Nova regra vale para a faixa etária entre seis a 11 anos. Em Bento Gonçalves, apenas 26,4% desse público tomou a primeira dose da vacina contra o coronavírus

Desde que um novo decreto foi publicado no Diário Oficial do Estado, mudando as regras quanto ao uso da máscara para crianças entre 6 e 11 anos no Rio Grande do Sul, a maioria dos estudantes de Bento Gonçalves que correspondem a essa faixa etária continuam utilizando o item, apesar do novo protocolo ser apenas uma recomendação, desobrigando o uso, desde o dia 26 de fevereiro.

Este ano, o município tem 4.590 alunos, na idade mencionada acima, matriculados na rede municipal de ensino. Depois que a nova determinação foi divulgada, a secretária de Educação, Adriane Zorzi, afirma que os profissionais das escolas municipais receberam orientações sobre a atualização da lei. “Foram repassadas as informações dos Decretos Estadual e Municipal, quanto a não obrigatoriedade do uso da máscara, mas que a mesma pode ser utilizada se for desejo da família”, salienta.

Após tomar conhecimento sobre o novo regulamento, a diretora da Escola Municipal São Roque, Andreza Peruzzo, contatou as famílias, solicitando que, dentro das salas, as crianças continuem fazendo uso do item de proteção. “Entendemos que se há a recomendação, quer dizer que há a necessidade, senão liberariam de vez. A partir de agora, cada família é responsável por essa decisão, mas foi feito um pedido para que mantenham a máscara dentro das salas de aulas. Nos ambientes ao ar livre e nas atividades físicas, aí sim, fica a critério de cada um”, assegura.

Direção da Escola São Roque solicitou que as crianças continuem usando a máscara, pelo menos, dentro das salas de aula

Diante do posicionamento do educandário, não ocorreu nenhum conflito entre pais e escola, mas Andreza conta que houve questionamentos do porquê foi feito o pedido para continuar com o uso. “Explicamos que estamos em um ambiente coletivo. Acredito que precisamos ter uma educação para tirar a máscara. Como vai ser essa nova realidade sem o uso? Como vai se dar o covid-19? Quantas vacinas vão ser preciso? São muitas perguntas. Tem diversas coisas que a medicina ainda está estudando. São muitas incertezas”, pontua.

Após o feriado prolongado de Carnaval, a escola reabriu na quarta-feira, 2 de março, primeiro dia de aula após o novo decreto. Para alívio dos profissionais da educação, grande parte dos 270 estudantes dessa idade permaneceram utilizando o item.  “O não uso foi bem baixo, menos de 1%. A maioria estava protegida, pelo menos dentro das salas de aula”, revela.

Na escola, cada turma é composta por 22 alunos. Apesar da quantidade, o distanciamento de um metro entre um e outro é atendido tranquilamente. Entretanto, a preocupação permanece devido ao contato entre os estudantes. “A gente sabe que eles levantam, conversam, a gente não proíbe abraço, beijo, contato físico, não tem como. É difícil. Como vamos pedir para não fazerem isso? São crianças. O que fazemos para protegê-los é passar com frequência o álcool em gel nas mãos deles, nas classes e nos materiais de uso comum”, explica.

Desde que educandário iniciou o ano letivo, no início de fevereiro, já registrou casos de profissionais contaminados e de um aluno positivado. Por isso, Andreza diz que não dá para saber qual vai ser o resultado da nova medida. “É impossível mensurar qual vai ser o impacto, se vai ter mais pessoas com covid-19 ou não, mas estou segura com a nossa parte, porque sei que estou sendo responsável, agindo da melhor forma possível, pensando no bem coletivo”, completa.

Embora a escola deva continuar solicitando o uso da máscara em espaços fechados, a diretora garante que a decisão das famílias vai ser respeitada. “Quem não quiser usar, tudo bem, não tem problema. As crianças não vão ser impedidas de entrar na escola e não vão sofrer nenhuma retaliação. Fica a critério de cada um”, salienta.

Por fim, a profissional destaca que os responsáveis pelos estudantes costumam confiar nas orientações repassadas pela escola, entretanto, a decisão final compete a cada um, a partir de agora. “Acredito que nesse retorno, com esse decreto, ficou bem na consciência das famílias o que fazer, sobre pensar no seu filho e no coletivo. Cada um tem sua razão para o uso ou não uso da máscara e nós vamos respeitar”, garante.

Rede estadual

Quanto ao novo protocolo, o coordenador da 16ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), Alexandre Misturini, relata que orientou todas as 70 escolas a sugerirem a continuidade do uso da máscara. “Não existe obrigatoriedade, mas uma orientação para que toda a comunidade escolar continue usando, mesmo não sendo obrigatório nesta faixa etária”, pondera.

