As movimentações relacionadas à instalação dos dois empreendimentos de grande porte no Vale dos Vinhedos seguiram nesta semana em Bento Gonçalves. Nesta quinta-feira, 31 de março, a Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale) lançou uma nota reiterando seus argumentos em defesa do desenvolvimento sustentável da localidade. Além disso, na quarta-feira, 30, o presidente do Conselho de Planejamento Distrital e subprefeito do Vale, Marciano Batistelo, pediu exoneração do cargo que ocupava na prefeitura desde junho de 2016.

Em conjunto com a nota, a Aprovale lançou um abaixo-assinado direcionado ao prefeito, Diogo Segabinazzi Siqueira, solicitando as manutenções do cargo de subprefeito de Batistelo, do Conselho Distrital e do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural (Compahc).

De acordo com o documento, os conselhos seriam os “canais legais e públicos para livre manifestação sobre as questões do território no qual residimos e trabalhamos para sustentar nossas famílias e gerar progresso sustentável. Antes de ser um destino turístico, esta é a região da nossa cultura vitivinícola, terra de nossos antepassados e de nossas futuras gerações. Rogamos ao Sr. Prefeito Diogo jamais permitir que nossa voz seja silenciada ou nosso voto seja amputado”.

O prefeito de Bento Gonçalves, Diogo Segabinazzi Siqueira, confirmou que Administração Municipal recebeu o pedido de demissão do subprefeito. “Não era este o nosso desejo, mas respeitamos a sua decisão pessoal”, declarou o gestor.

Marciano Batistelo se posiciona sobre o assunto

Em entrevista ao Jornal Semanário, Batistelo esclareceu quanto a formação do Conselho Distrital do Vale dos Vinhedos. “O conselho é composto por dez membros: três representantes da Prefeitura e sete de entidades locais, sendo alguns empreendedores de restaurantes, hoteis e similares. Isto ocorre porque o Vale é um destino enoturístico, composto prioritariamente por vitivinicultores, trabalhadores e empreendedores do setor do turismo. Portanto, é natural que os membros do conselho exerçam estas atividades. O fato de um conselheiro, de qualquer entidade, estar no mesmo ramo de negócio de um projeto analisado, não o desqualifica, muito pelo contrário, aporta voluntariamente o conhecimento técnico que o grupo necessita para corretamente avaliar projetos. Enfatizando que apenas três conselheiros são ligados ao ramo de hospedagem”, aponta.

Quanto à avaliação dos projetos, ele aponta que está de acordo com os motivos apontados na íntegra em nota pela Aprovale:

– os projetos apresentados não foram apreciados como incorporação imobiliária e sim como hotelaria, dado que os índices de impacto diferem entre tais atividades;

– os projetos excedem em escala (de construção e de operação) à infraestrutura disponível no Vale dos Vinhedos e reduzem a área destinada à atividade vitivinícola dentro da demarcação da Denominação de Origem;

– o IPURB atendeu a ofícios de um particular e um parlamentar para liberar a divulgação de atas e áudios do Conselho sem que estes estivessem devidamente finalizados e aprovados por seus membros. Independentemente, o acesso à íntegra dos áudios, por si só, comprova a ausência de qualquer inconformidade no processo de votação dos referidos projetos.


Relacionado à causa do pedido de desligamento, ele elucida: “os fatos decorrentes após essa reunião é que me levaram a pedir desligamento do cargo. Por ocupar um cargo de confiança da Prefeitura fui contra o interesse do IPURB, Câmara de Vereadores e do próprio prefeito, mas fiquei do lado da minha comunidade, do meu Distrito e de tudo que o Vale dos Vinhedos representa para Bento Gonçalves. No entanto, agradeço todo esse tempo de aprendizado junto ao governo”, expõe.

Ele também explica o não comparecimento na sessão ordinária na Câmara de Vereadores na última terça-feira. “A minha presença não era obrigatória por lei, sendo que o conselho é deliberativo tendo poderes suficientes para não aprovar os projetos. Essa convocação foi feita somente a mim, por ser presidente, e a mais nenhum membro do Conselho. Nessa oportunidade, conselheiros foram atacados na sua integridade e aqui é preciso ter muito cuidado pois tudo está gravado. Não é minha intenção, mas se preciso for, acionarei a justiça, pois muito do que foi dito naquela oportunidade se qualifica como crime contra a integridade dos conselheiros”, frisa.

