Fui tomada por estranha preguiça existencial. Cansei das dores. Das grandes às miúdas. Dos naufrágios no Mediterrâneo às cutículas assassinadas por meu alicate sem fio.

Debruçada na janela, apoio meu cansaço. Procuro no cinza do dia, uma pergunta às respostas que se acumulam nos noticiários. Nada a questionar. Tudo é tão evidente, explícito. Só não vê quem não quer. Até o inverno se mostra em pleno outono…

Baixo os olhos resignada. E então os vejo: pequenos, imóveis e mudos. As coisas andam difíceis também para os “sem chão”. Estão atordoados. Nem saltitam como é de seu costume. Coitados! Sob o ponto de vista deles, o mundo desabou.

E quem vai se importar com o ponto de vista dos quero-queros? Podem os bicudos querer alguma coisa? Reivindicar o campo que foi cimentado, gradeado e povoado? Pedir a revisão do plano-diretor aos órgãos (in)competentes? Acho que eles intuem sua “desimportância” no cenário, por isso o bico fechado.

Melhor puxar a cortina. A exposição excessiva às mazelas desencadeia problemas de equilíbrio. Labirintite. Se bem que a Terra, girando sem parar, dá o que pensar… Será que não tem culpa mesmo???
A ordem é relaxar! Inspirar inflando o abdômen e expirar. Mas esta droga de rinite me impede de fazer o exercício corretamente. A narina esquerda vive inchada, que nem a folha do Estado, o que me obriga a respirar em parcelas…

A solução é ir para fora. Buscar um lugar ao sol. Armazenar humor e oxigenar os pensamentos contaminados pela politicalha – chega de mensalões, petrolões, cuecões, evasões, prisões, bilhões, operações, investigações, facções, camburões, ladrões… Prefiro canções. Anos 60, 70, 80… “Al di lá delle cose più belle/Al di lá delle stelle, ci sei tu…”
Aquietar a mente. Tarefa difícil impedir que os pensamentos negativos a escravizem. Falam que é mais fácil governar um país do que manter as rédeas do pensamento. E no caso do Brasil???

Melhor fazer uma fotossíntese espiritual. A luz opera milagres. Ou é o próprio milagre… De repente, pegar carona de um raio de sol e voar, voar, voar… Ou então fazer que nem os quero-queros: acampar em cima dos telhados.