Apesar de serem grandes apaixonados pelo local onde vivem, os residentes têm sentido que a localidade precisa de melhorias e mais investimento turístico, pois possui potencial devido à proximidade ao vale. No entanto, para alcançar isso, é necessário, inicialmente, asfaltar toda a região

O 40 da Graciema é uma localidade próxima ao Vale dos Vinhedos, mas o turismo ainda não alcançou a região. Com muitas parreiras, a paisagem é coberta por verdes, e em dias ensolarados, é difícil encontrar os moradores em casa, pois a maioria trabalha no campo com produção de uvas. As reivindicações dos moradores dizem respeito ao asfalto, que está presente em algumas partes, mas em outras, a estrada é de chão, prejudicando principalmente as pessoas alérgicas e os produtores.

Moradores

Nicolas Marine, de 21 anos, é agricultor, e tudo o que aprendeu foi com a família. “Segui a cultura e os caminhos dos meus pais e avós. Gosto bastante de trabalhar com agricultura, até porque é uma prática que está acabando. São poucas pessoas da minha idade que continuam, e por gostar do que faço”, destaca.

Nicolas Mariano sente orgulho do trabalho nas parreiras

Para ele, que cresceu no 40, a potencialidade do lugar acaba sendo desperdiçada. “Acho um lugar legal e interessante, mas acredito que poderia ter mais turismo, já que é um local com muito potencial, pela história e pelo verde. Mas deixa a desejar muito na mobilidade, no asfalto e no que ele poderia se tornar se tivesse mais visibilidade”, determina.

Marine enumera as partes que gosta no local, mas também menciona as desvantagens. “Gosto bastante de viver aqui, do mato, do verde, da paz e da tranquilidade. Mas falta o asfalto, que seria muito bom para nós. Tenho bastante problemas respiratórios como rinite, e, com a poeira que levanta, sofro muito”, expõe. Ele complementa que as mudas das uvas mais próximas da estrada ficam cobertas de poeira, dificultando o tratamento. “Por conta da quantidade de chuva, a poeira deu uma diminuída, então ela não tem prejudicado as plantações”, comenta.

Desde muito novo, ele é agricultor e compreende as dificuldades da profissão. “Não é fácil o clima, nunca tem o equilíbrio correto. Por conta dessas chuvas, acaba acontecendo a mufa, preteia os cachos e cai os grãos. É uma época bem complicada também por causa dos tratamentos. Mas estamos lidando bem, ouvimos falar de pessoas que perderam mais”, diz.

Carmen Arcari, aposentada de 67 anos, vive no 40 desde sempre, já que nasceu por lá. “Onde meu pai morava, em Garibaldi, tinha pouca terra entre os irmãos. E aqui no 40 apareceu a oportunidade. A partir disso, ele morou a vida toda aqui e eu passei a vida inteira com meus pais, e trabalhávamos com parreiras, até eles ficarem doentes”, relembra.

Ela tem muito apreço pelo local, principalmente pelos moradores que conhece há tantos anos. “Gosto muito de morar aqui, se alguém fala mal da minha comunidade, me dói. É o lugar que é da gente, tendo problemas ou não. Para mim, comunidade é família. A melhor parte são as amizades, as pessoas, a igreja que frequentamos. Todo mundo se dá muito bem”, confirma.

Na parte onde ela mora tem pavimentação, mas não deixa de pensar em seus vizinhos. “Para mim está bom, mas falta asfaltar toda a comunidade. Porque depois que temos as condições, outras coisas vêm. Temos pousadas, portanto temos turistas que se deslocam até aqui”, expõe.

Além do carinho pelo interior onde nasceu, ela destaca o sentimento que tem pela cidade. “Não trocaria minha cidade por lugar algum. Vamos muito à cidade, e comparo quando ia na infância; nem parece o mesmo lugar, Bento cresceu, é bastante diferente do que era anos atrás”, enaltece.

“Moramos perto do Vale, não faz sentido não termos asfalto”

Marilice Viccari, de 58 anos, dona de casa, vive há 35 anos no 40, onde passou a viver após casar. “Antes de morar aqui, já residia no interior e trabalhava com parreiras. Por isso, consigo perceber que este ano está sendo difícil por causa das chuvas; estamos gastando horrores para tratamento, porque não é fácil”, comenta.

A dona de casa destaca as muitas qualidades do lugar, dando ênfase à calmaria, mas acredita que a falta de asfalto prejudica. “É muito bom morar aqui, é tranquilo, seguro, gosto até porque é muito bonito. Mas tem que ter asfalto e uma melhora nesta estrada. Moramos perto do Vale, não faz sentido não termos asfalto. Prejudica muito; as estradas estão muito ruins. Se tiver asfalto, é outra coisa. Aqui mal dá para passar às vezes, tem que melhorar”, afirma.

