Alguns surtados, outros acostumados. De um jeito ou de outro, estamos desacreditados de um amanhã promissor. Não foi a precursão do inverno que trouxe o frio. A alma está gelada, aquecemo-nos com os sete pecados, “mas só até a quarentena acabar”.
Dizemo-nos que é correto permitirmos o afogamento nas próprias mágoas, porque é difícil estar tanto tempo sozinhos (re)descobrindo dores que não queríamos. É tempo de cutucar as feridas mal saradas, como uma terapia forçada. Mas quantos mudam quando vão para a terapia?

A gula virou melhor amiga, não é mais um bicho de sete cabeças. É a melhor desculpa para engolir as emoções, “já que o mundo vai acabar mesmo”. Vamos morrer de coronavírus ou de congestão?

Alguns estão compreendendo o valor das coisas que não se pode comprar. Outros, vivem a avareza que nem tentou se esconder, apesar das toneladas de bondade. Seria uma espécie de purgatório da fama para os que fecharam as portas da oportunidade aos menos favorecidos, outrora?

A luxúria ganhou espaço nesses dias de carência e solidão. “O prazer não é pecado”, disse eu. Mas a procura desenfreada por uma companhia teria o mesmo alvo, se pudéssemos viajar, dançar e buscar um novo olhar, procurando um rosto para nos iludir?

O sentimento exagerado de justiça vira cólera, muito além do que se pode chamar de vingança. O pecado da ira destrói tudo e todos. Gritos internos. Sentimentos à flor da pele. Medo recorrente do que pode acontecer no próximo minuto. A desculpa é sempre a mesma, o mundo vai acabar. Preconceito, intolerância, arrogância. Alguém sempre sai ferido (ou morto) com atitudes de quem preferiu cultivar esses sentimentos.

O invejoso ignora suas próprias bênçãos. Vive a pensar no que não tem e esquece de agradecer o que está à sua mesa. Ainda mais agora, onde olhamos para todos que não precisam se preocupar a curto prazo com seu ganha pão e não conseguimos pensar em coisas que não acontecem perto de nós, em todos que estão na linha de frente no combate ao coronavírus, em quem perdeu um ente querido, em quem está lutando para salvar sua própria vida. É mais fácil reclamar com o ar condicionado ligado e uma taça de vinho na mão.

Quem não está na corrida pelos filmes novos que atire a primeira pedra. Esperemos a pandemia passar. É hora de comer, assistir e flertar no direct. O urso-negro está morrendo de inveja com a capacidade de hibernação do ser humano. Coincidente, fantástica e pertinente colocação. Pretencioso também, mas é preciso lembrar que nem todas as espécies de ursos hibernam.

Orgulho. Foi o primeiro pecado cometido pelos seres humanos. “É um pecado inconsciente. Ninguém tem mais orgulho do que aqueles que pensam que não tem nenhum”. Se é tempo de rever conceitos e ir atrás do que você quer, errado não ‘tá’. Mas esqueça o orgulho, porque se você está precisando fazer isso, é porque viveu nele até então.