Batistelo finaliza ressaltando que está certo quanto à sua posição. “Estou muito tranquilo com meu posicionamento e de certa forma feliz, pois tudo isso gerou um movimento de união dentro do Vale dos Vinhedos pela preservação da nossa cultura, da nossa história e de nossas paisagens. Muitas entidades, associações e conselhos têm manifestado seu apoio, inclusive de outros países. Estou certo de que fiz o que era correto e dentro da lei e estou recebendo o apoio de inúmeras pessoas. Sou a favor de um desenvolvimento sustentável, não sou contra a geração de empregos e renda. Acredito que esses empreendimentos são muito bem-vindos a Bento Gonçalves, mas em outras áreas que não sejam dentro da Denominação de Origem”, conclui.

Autoridades também se manifestam sobre o tema

Em meio aos impasses, algumas autoridades e empresários de Bento Gonçalves se posicionaram sobre o assunto:

“Em relação à implantação de novos empreendimentos no Vale dos Vinhedos, as análises de solicitações encaminhadas ao Município precisam ser feitas sob a ótica técnica e legal, dentro do que determina o Plano Diretor. É assim que a Administração vem conduzindo suas ações. O debate social sobre o desenvolvimento do Município é salutar e necessário, mas precisa ser feito com respeito e responsabilidade para que seja eficaz”, opina o prefeito de Bento Gonçalves, Diogo Segabinazzi Siqueira.

“O momento deve ser de calma e todas as partes e de análise conjunta dos projetos atuais e do que se pretende no futuro para os próximos e para toda cidade. O Bento+20, através de minha pessoa, já se prontificou junto ao Conselho distrital, ao presidente da Comissão da Câmara de vereadores, ao Prefeito Municipal e à Aprovale de ser o possível articulador de uma solução mediada, sem envolvimento da justiça. Acredito que sempre se possa construir melhores soluções quando sentamos ao redor de uma mesa para debatermos os problemas. Temos que fazer como Bento sempre fez: olhar para o futuro, em conjunto, debatendo diretamente entre os envolvidos”, salienta o presidente do conselho Bento+20, Adelgides Stefenon.

“Sou absolutamente favorável a qualquer empreendimento que venha promover o desenvolvimento econômico e a geração de empregos para a nossa gente. Obviamente, desde que compreendam e estejam alinhados com nossa vocação turística. Estando dentro da legislação vigente, que é uma legislação extremamente protetiva à nossa paisagem vitícola, à nossa identidade cultural, preservando a linha do horizonte, parreirais sendo plantados e não suprimidos, sou absolutamente favorável. Ao que me parece, os projetos que foram apresentados promovem não apenas a proteção das nossas paisagens e dos nossos destinos como também incentivam a melhoria do nosso querido Vale dos Vinhedos”, ressalta o ex-prefeito de Bento Gonçalves, Guilherme Pasin.

Relembre o caso

Os projetos BeWine Resort e Gramado Park (liderado pelo Grupo Salton) não foram aprovados pelo Conselho de Planejamento Distrital em razão dos impactos sociais que as instalações provocariam no roteiro turístico. Os projetos haviam sido aprovados pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (Ipurb), que apontou que ambos estavam de acordo com o Plano Diretor.

Na segunda-feira, 28 o vereador Anderson Zanella (PP) apresentou na Câmara um projeto de lei que retira o poder deliberativo (de tomar decisões) do Compahc e o torna consultivo. Já terça-feira, 29, a Comissão de Infraestrutura, Desenvolvimento e Bem-estar da Câmara Municipal de Vereadores, liderada pelo vereador Anderson Zanella, solicitou a anulação das decisões da reunião do Conselho Distrital que vetou os empreendimentos, e pediu a suspensão do alvará de construção do Castelos do Valle, que, por considerar que tem características semelhantes às dos empreendimentos vetados.

O vereador aponta que o desejo da comissão é que a lei seja cumprida. “Os pedidos foram encaminhados para o Ministério Público e para a Prefeitura. Vamos estar acompanhando para que seja feito um processo mais transparente possível. A Comissão quer que a lei seja respeitada por todos, ou seja, o Conselho Distrital não tem o poder de vetar o que está dentro da legislação. Ele pode exigir as medidas mitigatórias. O conselho teria poder de veto se fosse uma indústria, uma indústria poluente, porque o Plano Diretor não contempla esses empreendimentos no Vale. Então é nesse sentido que a gente se posiciona. O Plano Diretor do Vale dos Vinhedos já é restritivo ao extremo justamente por ser uma região totalmente turística e que tem que preservar a Denominação de Origem. Então se mesmo sendo totalmente restritiva, os empreendimentos atendem a essas questões, não tem o porquê o veto”, ressalta Zanella.