Há muito tempo, observa-se uma relação estreita entre os seres humanos e os animais não humanos. É possível afirmar que esta interação, ao longo das mudanças influenciadas pela cultura, intensificou a relação entre seres humanos e animais domésticos, por exemplo, permitindo que estes últimos se tornassem parte integrante do sistema familiar. Esta relação estabelecida, na sociedade contemporânea, ocupa espaços importantes no que se refere às funções familiares, uma vez que os animais de estimação podem exercer diferentes papeis e consolidar vínculos significativos em conjunto com seus cuidadores.

Neste contexto, pode-se dizer que, quando um animal de estimação morre, uma lacuna é estendida na vida do tutor, fazendo emergir a dor da perda por meio de sentimentos e emoções voltados ao sofrimento. Trata-se, portanto, da dor do luto. Observa-se, porém, que este pesar não encontra espaço continente para o reconhecimento social, uma vez que a perda de um animal constitui um luto não autorizado pela sociedade e, muitas vezes, mesmo para o enlutado. As perdas não reconhecidas referem-se justamente à restrição ou inexistência de um lugar para a expressão do luto, fazendo com que o enlutado tenha que reprimir sua tristeza, o que, muitas vezes, acarreta em doenças psicossomáticas (doenças cuja origem é emocional, mas acabam se manifestando no corpo, devido à continência da dor) ou mesmo em complicações no processo de luto.

O desafio em reconhecer o sofrimento do enlutado, oriundo da perda do seu animal de estimação, está no fato de que este ocorrido foge às normas estabelecidas que tentam explicar quem, quando, onde, como, quanto e por quem ou pelo o que se deve lamentar. Contudo, tratando-se de vínculos, é importante lembrar que o processo de luto diante de laços de afeto consolidados é natural e saudável. Se, na interação entre o animal de estimação e o seu tutor, havia uma relação de proximidade e hábitos, é comum e esperado que o luto se inicie. Logo, apenas haverá luto quando um vínculo, outrora, havia sido estabelecido – isto ocorre em todas as modalidades de relacionamento.

A sociedade não é continente com o sofrimento daqueles que perdem seus animais. Todavia, os animais têm ocupado um espaço importante no que diz respeito às relações cotidianas. É possível observar, por exemplo, que algumas pessoas convivem mais intensamente com seus bichinhos de estimação do que com outros seres humanos. Por tais razões, se há um vínculo significativo entre estes seres, este luto deveria ser igualmente reconhecimento pelo social, assim como as perdas por morte das pessoas a quem se ama. Afinal, o luto é o preço que se pagar por amar. Perde-se uma parte de si mesmo, que sempre acaba sendo levado com quem parte – independente do vínculo formado.

Fonte: Franciele Sassi