Além disso, devido à proximidade com o vale e respingos de turismo, ela acredita que essa carência prejudica até mesmo a imagem da cidade. “Temos pousadas aqui, então ocorre um fluxo turístico. E justamente por isso, é necessário deixar o local melhor. Fizeram aquelas pipas para vendas, mas como alguém vai vender alimentos com o pó que tem? Não tem condições. Até hoje, ninguém nunca usou por conta da poeira”, indica.

Seu marido produz uvas, e por isso, ela ressalta que as mudanças na legislação podem não ser benéficas. “Aqui na nossa região é só parreirais, temos horta para o gasto, mas nada é vendido. A agricultura tem se desenvolvido muito, mas com as mudanças que vem ocorrendo, não sei se as pessoas vão seguir trabalhando na roça. Sem falar que o preço da uva não está tão bom assim; cada dia está mais complicado”, acrescenta.

Delfino Secconi, de 80 anos, nasceu no 40 da Graciema, e sua esposa, Iris Secconi, de 79 anos, passou a morar na localidade após casar. “Viemos morar aqui, pois surgiu uma oportunidade de trabalho. Éramos empregados desta terra, e depois que o dono morreu, compramos dele”, relembra.

Íris Secconi e Delfino Seconni vivem há 40 anos no local e, apesar de considerá-lo pacato, apreciam a tranquilidade

Por conta disso, ambos dedicaram a vida às plantações e as produções de uvas, mas, com a idade, precisaram se aposentar. “Só tem parreiras aqui, não tem como plantar outras coisas por causa dos morros; então, a maioria aqui é só produção de uva. Nós trabalhamos a vida toda com isso. Aí, demos as terras para o meu neto, e ele cuida de tudo”, constata.

O casal não vê grandes problemas no local, apesar de classificá-lo como pacato. Mas, mesmo assim, gostam bastante. “Para nós, é muito bom viver no 40, não tem problema nenhum. Claro que estamos tristes desde que perdemos nosso filho, mas fora isso, não temos problemas para nos queixarmos daqui. Talvez a falta de um posto de saúde aqui prejudique um pouco, mas no 15 tem. Só que a pé não dá para ir; temos que ir de ônibus ou de carona”, relata.

O neto deles permaneceu na agricultura, mas isso não é o que eles vêm notando do resto da juventude. Entendem que o maior problema não é nem a falta de vontade dos mais novos, mas sim porque muitos acreditam que não vale tanto a pena assim permanecer na agricultura. “Muitos jovens têm ido embora para a cidade, não querem mais saber de roça. Só os velhos ficam aqui. Mas também é necessário mais apoio, que o preço da uva valha mais”, diz.

O único comércio do local

Aelite Trenti é comerciante no 40, é dona do único mercado presente no lugar. Já faz 30 anos que mora lá, e, inicialmente, tinha outro emprego. “Viemos trabalhar nas parreiras, e depois compramos o nosso terreno. Anos depois adquirimos o mercado, porque ele já existia e o dono colocou para vender”, realça.


A localidade faz fronteira com diversas outras cidades, por conta disso, muitos residentes vieram destes municípios. “Sou natural de Monte Belo do Sul, depois disso fomos para o 15 da Graciema, e depois para o 40. Eram muitas parreiras quando viemos trabalhar aqui, e quando os filhos cresceram compramos o mercado”, e complementa que “é um lugar bom de morar, a tranquilidade é ótima, apesar de não ser tão seguro já que nosso mercado foi assaltado duas vezes”, alerta.

Aelite Trenti, nascida em Monte Belo do Sul, é proprietária do único mercado e bar da localidade

Para ela, é necessário que voltem a ter atendimentos médicos, já que, há alguns anos, parou de ter. “A saúde é complicada, porque só tem postinho no 15, aí precisa marcar e só tem consulta duas vezes por semana. Claro que se chegar com algo sério, eles atendem, mas no geral não. Antigamente tínhamos a unidade móvel que vinha até aqui, mas depois parou e agora só no 15. E pé não tem como ir, somente de ônibus ou carro”, salienta.

Sobre a economia, ela revela que já há algum tempo o mercadinho não vem indo muito bem, mas que o bar e a lancheiria em conjunto sempre recebem muitos moradores.  “As pessoas vêm muito para o bar, o mercado é mais quando falta alguma coisa em casa, um suporte caso esqueceu de comprar. No início não dávamos conta de tanta gente que vinha, mas agora é o bar mesmo que funciona. Este ano foi mais ou menos, para o mercado foi ruim, mas para o bar foi bom, dá para viver”, conclui.