento de doenças. A partir daí iniciou a coleta porta a porta, onde o morador deve deixar na frente da casa. 
Conforme a RN Freitas, responsável pela coleta de lixo, os caminhões entram normalmente no bairro e nos espaços de difícil acesso os garis vão até o local coletar. 
A Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMAM), garante que deve reforçar a conscientização dos moradores para descartarem seus resíduos nos dias e horários corretamente, e não deixarem carros na rua nos períodos de coleta, pois segundo empresa, a via é estreita. A coleta no Conceição ocorre nas terças, quintas e sábados (orgânico); segundas, quartas e sextas (seletivo); e quartas (vidros).

Chapa “União faz a força”

Moradores antigos do Conceição decidiram que queriam seu bairro melhor, e por conta disso, montaram uma chapa para criar a Associação Comunitária do bairro. “A ideia surgiu porque todo mundo estava descontente com a antiga associação. Resolvi reunir pessoas que tinham vontade e montamos a entidade, mas demorou em média de três meses para organizar e legalizar tudo. Desde dezembro estamos como Associação Comunitária do bairro Conceição”, destaca, o presidente da Associação, Cledson Francisco da Silva, de 40 anos.

Um dos maiores motivos de Silva liderar o processo foi ver como o bairro que tem tanto apreço vinha sendo tratado nos últimos anos. Assim, 12 moradores se uniram e decidiram fazer a diferença. “Estava tudo abandonado. Nossa comunidade é um dos bairros mais antigos da cidade e o que menos tem benefícios. Não temos ginásio para jogar futebol, não temos quadra de esportes. Além disso, recebemos muitas queixas de sujeira, pois tiraram a lixeira. É falta de coleta e aí as calçadas ficam todas sujas”, aponta.

Ele finaliza explicando como funciona a chapa e como cada um destes 12 integrantes age. “Como nos criamos juntos no bairro, todo mundo se dá bem, e a partir do momento que traçamos um objetivo, que seja de necessidade do bairro, cada um vai correr atrás de uma parte. Decidimos em reunião a tarefa de cada um e o responsável já vai atrás”, conclui.

Escola Infantil recebe ampliação após alta demanda

A Escola Municipal de Educação Infantil Primeiros Passos precisou aumentar o prédio para abrigar a alta demanda do bairro. “Hoje, estamos atendendo quatro turmas de 25 alunos cada uma, e em fevereiro iniciaremos os jardins, atendendo mais três turmas. Estamos em um processo de ampliação que iniciou ano passado e ficou pronta no final do ano. Quando totalmente finalizado este processo, teremos capacidade para atender em média 240 criança. Atualmente, temos 150”, pontua a vice-diretora Raquel Paulus.

Raquel Paulus é vice-diretora da EMEI Primeiros Passos

Ela explica que durante muito tempo os pais pediram por esse movimento, e no último ano ele pode ser realizado. “Por muitos anos a população pediu por isso, pois nunca havia vaga sobrando na escola, as turminhas estão sempre cheias. Isso vai desafogar essas necessidades, porque víamos pais que moram do outro lado da rua tendo que levar seus filhos até o Centro para uma compra de vaga porque aqui não tinham oportunidade”, indica.

Sobre a forma de ensino, Raquel conta que desde que a atual diretoria assumiu o educandário, que tem como diretora Andrea Sesca, a equipe vem buscando um ensino que desenvolva as crianças da melhor forma. “Estamos trabalhando bastante com a autonomia e independência deles. Outro projeto que estamos realizando desde que assumimos é a aproximação da família da escola. Para demonstrar para as famílias aqui do bairro a importância da escola na vida das crianças. Queremos que eles saiam daqui e tenham oportunidades incríveis depois”, finaliza.