Hoje faz exatamente cinco anos e quatorze dias que Jucinei Basso, 43 anos, não ingere nenhum tipo de bebida alcoólica. Ele sabe há quantos dias está limpo, porque esse período marcou uma transformação de vida, a partir do momento em que se assumiu como alcoólatra e decidiu que era o momento de procurar ajuda e dar um basta;

Antes disso, foram longos 28 anos se relacionando com o álcool, já que começou ainda muito jovem, por influência de amigos e até por curiosidade, como ele mesmo conta. “No início, não via problemas, mas depois foi se agravando. Cada vez mais fui tendo prazer com a bebida e não via o estrago que estava fazendo comigo, com meus trabalhos, com minha família”, relata.

Recuperado, Basso já consegue enxergar que naquele tempo, por consequência da dependência, foram inúmeras mudanças de empregos, além de outros problemas enfrentados. “Foi destruindo minha vida e da minha família, me perturbando física, mental e espiritualmente”, admite.

Embora o próprio não assumisse, as pessoas do convívio o alertavam e sabiam que ele precisava de ajuda. “Achava que não, que era normal. Até que cada vez mais fui me afundando, chegando no fundo do poço”, aponta.

Foi por meio dos familiares que Basso ficou sabendo da existência da Comunidade Terapêutica Rural de Bento Gonçalves. “Tentaram por muitas e muitas vezes fazer com que me internasse e eu dizia que não precisava, até o momento em que precisei e me internei lá”, diz.

O local a que Basso se refere é uma instituição ligada a Secretaria de Saúde, criada com o objetivo de oferecer tratamento para pessoas do sexo masculino, maiores de 18 anos, que tem como diagnóstico a dependência química, seja o álcool ou outras drogas e que, necessitam de internação nessa modalidade.

Recaída

Foram nove meses de internação, contudo, ele sofreu uma recaída. “Me achava forte suficiente. Acreditava que não precisava de mais nada, que já conseguia administrar minha vida e esse foi meu engano. Começaram as mentiras de novo, as manipulações, então, recaí”, assume.

Foram dois anos afastado da comunidade, até a próxima internação. “Voltei em 2015. Admiti que realmente não podia mais, que eu e o álcool não combinávamos, então me afastei definitivamente dele. Mudei minha maneira de viver, mudei hábitos, lugares e pessoas”, destaca.

Um espaço de recuperação

Assim como Basso, outros 700 pacientes já precisaram da Comunidade Terapêutica Rural, que no último dia 19 de março, completou 10 anos de existência. Por lá é desenvolvido um trabalho baseado em um programa de recuperação com estratégias de aprendizagem, mudança de comportamento e enfrentamento à doença.

Atualmente 19 residentes estão sendo atendidos no local. O coordenador do Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas (CAPS AD), Maurice Bouwary, explica que os usuários podem procurar o serviço de duas maneiras: espontânea ou por encaminhamento pela rede.

Por lá, segundo Bouwary, a rotina se divide em atividades diárias, como organização e higiene, além de ações direcionadas ao tratamento. “Grupos e oficinas terapêuticas, momentos onde é trabalhado a espiritualidade, atividades laborais na horta, marcenaria e atualmente a produção de sabão. Estes são os pilares de um bom tratamento para vida começar a ser reorganizada”, destaca.

O sentimento de estar comemorando uma década de existência é de grande orgulho, como define Bouwary. “São dez anos de serviço de qualidade, oferecido ao munícipe que precisa desse tratamento de saúde. É um local que ao longo desse tempo cresceu e desenvolveu-se em prol do usuário”, garante.

Ele também reforça que o local é de grande importância para o município, uma vez que oferece serviço especializado à recuperação da dependência. “É uma opção de tratamento aos casos que necessitam, em determinado momento da caminhada, de enfrentamento, de acompanhamento diário e mais prolongado”, conclui.

Recomeço feliz

Quando acabou o segundo e último período de internação, o recomeço não foi nada fácil para Basso, principalmente para se recolocar no mercado de trabalho. “Todos os dias saia de casa para largar currículo, mas devido ao meu passado e a minha carteira de trabalho que já tinha passagem por diversas empresas, foi difícil”, afirma.

Difícil sim, mas impossível, não. Por não ter desistido, ele conseguiu uma oportunidade justamente no local onde encontrou apoio para se recuperar do vício. “Depois de quase um ano fora da comunidade, recebi um convite do nosso coordenador para trabalhar lá mesmo. Acredito que através de Deus, ele me presenteou com esse trabalho”, orgulha-se.

Há três anos e meio Basso foi acolhido novamente na comunidade terapêutica, dessa vez, não para se tratar, mas para trabalhar como monitor. “Meu papel como trabalho é dar para eles aquilo que eu recebi de graça e mostrar com o meu próprio exemplo como a vida é boa sem álcool e outros tipos de drogas”, conclui.