As três principais escolas foram instaladas ainda no século passado. Comunidade se mobiliza e apoia os estabelecimentos de ensino em busca de melhorias

São Valentim é uma localidade do distrito de Tuiuty, a 10 quilômetros de distância do centro de Bento Gonçalves. A região cresceu bastante nos últimos anos, com o aumento do número de moradias, estabelecimentos comerciais e várias empresas, de diversos ramos de atuação. Mas uma de suas características mais antigas é a existência de escolas que foram instaladas, todas, há mais de 40 anos.
A primeira escola da região, chamada de Escola Pública do Caixão, é de 1899, quando iniciou a profunda ligação da comunidade com a educação. “Para a construção desta houve uma doação de terra por duas famílias daqui. Mas o ensino, na comunidade, antes, acontecia na casa canônica ou na moradia particular das pessoas. O espaço físico próprio é de 1947”, conta a diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental São Valentim, Marilei Anderle.

Ela diz que o educandário, por muitos anos, foi de competência estadual, e que por falta de alunos iria ser fechada. “Em 2022 houve a municipalização e o governo de Bento entendeu que precisava fazer um projeto piloto para atendimento integral dos alunos do Jardim, A e B. Deu certo e estamos com as portas abertas e ensinando até hoje”, comemora.

A mudança foi fundamental para dar visibilidade a uma nova forma de ensino e aprendizado. “Pensando socialmente, é uma oportunidade para as famílias, porque os pais que trabalham têm um lugar seguro para deixar suas crianças que são assistidas na escola, com um valor nutricional pensado por profissionais, entre vários outros aspectos, tudo de acordo com o que determinam as leis”, esclarece a diretora.

Além disso, a municipalização acabou fazendo com que mais alunos, da cidade e interior, passassem frequentar o educandário. “Quando estava por fechar tínhamos 18 alunos. Estes estudantes que o estado deixou, o município acolheu. Além deles, também recebemos excedentes da Escola Floriano Peixoto, que tinha turmas lotadas, da escola Mamãe Coruja e da EMTI São Roque. O município custeia o transporte escolar. Se esse espaço tivesse fechado, essas 88 crianças estariam em outros espaços, até mesmo com vagas compradas”, salienta.

Os alunos da EMEF Floriano Peixoto, têm frequência de quase 100% no Jardim A e B, turno integral, segundo a vice-diretora, Muriel Rossi


Marilei frisa que pelo prédio já ter completado 76 anos, melhorias são necessárias na estrutura. “Precisamos de consertos no telhado e na parte elétrica. Já encaminhamos a demanda para a Secretaria Municipal de Educação e a equipe de engenheiros já vem trabalhando para realizar a reforma. Mas como o prédio é muito antigo, vamos descobrindo outras coisas que precisam melhorar, como a caixa d´água que era muito pequena para atender este número de alunos. Então a secretaria, em parceria com o CPM, providenciou caixa d’água e vai fazer a instalação”, revela.

Sobre o Círculo de Pais e Mestres, a diretora garante que é bastante presente no dia a dia do estabelecimento de ensino. “A comunidade tem o desejo do resgate da identidade da escola. Estes pais que fazem parte do CPM têm interesse em manter a escola cada dia melhor. Eles são muito unidos e têm um sonho que é o colégio atender até o nono ano. E buscam estas melhorias para alcançar este sonho, porque é uma comunidade que está crescendo e vai precisar desta ampliação”, acrescenta.

Descaso familiar

Daniela Soso é diretora na Escola Municipal de Ensino Fundamental Senador Salgado Filho, que, assim como a São Valentim, existe desde o século passado, mais precisamente há 71 anos. Daniela aponta 2023 como um ano cheio de desafios. “Começamos com problemas, tivemos muitas reuniões com familiares de cada turma, porque também faltava que os pais se unissem mais ao colégio. Surtiu efeito, tanto que agora, temos alunos do primeiro ano que já estão lendo e crianças no Jardim B que também já iniciaram a leitura. Acredito que a união entre a família e escola deu muito resultado”, avalia.

A diretora, Daniela Soso, afirma que, durante a pandemia, foi o ano mais difícil para a educação

A diretora acredita que muitos aspectos estão ligados aos efeitos da pandemia da Covid-19, principalmente com a educação à distância. “Os pais não optaram pelo sistema online. Preparamos a aula de aluno por aluno e os pais vinham buscar. Com certeza foi o pior ano escolar que tivemos”, lamenta. Além disso, Daniela prega a necessidade de os responsáveis orientarem os pequenos, e diz perceber que esse é um dos principais problemas enfrentados. “Muitas vezes acontece o descaso familiar, porque os familiares não querem sentar e acompanhar aquela criança na execução dos deveres escolares”, destaca.

A diretora também demonstra preocupação com alguns estudantes que se encontram em situação de de maior dificuldade, mas comenta que a comunidade é uma grande parceira para ajudar a equacionar estes casos. “Temos alunos em situação de vulnerabilidade social. Dos 80, alguns vivem nessa condição. Tentamos ajudar bastante, recebemos doações de roupas e fazemos com chegue justamente nestas famílias”, revela.

Jardim Integral

ter servido como piloto para o funcionamento do Jardim em turno integral, a EMEF Floriano Peixoto passou a trabalhar com também dessa maneira e, segundo a vice-diretora, Muriel Rossi, “está sendo uma experiência muito boa para os pais porque que as crianças ficam na escola, assistidas. Pela manhã estudam conteúdos disciplinares e à tarde têm atividades complementares, como musicalidade e literatura. Eles gostam bastante, e a frequência é de quase 100%”, revela.

