A falta de abrigo para os moradores que vivem nas ruas é crescente e não chega a ser uma novidade em um país de ampla desigualdade social e econômica. Em Bento Gonçalves, o cenário é de variação de números entre os oficiais, que dão conta em 60 pessoas estão morando nas ruas e os das entidades sociais, os quais superam os 80.

Muitas pessoas entendem que quem está na rua, enfrenta essa situação por falta de engajamento na busca por uma melhoria de suas vidas. Enquanto isso, quem sofre na pele a situação, por vezes, justifica ao contrário, entendendo que as oportunidades para a reconstrução de suas vidas e família, não foram suficientemente oferecidas.

As visões e entendimentos de cada ser humano podem ser distintos, mas o que é concreto muitas vezes está nos números. Segundo os dados repassados pela Secretaria de Habitação e Assistência Social (Semhas), o município conta hoje, 60 pessoas nesta situação de vulnerabilidade social por estarem vivendo nas ruas. Todos cadastrados e parte do Serviço Especializado de Abordagem Social (Seas), desenvolvido no Centro de Referencia Especializado de Assistência Social (Creas).

Conforme o secretário da pasta, Eduardo Virissimo, os serviços prestados pelo município têm como finalidade realizar trabalho social de abordagem e busca ativa, identificando nos territórios a incidência de trabalho infantil, exploração sexual de crianças e adolescentes e pessoas em situação de rua. “O serviço busca entender a natureza das violações de direito a que estão expostos estes indivíduos, as condições em que vivem, estratégias de sobrevivência, procedências, aspirações, desejos e relações estabelecidas com a comunidade, com vistas a contribuir no processo de saída das ruas e possibilitar condições de acesso à rede de serviços e benefícios”,conta.

Ainda segundo Virissimo, são realizadas abordagens sistemáticas em locais estratégicos de maior concentração desta população. “Conforme a demanda realiza-se escuta qualificada, encaminhamentos para tratamentos de saúde, confecção de documentação, bem como, para outros pontos da rede socioassistencial (Acessuas, Cras e CadÚnico). Conforme a realidade analisada, contatos com familiares buscando o apoio destes e estudando possibilidades de resgate de vínculos”, salienta.

Números e atendimentos no Lar da Caridade 

Em contato também muita próximo com a realidade destes moradores de rua está o Lar da Caridade. A instituição de caráter social-comunitária atende diariamente pessoas que estão em situação de vulnerabilidade social. E por estarem no dia a dia desta situação, acreditam que o número de moradores nas ruas de Bento Gonçalves ultrapasse os 80, mas o atendimento chega a 150 pessoas, entre banho, entrega de roupas e almoços.

Foto: Reprodução

Alguns detalhes são passados pelo responsável do atendimento a essas pessoas, Glaudiomar Ramires Lima. “Com certeza mais de 80 pessoas estão morando nas ruas. Eles estão por aí, ficam no Centro, Vila Nova, Eucaliptos, Botafogo, Juventude, rodoviária, praças e viadutos. Só aqui nas proximidades do lar tem mais de 10 pessoas”, indica.

Os motivos para estarem nas ruas são diversos, segundo Lima. “Problemas com álcool, drogas, brigas com a família, estão entre os principais. Sem contar, pessoas que vem de todos os lugares. Neste período, muitos vieram do nordeste para colher uva, mas não conseguiu emprego e acabaram ficando. Chegam a andar em 40”, relata.

Questionado sobre o que pode ser feito para diminuir a desigualdade e por consequência, o número de moradores nas ruas, Lima foi direto. “A preocupação de todos nós do lar é como atender as pessoas. O cidadão que chega ruim na cidade e depende dos governos fica ainda
pior. Qualquer cidadão que chega em Bento e procura assistência da prefeitura, não recebe nada, e aqui consegue. Ouvimos a história, damos apoio psicológico e moral, em busca da recuperação. O
objetivo é resgatar, dar dignidade com boa roupa e alimento. É isso nós damos dentro das nossas
possibilidades”, pondera.

Locais que se tornaram abrigos temporários 

Os espaços para conseguir abrigo para um ou dois dias, ou até mesmo se estabelecer é constante por parte dos moradores de ruas. Há quem tenha optado pelas escadas da Igreja Santo Antônio, no centro da cidade. Faça sol e até mesmo em dias com chuva ou temperatura mais baixa, pode se observar um senhor sentado, pedindo uma contribuição. Ao anoitecer e com o diminuir do ritmo da cidade, ele retorna na busca do sono.

Na praça em frente à Unidade de Pronto Atendimento (UPA), no bairro Botafogo, também é observado o movimento de pessoas utilizando o local como moradia temporária à noite e permanecendo durante grande parte do dia em meio a movimentação de pessoas em busca do serviço de saúde.

Outro ponto em que está sendo observada a utilização por moradores de rua ou até mesmo de passagem é na mata localizada aos arredores do Lago da Fasolo, no bairro Progresso. Barracas com lonas improvisadas são marcas vistas no local. Somado a isso, colchões, bancos, sofás em estado de uso, roupas adultas e até infantis, e muitos apetrechos para cozinhar e restos de comida.

Moradores aproveitam espaço do Lago da Fasolo para se instalarem Foto: Lucas Delgado/Jornal Semanário

Porém, há quem se incomode com a utilização do espaço. Moradores da região do Lago da Fasolo, os quais pedem para não terem o nome divulgado por questões pessoais. “Não é certo eles estarem invadindo esse espaço e utilizando para morar. Não há condições alguma de se viver de forma decente, tem lixo espalhado por todo o lado, comida, roupa e outras coisas. Tem até criança vivendo aqui durante a noite. Eles podem até pegar uma doença”, alerta.

A questão da segurança também é abordada pelo morador da região. “A gente não conhece essas pessoas, elas entram e saem daqui. Isso sem dúvida nos deixa preocupados”, conclui.