Ontem esteve lá em casa um amigo e casualmente ele pegou um exemplar de Volta e Meia um Poema na Veia que marca minha estreia em livro no início dos anos 80.

Meu amigo quis saber sobre a foto na quarta capa do livro em que faço pose empunhando um violão da marca Tonante. O momento foi registrado pelo fotógrafo Bebber.

A história é bem curtinha, se puder me acompanhe. por favor…

De repente, quebrei o cofrinho, no qual guardava as moedas que desenterrava nos vãos dos paralelepípedos da rua e as que ganhava do padrinho e da vovó. Com a grana toda, comprei o violão meio detonado do colega de escola Nadir que ele não usava mais para coisa alguma, sequer para decorar a parede de seu quarto.

Sem ajuda de professor nem de ninguém, aprendi a tirar os acordes básicos de cada tom da escala e alguns ritmos, como rock and roll, blues, country, fox-trote, guarânia, balada e outros.

Fascinado com a música, escrevi meia dúzia de canções, com as quais supunha que faria um sucesso absurdo e me levariam ao topo das paradas. Seria um cantor famoso, mistura de Roberto Carlos com Caetano Veloso e John Lennon. Imaginava a Laurinha e uma multidão de pessoas gritando meu nome em frente à suíte presidencial do Copacabana Palace.

Ainda lembro um trecho de uma das canções:

… Sempre o mesmo rio / nunca as mesmas águas

Sempre o mesmo caminho nunca o mesmo chão

Sempre o mesmo choro / nunca as mesmas mágoas

Sempre a mesma fome / nunca o mesmo pão

Sempre o mesmo palco / nunca os mesmos atores

Sempre o mesmo coração / nunca os mesmos amores…

Achava que a minha vida logo se resumiria a fama, dinheiro e mulheres.

Pensava que viveria sob os holofotes da fama e seria implacavelmente perseguido pelos paparazzi.

Acreditava que com o sucesso todo, a grana pingaria sem parar na minha conta bancária. As grandes gravadoras brigariam a tapa pelo meu passe.

Não teria ampla liberdade para sair às ruas a hora que quisesse. Nada disso. Seria incensado pelos críticos musicais e viveria dando autógrafos para milhões de fãs enlouquecidas ao redor do mundo. Seria bajulado do porteiro ao presidente e teria bandos de garotas histéricas gritando meu nome e beliscando minha bunda no meio da rua, em plena luz do dia.

É claro que sendo um cantor de sucesso teria de ficar o dia inteiro respondendo às mesmas perguntas:

– Como tudo começou?

– Como foi sua infância?

– De onde você tira as ideias para suas canções espetaculares?

– Quanto tempo você leva para escrever uma canção?

– Como você se sente sendo uma celebridade?

Todavia, em um dia de triste lembrança, cometi a besteira de gravar minha própria voz em um desses gravadores portáteis movidos à manivela, concluí que a música não me levaria a lugar nenhum.

Caí em mim, o que foi ainda melhor do que cair do décimo-sexto andar de um edifício. Não demorou nada para descobrir, muito a contragosto, que o meu ouvido musical era tão duro quanto uma parede dupla de tijolos.