Advogado, contador e empresário, conta sobre sua atuação no meio público e privado e aborda temas como inovação, legislação, política e mercado

Advogado, contador e empresário, Marcos Fracalossi é natural de Bento Gonçalves e tem trilhado um caminho de sucesso, no âmbito público e privado. Ele é casado com Raquel Rossatto e pai de Maria Eduarda e João Vitor. Sua trajetória profissional iniciou na propriedade rural de sua família, onde por 18 anos trabalhou no cultivo de parreirais. Era com a venda do leite extraído das vacas que criavam em São Valentim, que Fracalossi conta que pagava seus estudos e os de suas irmãs.

Com 18 anos, conseguiu seu primeiro emprego em uma empresa produtora de biscoitos da cidade, onde permaneceu por um tempo e conheceu seu primeiro sócio, que era seu chefe na época. Junto com Aldo Antônio Signor, em 1995 fundou um escritório de contabilidade. Em 2001 inaugurou a Real Assessoria Empresarial, que atualmente conta com mais de 60 colaboradores, entre funcionários, sócios e parceiros. Além disso, Fracalossi também é sócio proprietário da empresa Fracalossi Advogados e da RH Talentos.

O contador atuou também como secretário municipal de Finanças de 2013 a 2016. Foi membro de diretorias da Fenavinho e colaborou com a fundação do Observatório Social de Bento Gonçalves e do Projeto Leãozinho do Bem. Além disso, atuou como conselheiro suplente do Conselho Regional dos Contadores do Rio Grande do Sul e da Cooperativa de Crédito Sicoob Meridional. Atualmente participa ativamente de diversas entidades, como vice-presidente do projeto Mão Amiga e do Clube Esportivo.

Atuação na Real

Fundamos a empresa em março de 2001, então logo estaremos completando 22 anos. Sou oriundo de um outro escritório que o meu antigo com seu Aldo Antônio Signor que foi quem me ensinou bastante coisa, infelizmente falecido. De lá para cá, começamos uma empresa com outro foco, querendo algo mais abrangente.

O tempo passou e se firmou a ideia de que precisávamos ser uma assessoria empresarial baseada na contabilidade, uma ciência maravilhosa de gestão, que traz muita informação, conseguindo registrar com uma precisão ímpar todos os fatos de uma empresa, mas também nos dá muitos elementos para projetar os negócios, o futuro empresarial.

E “Real Assessoria” tem um nome sempre atual. Escolhemos o nome com três pilares básicos que a representam. E escolhemos “real”, porque seria uma empresa que trabalharia sempre com a realidade, que teria uma espécie de nobreza dos seus atos, e devido à moeda corrente nacional, que íamos conseguir mensurar tudo em valores monetários.

Em Conselhos

Isso é uma questão intrínseca, que acho que aprendi nessa caminhada. Precisamos destinar um tempo da nossa vida para comunidade. A gente não vive isolado e somos atingidos, digamos, no bom sentido, por várias frentes, seja social, política, esportiva, de segurança ou econômica. Sempre digo que a precisamos estar envolvidos e a gente se satisfaz. Temos que fazer essas coisas, mas não como algo que seja esperando algo em troca, fazer de coração, com muita vontade.

Na Secretaria de Finanças

Fui secretário municipal de finanças, desafio do qual sinto muito orgulho de ter feito, porque quando aceitei, me lembro bem que sempre tive esse discurso de “nós precisamos ajudar com a sociedade” e o prefeito da época, o Guilherme Pasin, e veio e me disse: “agora está na tua hora de colaborar com a tua cidade”. Enfrentei, abri mão um pouco das coisas particulares da empresa e fui me dedicar.

Aprendi muito. Quando saí, com essa experiência e vendo que, por exemplo, um ano que havia a possibilidade de os contribuintes destinarem R$ 8 milhões para o fundo da criança e do adolescente e tínhamos conseguido arrecadar somente 400 mil, ou seja 5% da capacidade. Vi que tinha algo de errado e que precisava ser feito alguma coisa. Comentei com os parceiros contadores, com o Sicoob Meridional, houve um fomento, e nasceu o projeto Leãozinho do Bem.

Lembro com muito carinho também do Observatório Social de Bento Gonçalves, que é um órgão que hoje orienta, fiscaliza as licitações do poder público municipal. Me lembro que, na época, cerca de 80% das licitações em Bento Gonçalves eram empresas de fora que venciam. E as empresas locais não vendiam. Essa falta de interesse das empresas para participar das licitações fazia com que os preços fossem mais caros, poucos concorrentes, produtos nem sempre de grande qualidade e, ao mesmo tempo, às vezes tinha alguns tipos de fornecedores que combinavam o preço. Em uma dessas andanças com o Daniel Amadio, presidente do Sindilojas, conversamos e fizemos o planejamento estratégico de qual era a viabilidade e a necessidade de recursos que precisávamos. Hoje ele está funcionando e é o papel dele ser muito discreto, porque não pode ser usado politicamente.

