Bento-gonçalvense fala de sua trajetória, pontua a atuação da OAB e ressalta a participação feminina em cargos de poder

Diversas mulheres em uma única pessoa. É assim que a advogada Beatriz Peruffo se autodescreve. Nascida em Bento Gonçalves, a advogada acredita que seu propósito de vida é ajudar o próximo, seja em qualquer situação que lhe for imposta pelas consequências da vida. Em entrevista exclusiva ao Semanário, Beatriz ressalta a importância da valorização e a igualdade da mulher na sociedade. Ela destaca ainda os trabalhos realizados na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que enfatizam suas convicções de que é necessário trabalhar para que a classe feminina tenha as mesmas oportunidades que os homens. A bento-gonçalvense fala ainda sobre a importância subseção local, as atuais condições do sistema judiciário e sobre as prioridades que os candidatos devem focar, caso sejam eleitos no pleito eleitoral de outubro.

A história de Beatriz e a advocacia começa cedo. Ainda jovem, já sabia que o caminho do Direito era o escolhido para ser trilhado. Ela lembra que em uma ocasião, seu pai questionou a decisão, apontando diversos percalços que a profissão poderia lhe render ao longo do tempo. “Quando meu pai disse isso, “a chave” virou, porque anteriormente eu havia exercido outras funções, com destaque para a gestão de pessoas, o que continua ocorrendo atualmente, mas o Direito é a minha paixão”, lembra. “Para o meu pai, eu tinha que ser uma mulher com conhecimento e minha mãe dizia que eu deveria ser uma mulher educada e sorridente. Unindo essas duas vontades, hoje me tornei essa pessoa”, destaca.

Beatriz lembra ainda que no começo de sua carreira profissional, desafios como o assessoramento para entidades como o Círculo Operário, a Associação Caminhos de Pedra, Parceiros Voluntários, na Subseção da OAB em Bento, numa comissão para a organização de palestras e eventos. Para ela, os trabalhos voluntários, em especial na subseção da OAB foram essenciais na construção de sua carreira profissional. “A OAB transformou a minha vida, pois tem um trabalho de cidadania muito maior, do que um trabalho de classe”, afirma.

Liderança da mulher bento-gonçalvense

Ciclos de encontros com advogadas de todo o estado elencou as prioridades para os próximos anos. Foto: Reprodução

Durante a entrevista Beatriz enfatizou por diversas vezes que a mulher precisa ocupar cada vez mais, espaços de poder na sociedade. Ela acredita que é necessário fomentar a participação da mulher. Para ela, é preciso que haja mulheres políticas, empreendedoras, diretoras, líderes comunitárias preocupadas com a evolução da sociedade como um todo. “Nós temos que preparar as mulheres para assumirem esses cargos. Não adianta falar que é preciso maior participação feminina na política, por exemplo, e os partidos políticos segurarem a verba destinada para as mulheres. Tem de haver uma mudança para que realmente haja esse incentivo”, afirma.

Ela explica ainda que o fomento às mulheres foi uma demanda indicada durante as 14 conferências regionais de valorização da mulher advogada que a OAB realizou pelas regiões do estado. Nos encontros, as profissionais apontaram necessidades no trabalho e também demandas pessoais, que estimularam a organização de ações que visam a capacitação para as mulheres que pretendem assumir um cargo eletivo, seja ele político ou não. “É urgente que consigamos colocar mais mulheres no poder, porque há várias que estão trabalhando pelos bastidores e que precisam estar na vitrine, sejam elas no CIC, CDL, Sindilojas e tantas outras entidades grandes. Nós temos entidades fortes em Bento e onde estão as mulheres? É preciso fazer esse questionamento”, enfatiza.

Frente da Mulher Advogada

Com esse pensamento, Beatriz, que também é presidente da comissão da Mulher Advogada, acredita que após a realização das Conferências municipais e regionais, em que foram levantadas demandas locais pelas advogadas, o trabalho está voltado, neste momento em apresentar as propostas para suprir as demandas elencadas. Segundo ela, com essa proposta a Frente dá voz a todas as profissionais do Rio Grande do Sul. “Nós estamos num movimento na Comissão Nacional da Mulher Advogada e trabalhando com a valorização da classe para que ela ocupe espaços de poder. Precisamos participar mais de forma efetiva da OAB. Trabalhando, juntas, com os homens nas próximas gestões. Nós queremos, sim, como um movimento nacional, mais mulheres na ordem. A ação da mulher deve ser valorizada”, afirma.