Muriel acredita que a escola está no caminho certo, e buscam incrementar a questão do aprendizado. “Estamos sempre procurando oferecer, além da parte pedagógica, o que pudermos de atividades complementares. O projeto da escola observa o regramento da SMED, com sustentabilidade repensando ações e pensando no futuro. Também realizamos visitas de estudo, passeios e atividades diferenciadas”, relata.

Sobre a estrutura, a vice-diretora acentua que muitas melhorias foram realizadas. “Temos três salas de aula, duas para turma de tempo integral e mais que é dividida entre o primeiro e o segundo ano. Neste ano, tivemos melhorias nos pátios, refeitório, e no parquinho que é aberto para eles. Nos últimos anos foram feitos investimentos em aparelhos de datashow e televisão, e recolocamos o toldo que havia sido danificado por uma queda de granizo. A Secretaria de Educação está nos apoiando bastante”, elogia”.

Posto de saúde

Os moradores de São Valentin lembram que o posto de saúde da localidade ficou fechado, por alguns anos, antes mesmo da Covid-19. Em julho deste ano, o local foi reaberto e passou atender à comunidade que, até então, precisava se deslocar até Tuiuty para receber atendimento. “Depois de ficar fechado por cerca de três anos, e está aberto há dois meses. O clínico geral atende na terça e na quinta, e nos outros dias são feitos procedimentos mais simples”, explica a auxiliar administrativa da UBS, Lucimara Morandi, 31 anos.

Além do médico, outros profissionais trabalham no posto a fim de atender todos os moradores da localidade. “Temos uma enfermeira técnica que faz os curativos, aplica injeções, realiza a triagem, uma enfermeira-chefe que trabalha nos dias em que o médico realiza as consultas”. No local, porém, não existe atendimentos de pediatria, pré-natal, farmácia e vacinas. “A parte de imunização fica em Tuiuty”, segundo a auxiliar administrativa.

Lucimara salienta que ainda faltam alguns serviços médicos no Posto de Saúde. “Temos uma UBS mais simples, porque não tem tanta gente ainda. Muitas pessoas preferem ir a Tuiuty, porque aqui ficou muito tempo fechado. Mas aos poucos o pessoal está vindo”, finaliza.

Clades Sberse conta estar aliviada após a volta do posto de saúde

A cuidadora Clades Sberse, 59 anos, é moradora de São Valentin há muitos anos, e foi uma das que lamentou a desativação do posto de saúde. “Estamos muito felizes que voltou a funcionar. Antes tínhamos que ir a Tuiuty, e até lá não havia ônibus no horário das consultas, era preciso ir a pé e tínhamos que marcar a consulta uma semana antes. Agora ficou bem melhor”, sustenta.

Mas ainda há o que melhorar na localidade. “Seria bom se tivéssemos uma farmácia, com um preço justo e que seja similar às que estão instaladas da cidade”, diz. Ela também cobra a instalação de mais linhas de ônibus para o transporte público. “Principalmente aos finais de semana e feriados. No dia a dia já são poucos horários, e como passa também no bairro São Roque, na maioria das vezes, quando chegam aqui os ônibus estão sempre lotados”, reclama.

Novo investimento

Morador da área urbana de Bento, João Giacomin, hoje com 60 anos, quando se aposentou decidiu que não gostaria de ficar uma atividade. Foi quando decidiu empreender em São Valentim. “Sempre fui construtor, me aposentei e resolvi abrir a empresa para ter uma ocupação. Moramos em Bento, mas abrimos aqui porque já tínhamos uma propriedade nos fundos da loja. Construí para alugar e acabei segurando para mim”. Ele acrescenta que o comércio é um passatempo, “mas para as pessoas daqui facilita bastante. Imagina ter que ir até a cidade para conseguir comprar o que precisa”, afirma.

O casal de comerciantes, João Giacomin e Salete Baldo, se surpreenderam positivamente ao abrir o estabelecimento em São Valentim

Ele e a esposa, Salete Baldo, se surpreendem com o sucesso que a loja fez. “Atendemos bastante gente diariamente, em torno de 80 pessoas. Nem imaginávamos que daria tão certo. E pensando no futuro, Bento está crescendo para este lado, inclusive, vem gente da cidade comprar aqui”, frisa.

Há 30 anos, Ivoni Raimundi passou a viver em São Valentim. Nascida e criada na área urbana de Bento, atualmente, aos 48 anos, cuida de crianças, mas diz sempre se considerou do lar. “Meu pai comprou um terreno e sempre disse que quando a filha casasse construiria a casa em São Valentim. Casei e viemos viver aqui. É um lugar bom, mas um pouco esquecido pela Prefeitura”, completa.

Mari Tonet, 58 anos, empresária, passou a morar em São Valentim por conta do comércio da família, há mais de uma década. “Trabalhamos com vime para parreiras e tínhamos um sócio que morava aqui, daí decidimos construir e morar na localidade. Gosto muito de São Valentim”, garante ela. A preocupação de Mari é a mesma de muitos produtores e agricultores da região, o clima. “Temos terras, produzimos uvas e fazemos compra e venda de vimes. Só que a safra de 2023 deve ser fraca, porque nesta época, que deveria ter sol para as parreiras que estão evoluindo para abrir para a floração, e só chuva. E isso vai nos trazer prejuízos financeiros”, lamenta.