Manhã de setembro indecisa, com o sol passando uma rasteira nas donas de casa afobadas – eu inclusive – que lavaram agasalhos de inverno antes de a estação fria partir em definitivo.  

Perscrutava o tempo apoiada na janela, quando uma cena chamou minha atenção. Um casal expulso do interior que acampara por aqui, há meses, fazia a maior bagunça, sinalizando a presença indesejada de outra criatura. Espichei o olhar e percebi que havia um intruso da mesma espécie, agindo como se fosse dono do pedaço. Tudo bem, nenhum deles tinha requerido título de propriedade, mas o casal chegara antes, o que lhe concedia alguma vantagem… Ao menos, enquanto não surgisse uma enorme flor de aço e ferro.   

Troquei de janela para ficar mais perto do confronto, me mantendo imóvel feito estátua, para não parecer uma ameaça – esses indivíduos são muito desconfiados. Daquele ponto, conseguia acompanhar o desenrolar da disputa e formular hipóteses malucas. Estaria o intruso fazendo uma diligência abusiva de busca e apreensão? Mas o que desejava apreender? Gravetos? Minhocas? Besouros e joaninhas?   

         Redobrei a vigilância em relação ao invasor, que, com ares de machão, peito pra frente e postura de ataque, continuava bicando aqui e ali, levantando uma palha, baixando outra, numa acintosa provocação. Volta e meia, ele se insinuava para mais perto dos dois, que metralhavam impropérios – pena que o Google Tradutor não registra linguagem de quero-queros.  Com a aproximação do inimigo, a dupla estrategista aplicava manobras de troca de lugar para distrair e confundir o xerifão.   

         De repente, sem o menor pudor, fêmea e macho mantiveram intercurso sexual e, em seguida, ela se pôs a medir um espaço entre as pedras, talvez para um futuro ninho. Outra possibilidade é de aquilo ter sido uma representação, como um recado explícito ao assediador. Sem alternativa, o terceiro elemento abriu as asas e levantou voo.

         Finalmente! Aquilo já estava me agoniando. Eu ainda suspirava aliviada quando a dupla resolveu decolar bem rápido, seguindo o grandão.  Fiquei em dúvida… Seria para escoltá-lo até uma gleba de terra desocupada ou para formar um triângulo amoroso tipicamente hollywoodiano?

         Então saí do meu posto de observação e fui a outro, onde bombavam notícias verde-amarelas. Agora, o debate era colorido, arrastava multidões e mexia com os humores.

         Quinze minutos depois, um canto estridente me levou outra vez, à janela. Lá embaixo, estava o casal de quero-queros defendendo o seu território, enquanto um lagarto se esgueirava entre a ramagem.

         Nem para eles está fácil a convivência.