Violência contra a mulher

Mesmo com o intuito de incentivar as mulheres a saírem da zona de conforto e buscarem sua participação em diretorias, outro ponto defendido por Beatriz e pela comissão, está voltado à proteção das mulheres. Mesmo com a redução de crimes apresentada pelo Governo do Estado no mês passado, alguns números ainda assustam e precisam ser evidenciados, conforme Beatriz. Segundo ela, não são nada animadores, quando se trata do tema violência contra a mulher. Em 2017, o estupro teve uma alta de 5,5% e lesão corporal contra mulheres alta de 1,3%, em relação a 2016, números que chamam para a reflexão e para ações imediatas de combate a estes crimes. No mesmo ano o número de ameaças teve queda de 4,2%. Em 2018, um levantamento da Secretaria de Segurança Pública do Estado apontou que mais de 167 mulheres foram agredidas por dia de alguma forma no Rio Grande do Sul. O levantamento leva em conta casos de ameaça, lesão corporal, estupro, feminicídio consumado e também tentativa de feminicídio. De janeiro a junho desse ano foram mais de 30 mil casos.

Para Beatriz, o tema é complexo e precisa ser tratado com toda a sociedade, conhecendo as causas e não somente aplicando penas. “Não podemos trabalhar somente com o efeito. É necessário dar enfoque à prevenção. Nós temos grandes ações que vão nesse objetivo. Precisamos falar sobre isso, porque historicamente, a mulher era propriedade do homem. Isso é um horror! Estamos falando de igualdade de direitos na Constituição. É grave, é histórico. É urgente essa mudança de paradigma de homens e mulheres machistas, mostrando que nós, mulheres podemos escolher e esse direito, muitas delas não sabem que tem”, observa.

Notabilidade de Bento na OAB

Beatriz Perfuffo e o presidente da OAB-RS, Ricardo Ferreira Breier. Foto: Reprodução

Com tantas frentes e posicionamentos fortes tomados durante a sua trajetória na OAB, a bento-gonçalvense, questionada sobre a importância dos cargos assumidos para a classe da advocacia, Beatriz se emociona ao relembrar momentos de sua carreira profissional que ajudaram a levar o nome da cidade para diversas partes do estado e do país. “Eu trabalhei muito para ter uma vida correta, pautada na ética. Se eu posso deixar algo como legado para as minhas filhas é o meu nome. Eu tenho muito orgulho em dizer que eu, Beatriz, sou cidadã bento-gonçalvense e levo, sim, Bento Gonçalves para todo o lugar que eu vou”, declara.

Beatriz acredita que todas as funções assumidas durante a sua carreira ajudaram a destacar o nome da cidade. Ela salienta que faz questão de frisar que é advogada de uma cidade do interior do estado e aponta para a força da mulher interiorana. “Nós seguimos exemplos de várias líderes da região. Uma delas é a doutora Clea Carpi da Rocha, natural de Guaporé e que ocupa atualmente, o cargo de conselheira federal da OAB. Pela sua grande importância na construção da OAB, ela foi a primeira mulher a receber a medalha Rui Barbosa, pelos seus préstimos à sociedade. Precisamos seguir esses exemplos”, revela.

Desde o início de sua carreira no Direito, Beatriz integrou a comissão da Subseção de Bento, foi eleita secretária geral na diretoria de 1995-1997. Em seguida, foi conselheira seccional e no estado em três gestões intercaladas. Assumiu a vice-presidência da comissão de Direito Ambiental e vice-presidente da comissão da Mulher Advogada do Estado. Atualmente, preside a Comissão Estadual da Mulher Advogada. Com o trabalho em destaque, a bento-gonçalvense recebeu o convite do então presidente do Conselho Federal da OAB, Claudio Lamacchia para ser membro consultora do Conselho Federal da Mulher Advogada da OAB. “A responsabilidade aumenta, pois nem todos os estados estão representados. Eu levo a voz da mulher advogada a nível nacional”, ressalta. Atualmente, Beatriz preside a BPW (Bussiness Professional Woman), Associação de Mulheres Profissionais e de Negócios em Bento Gonçalves.

Estrutura da Subseção em Bento

Beatriz acredita que o trabalho realizado pela Subseção da OAB em Bento Gonçalves merece reconhecimento da sociedade. Ela salienta que o comprometimento da atual e das gestões passadas possibilitaram que a classe pudesse ter condições estruturais, a fim de fortalecer o trabalho realizado pelo profissional advogado, seja ele de Bento ou de outras localidades e que precisam utilizar do espaço para o trabalho. “Nós temos que elogiar todas as gestões, pois houve um caminhar muito importante de presidentes e de diretorias para a modernização da nossa sede. Ali é a casa da gente. É a nossa identidade. E precisamos continuar com esse trabalho institucional, mas também, de cidadania”, afirma.