Clube Esportivo

Eu adoro esporte. Outra questão que acho que tem que ser destacada, tenho um orgulho enorme de Bento Gonçalves. Às vezes sou muito bairrista, inclusive. Quero sempre ver as entidades daqui estarem fortes, firmes. E sempre digo para as pessoas a gente precisa dar o que a gente tem de melhor, né? Gosto muito de ser contador e por que não dar o meu melhor para fazer os relatórios do Clube Esportivo e das outras entidades que a gente participa? É isso que faço e, particularmente, tenho muito orgulho.

Objetivos pessoais

Meus filhos, sem dúvida, Maria Eduarda e João Vitor. Um dos meus objetivos é dar uma educação de qualidade, uma formação com valores, que é o que hoje mais me desafia. Depois também quero também curtir muito a minha família, mas aí já um pouco como expectador, digamos assim, e quero ter uma tranquilidade nos próximos anos, inclusive financeira.

Mas digo que tenho outros filhos, que é toda a minha equipe e sei da minha responsabilidade, inclusive de conduzi-los. Sempre digo para todos, comecei muito simples e singelo, errei várias coisas e não quero que o meu pessoal cometa os mesmos enganos. Quero sempre compartilhar com eles e desejo que todos tenham muito sucesso. Uma coisa importante que tenho para mim é abrir oportunidades pra todos.

Legislação brasileira

A legislação brasileira, ao contrário do que grande maioria reclama, acredito que a gente precisa de cultura, para entender o porquê. Um exemplo, por que existe tanta burocracia para pagar imposto? Porque tem gente que sonega. Então é complicado. Os bons pagam pelos maus, mas estamos avançando, como o Código de Defesa do Contribuinte. Claro que estamos engatinhando, mas a sociedade precisa participar, necessita entender e daqui a pouco criar mais mecanismos que facilitem a vida dos bons pagadores. Acho que a gente precisa dar pequenos passos, não precisa coisas mirabolantes. A iniciativa privada e a sociedade civil precisam participar do poder público e dar a sua colaboração para que os entes públicos também avancem.

Militância política

Acho que plantei lá atrás uma vontade muito grande minha de levar para dentro dos órgãos a ideia de que precisávamos nos modernizar como ente público. Na época, em parceria com o CTEC (Coordenadoria de Tecnologia de Informação e Comunicação), conseguimos implantar a cultura de digitalização dos documentos, da redução do desperdício, da eficiência nos dados.

Particularmente, levei algo muito importante. Estar do lado de cada mesa, no balcão da iniciativa privada e estar lá, a gente passa a entender como é essencial o setor público, como ele necessita de eficiência, que a sociedade precisa participar, mas também uma coisa muito relevante, como tem gente competente. Quando talento escondido tem lá dentro, que não tem holofote e, às vezes, nem oportunidade, porque a própria legislação do servidor público, acho ela extremamente amarrada. Ela tem seus méritos, mas deveria ser flexibilizada para deixar esse povo voar.

Sobre transformação e inovação

Acho que é preciso estar toda hora se reinventando. Temos que esquecer aquele conceito, que inovação é tecnologia pura, que é só robotizar. Não é isso. Inovar é fazer o teu processo, aquilo que você faz hoje, melhor amanhã, de outra forma. Inovar é tirar as pessoas da zona de conforto. É quando dá aquele frio na barriga e você pensa “preciso me mexer”.

O frio na barriga, comento com nossa equipe, é muito bem-vindo. Não vamos nos assustar com ele, podemos fazer com que seja uma motivação para fazer melhor. Para ter inovação, na prática, é preciso reflexão. Se a gente for levar isso para a vida, todo momento que damos um passo adiante como pessoa, como ser humano, como profissional, é porque a gente parou, pensou e quis fazer algo diferente. Se levarmos isso para dentro das empresas ou entidades, não podemos nunca esquecer das pessoas. Inovar sim, processos, métodos e tecnologia, mas tem que ter capital humano e resultado.

A relação trabalho e capital

Esse é um grande desafio para todo empresário, para os líderes. Sempre digo que é a primeira coisa, me entendam bem a frase, é preciso “tirar o melhor das pessoas”. O que é isso? Se o cara é um bom motorista de caminhão, não queira colocá-lo como motorista de táxi. Cabe ao líder descobrir que ele é bom e ele é feliz na posição que ocupa.

A humanização das relações é fundamental. Valorizar, participar, estar aberto a sugestões e motivar a equipe para os objetivos é o que temos que fazer hoje. E valorizar não é só remuneração, é o ambiente, são as condições, são as relações do trabalho.

Quanto mais estudamos sobre inovação, mais vemos que as pessoas têm mais resultado a partir do momento que elas conseguem ter um alinhamento entre capital e trabalho. Nenhuma empresa se sustenta sem resultado. Mas nenhum negócio chega aos seus objetivos se não tiver pessoas e métodos positivos e modernos.