A diretora do Colégio Estadual Dona Isabel, Silvania Luiza Chiarello, afirma que não esperava essa alteração do decreto. “Era algo que já estava estabelecido como certo e de repente muda a regra do jogo”, pontua.

A mudança gerou um conflito entre a comunidade escolar. “Há os pais que querem que as crianças continuem a usar a máscara e os que acham que não precisa. Então, isso está nos causando certo desconforto, mas vamos acatar o que o Estado determinou”, destaca.

Como a medida é recente, a diretora pretende fazer uma reunião com os responsáveis, para debater o assunto. Porém, como é um decreto estadual, garante que vai obedecer. “Não temos como desobedecer. Se as crianças quiserem ficar sem máscara, ficarão”, finaliza.

Entretanto, na escola Dona Isabel, o cenário não foi diferente. Durante a primeira semana de aula, os alunos continuaram utilizando o item de proteção. “Eu os vi de máscara, não houve grande mudança. Alguns estão tomando conhecimento agora sobre essa situação, porque era feriado até então”, acrescenta.

Por fim, a profissional salienta que independente do que ocorra, a escola vai continuar atenta aos protocolos de higiene. “A gente acata o que é determinado pela nossa mantenedora e continuamos atentos ao que está acontecendo, sempre cuidando da saúde dos alunos”, conclui.

Rede particular

Por meio de uma nota oficial, o Colégio Marista Aparecida manifesta que desde o início da pandemia, tem como premissa, seguir todas as determinações de prevenção e cuidado, com base nas orientações governamentais.

Ainda de acordo com o texto, “o uso de máscara pelos estudantes menores de 12 anos deixa de ser obrigatório para o acesso e permanência em nosso colégio. As famílias dos estudantes dessa faixa etária poderão decidir se eles usarão, ou não, esse item de proteção”.

Segundo o texto, o colégio vai continuar incentivando o uso de máscara por toda a comunidade escolar.  “Entendemos que essa é uma medida importante para minimizar a proliferação da covid-19”, afirma a nota.

Pais ainda querem o uso

O pequeno Henrique Barossi, 7 anos, chegava na escola no início tarde da sexta-feira, 4, com o item de proteção colocado corretamente no rosto. A avó, Vânia Maria Lorenzi Barossi, que deixou o neto no educandário, afirma que ao ar livre é até aceitável não utilizar a máscara, mas em ambientes fechados, acha necessário. “Acho que tem que aguartar um pouco mais. Em lugares fechados ainda tem que usar”, opina.

O supervisor de manutenção, Adilson dos Santos, pai do Pedro Henrique, de 9, acha necessário que o filho continue usando. “Dentro de casa, com a família, não usa, mas dentro da sala de aula, acho importante, tem muitas crianças junto. Ele sempre vem com a máscara. Sou contra a desobrigatoriedade”, defende.

Por outro lado, o mecânico Leandro Werner, achou bom o novo decreto. O pai conta que nos dois primeiros dias de aula dessa semana, o filho Henrique Merigo Werner, 5 anos, foi sem o item para a escola, mas na sexta-feira, optou por utilizar. “Acho que não tem necessidade de usar, porque o risco de transmissão dessa idade não é tão forte quanto dos adultos”, avalia.

A medida é precoce, avalia pediatra

A pediatra Ângela Rech Cagol afirma que a desobrigatoriedade do uso da máscara foi uma surpresa. “Acho que não estávamos preparados emocionalmente, especialmente agora, que viemos de um novo surto da pandemia nos meses de janeiro e fevereiro, mas acredito que esse decreto veio para que as medidas de cuidados comecem a ser revistas”, pontua.

De acordo com informações da Secretaria de Educação, 2.381 crianças entre 5 e 11 anos foram vacinadas contra o coronavírus em Bento Gonçalves. O número corresponde a 26,4% da totalidade da faixa etária. Considerando esse dado, a pediatra foi questionada se esse foi o período adequado para a medida. “Os índices de vacinação estão muito baixos, ainda existem muitas dúvidas e medo em relação a aplicação da vacina, especialmente da Pfizer. Como já não temos um número alto de imunizados e considerando que acabamos de sair de um novo surto, com essa variante nova, a Ômicron, me parece um pouco precoce a retirada do uso da máscara. Acho que não foi o melhor momento”, avalia.

Sobre os possíveis impactos, a profissional afirma que ainda não dá para saber. Entretanto, considerando o feriado de carnaval, acredita que o número de novos casos deva aumentar, dentro de aproximadamente dez dias. “Junto com esse momento de incerteza, vem a retirada do uso obrigatório da máscara dentro da sala de aula e nos ambientes escolares, então, acho que não foi uma medida muito feliz. Como pediatra, desaprovei essa conduta do governador. Respeito, afinal é a nossa lei maior, mas os meus filhos continuarão usando máscara”, finaliza.