 OAB no país e no estado

De acordo com a advogada, o trabalho da OAB merece destaque pela forma como a entidade é comandada. Segundo Beatriz, o atual presidente, Claudio Lamachia realiza uma gestão exemplar. De perto, ela acompanha as decisões e posicionamentos que são definidos pelo grupo e ressalta as qualidades do presidente. “É um visionário, um líder que admiro muito mais hoje, porque ele acredita na OAB. Ele já foi convidado para vários cargos eletivos para esta eleição, porém, ele não aceitou nenhum destes. Seu objetivo é terminar a gestão para a qual ele foi eleito, que é a de presidente do Conselho Federal da OAB. Isso demonstra o comprometimento da classe”, ressalta.

Em âmbito estadual, Beatriz destaca a visão empreendedora do presidente, Ricardo Ferreira Breier, principalmente, no apoio às causas que ela defende dentro da entidade, como é o caso da Comissão Estadual da Mulher Advogada. Para ela, é necessário destacar o apoio que a classe de advogadas recebe pelos dois presidentes. “Hoje, nós estamos em gestões muito tranquilas, onde dois líderes apoiam o trabalho das mulheres. Quando eu digo que homens e mulheres precisam caminhar juntos, esse é o retrato. Não poderia eu, Beatriz, estar trabalhando sozinha na Comissão se eu não tivesse o apoio e incentivo do presidente da diretoria da seccional da OAB do estado e nacional”, revela.

Funcionamento do sistema judiciário em Bento

Questionada sobre a atual situação do funcionamento do sistema judiciário em Bento, Beatriz destaca que há dificuldades, mas que não podem ser apontadas como um problema local. Ela afirma que no atual momento, a sociedade brasileira está com os olhos voltados ao Poder Judiciário e que o grande problema apontado por ela, faz junção as dificuldades institucionais-financeiras, em especial, no quadro pessoal. “Nós temos poucos juízes, promotores, servidores, então, isso dificulta o dia a dia processual”, explica.

Eleições 2018

Beatriz acredita que o atual processo eleitoral está passando por uma crise ética e não partidária. Prova disso, segundo ela, é a ausência de valores nas pessoas, que torna o problema maior do que apenas o pleito eleitoral, mas sim, no dia a dia, em situação do cotidiano. “Por exemplo, no momento em que um taxista chega para mim e pergunta se eu vou querer uma nota no valor cobrado na corrida, já está se incentivando a prática de corrupção, mesmo se depois ele negar, dizendo que não pratica tal ato. Isso não é correto”, explica. “Reclamamos dos nossos representantes em Brasília, na Assembleia ou até mesmo em nossa Câmara de Vereadores, mas a atitude de corrupção é a mesma nesse exemplo que eu dei. Só os valores financeiros são menores. A nossa fala tem que ser ética, nós temos que ser o exemplo”, acredita.

De acordo com a advogada, a OAB encabeça uma campanha nacional com o intuito de estimular o voto consciente do eleitor, fomentando a escolha de candidatos idôneos e evitando a prática do voto nulo ou branco. “Voto não tem preço. Tem consequência. Nós temos que analisar muito bem quem nós queremos que esteja nos representando. No momento em que eu estiver votando nulo ou branco, estou delegando o meu voto para que outra pessoa eleja quem quiser. Estou dizendo que o meu voto não tem valor. O nosso voto tem valor e ética”, ressalta.

Questionada sobre quais prioridades elencaria caso exercesse um cargo político, Beatriz afirma que é necessário fazer uma análise da gestão em vários aspectos e não apenas com um único foco. Para ela, a educação deveria nortear qualquer gestor público. “A partir do momento que você ensina uma criança a andar no caminho correto, com ética, na escola, na família, é ela quem vai cobrar as coisas. A educação é básica”, observa. Setores como a saúde e a segurança precisam ser fortalecidos para que haja uma política forte. Indagada, Beatriz diz que já recebeu diversos convites para entrar na carreira política, porém, acredita que não seja a sua meta de vida. “Estou num momento OAB e o meu foco hoje é esse. Mas se eu tivesse ocupando um espaço de poder municipal ou maior, a preocupação maior seria com a cidadania, aos valores”, defende.