Desemprego e mão de obra qualificada

Acho que está na hora de olhar o que a gente pode fazer. Precisamos entender que todo mundo tem papel na formação. Não adianta colocar a culpa na universidade ou na escola. É preciso participar da sociedade, como ator, inclusive na formação. Se nós temos vagas, se temos oportunidade de trabalho e tem pessoas que não conseguem se enquadrar, precisamos chamá-las e conquistá-las.

Precisamos também continuar a conversar com os órgãos governamentais que mantém programas de inclusão social, porém é preciso que eles tenham uma porta de entrada e uma de saída.

O próximo governo, sabemos que tem uma linha de assistencialismo, que não é pecado. Mas ele precisa ter início, meio e fim. Se não, de novo, essa roda vai girar ao contrário, vai chegar nas empresas, que por falta de mão de obra não vão conseguir produzir ou prestar serviços e, por consequência, não vão gerar impostos. Não tendo arrecadação de imposto, o governo não vai ter dinheiro para sustentar essas verbas assistenciais. Quem vai sofrer? As pessoas mais carentes. Então nós precisamos aproveitar esse momento de alta e formar essas pessoas.

Visão sobre Bento

Felizmente despertamos para tudo que tem de bom e as belezas da nossa cidade. O turismo está bombando, tem muito espaço. Sou da colônia e na época, falar que eu era colono era muita vergonha. Hoje, colono é orgulho. Essa transformação é linda, é maravilhosa, ela tem que ser fomentada. Essa colônia, esse colono, que a gente tem que vender ainda mais, porque por trás disso tem muita energia, tem muitos valores pessoais, emocionais e culturais, tem muito trabalho, tem muita fé.

Com relação à indústria, ela tem uma capacidade extrema, uma inteligência de se adequar aos processos e as realidades. Então isso também é algo super valoroso. O comércio está dando uma sacudida, acho que é importante. Não temos que ter medo de concorrência. Então o segmento e Bento Gonçalves se abriram para lojas de fora, maiores inclusive, magazines e mercados, e acredito que isso tudo foi e é importante, porque acaba sempre trazendo cultura nova de comércio e o cliente passa a valorizar as experiências diferentes e tem o poder da escolha.

Do que Bento mais se ressente

Uma coisa que me preocupa é a violência, os fatos que certas facções escolheram a cidade e isso é delicado. Acho também que Bento precisa ter um avanço nos comércios de finais de semana, na parte noturna, e as atrações estão surgindo, mas precisam ser fomentadas. Acho também que tem que ter mais vida dentro na área central da cidade. O centro é bonito e a gente precisa ter uma visão um pouco mais ampla.

Precisamos, como bento-gonçalvenses, às vezes aceitar um pouco do incômodo que determinadas novidades nos trazem. Precisamos valorizar o que temos. Fico sentido quando ouço certas depreciações sobre nossos produtos, nossas pessoas. Sempre sugiro mais cuidado na crítica e muito mais liberdade no elogio. Ele faz bem, quando responsável.

Mudanças no Plano Diretor

Primeiro precisamos lembrar do contexto. Somos um município pequeno em tamanho geográfico. Temos 274quilômetros quadrados, é pouco território. Então assim, é quase que fatal, não podemos inibir que Bento cresça. Então nosso crescimento é vertical, porém sem perder nossa identidade visual. Então precisamos entender bem e melhor cada momento, cada região, cada prédio, mas a cidade não pode perder a sua essência. É fundamental portanto, respeitar os estudos técnicos a respeito e ouvir a comunidade.

Vale dos Vinhedos precisa manter sua essência. Só que precisamos receber possíveis novidades ou mudanças com mente aberta e menos críticas pré-estabelecidas. Não podemos chegar já criticando, porque vai ter um novo empreendimento, mas procurar dialogar e entender as motivações de um novo empreendedor e colocar à mesa nossa essência. Conjugar ambos e buscar alternativas para viabilizar os dois lados. Então penso que temos que ser menos polêmicos e mais construtivos de soluções.

Conselho aos jovens

“Acredita nos seus sentimentos e ouça os seus pais”. É preciso entendê-los, mas eles também têm que buscar um pouco da experiência, aquilo que a gente já viveu é importante. Os pais, os avós, tiveram propósitos que não sabiam, porque eles fizeram coisas não para eles, para nós. Se formos ver, eles quiseram construir cidades lindas, maravilhosas, desbravar os matos, mas eles nem colheram todos os frutos de seus esforços. Nós estamos colhendo. E hoje, estamos fazendo coisas para que nossos filhos colham os frutos. Então essa questão de fazer pelo bem dos outros é algo que os nossos jovens devem ouvir, como também nós podemos olhar para eles e aprender sobre crescer e construir, respeitando ainda mais o planeta, as pessoas e os sentimentos.

Fotos: Laura Kirchhof