Após fazer campanha para realizar procedimento na Tailândia, o filho de Rejane, hoje com 19 anos, teve diversos resultados positivos

Desde 2003, Rejane da Rocha Pires, mãe de Willian da Rocha Pires, de 19 anos, vive uma rotina diferenciada. Isto porque, por uma paralisia cerebral que aconteceu quando o jovem tinha dois anos, eles e o restante da família precisam, dia após dia, adaptar o seu cotidiano para dar conforto e mobilidade ao estudante.

Pensando nisso, em janeiro de 2019 a família de Willian começou a fazer uma campanha com o intuito de arrecadar dinheiro para que ele pudesse fazer um tratamento de células-tronco na Tailândia, pois o método é inexistente no Brasil. A ideia veio de pesquisas realizadas por Rejane ao longo do tempo. “Fui na Universidade de Caxias do Sul em 2004 falar com um neurologista e ele disse que naquele momento, não tinha muito o que fazer. O que seria bom para o Willian eram as células-tronco, mas que aqui não tinha e que poderia ser que em dez anos tivesse. Eu sempre estava pesquisando para ver se vinha para cá”, lembra.

Até que um dia, a mãe, dedicada em ver e melhora do filho, viu que alguns brasileiros conseguiram realizar o tratamento no país da Ásia. “Consegui entrar em contato com uma mãe do Mato Grosso e com uma de Portugal para ver como era e elas falavam que valia a pena. Mandei e-mail para o hospital de lá e me responderam pedindo exames de tomografia e coração. Eles deram o retorno dizendo que Willian se encaixava, só que o valor era muito alto. Daí começamos a fazer campanhas para levar ele”, recorda.

Apenas com tratamento e hotel foram gastos $34.221,00, além do custo da estadia da irmã de Willian, Bruna, que também precisou acompanhar os familiares para dar suporte. Ademais, o custo com passagens aéreas de ida e volta, fazendo a ligação entre Porto Alegre e Aeroporto Internacional de Bangkok, foi de cerca de R$20.307,90. Apesar da dificuldade em conseguir o valor total, Rejane lutou com esperança e fé. “Para todo mundo era um absurdo, diziam que a gente nem ia conseguir chegar lá, mas eu pedi para que Deus estivesse na direção. Em dez meses já tínhamos o dinheiro para viajar. Foi bem corrido, mas a gente conseguiu rápido”, conta.

O embarque foi em 13 de outubro de 2019, e durante os quase 25 dias de viagem, o estudante do IFRS recebeu o tratamento com células-tronco e procedimentos pelos quais não passou no Brasil. “Fisioterapia, aquaterapia, terapia ocupacional, terapia com oxigênio hiperbárico, acupuntura e terapia nutricional”, lembra.

Resultados

As dificuldades do jovem em caminhar melhoraram signifcativamente após a viagem
Foto: Thamires Bispo

A esperança da mãe de Willian era que o filho começasse até mesmo a caminhar por meio do tratamento. Ela afirma que esperava mais. “Lá na Tailândia tinham dois rapazes que falaram que o cérebro é complicado, não é assim que vai se fazer hoje e amanhã vai estar pronto, tem que ter uma continuidade, não era só aquele dia. Ele tinha que continuar indo, mas assim mesmo a gente viu resultados. A mão direita dele estava sempre fechada e segurando o dedão. Lá mesmo ele começou a falar ‘que dor na mão’. Aí a Bruna disse: ‘olha a mão dele do jeito que está’. Hoje ele movimenta bem melhor”, pontua.

Outro fator que teve uma melhora significativa foi a parte respiratória do rapaz. “Todos os anos ele internava e depois que foi para lá ele ficou super bem, não precisou internar mais. Ano passado ele teve que ir para o plantão, mas nem se compara com o que era antes, que mudava o tempo e já tinha que ir para o hospital”, sublinha.
Durante quase um mês, Willian pôde comer apenas as refeições cedidas pelo hospital, em uma dieta restrita, o que o ajudou a ganhar peso de forma rápida. “A massa muscular dele também mudou. Ele tinha as pernas bem ‘fininhas’ e deu uma boa engrossada. A postura também evoluiu bastante, ele era bem jogado para um lado e agora ele está mais alinhado”, destaca.

Na Tailândia, Wilian foi bem recebido pelos colaboradores do hospital em que se tratou
Foto: Arquivo pessoal

As dificuldades para andar também diminuíram consideravelmente. “Quando ele ia caminhar, a gente tinha que usar uma força para auxiliá-lo, agora ele já se ajuda bem mais. Antigamente ele conseguia mais andar no andador, mas de tanto que o tendão dele foi encurtando, ele não conseguia mais. Agora ele consegue de novo”, menciona.
Uma das grandes dificuldades de Willian em caminhar se dava pelos tendões curtos. “Ele andava na pontinha dos pés, agora esticou o tendão. Só que ele vai ter que fazer ainda uma cirurgia na perna direita, que está cinco centímetros menor que a outra, aí nem as células-tronco iam conseguir ajudar, porque é muita coisa”, pondera. Para melhorar o problema, Rejane conseguiu um calçado adaptado com um suporte que acrescenta os cinco centímetros que o jovem precisa.

Rejane ressalta que valeu muito a pena a viagem e todo o esforço para consegui-la. “Foi uma pena que ele não pôde continuar, porque aí deu uma pandemia. Teria que ter uma continuidade. Cada vez que ele vai, vai melhorando mais. Nós até pensamos em fazer outra campanha, mas como começou o coronavírus a gente não tinha condições, porque fazíamos bingos, jantares e pedágio e não tinha mais como. Depois, na volta, como começou a pandemia ele não conseguiu mais fazer as fisioterapias como deveria, aí prejudicou bastante”, esclarece.

A família, ano passado, fez rifas para conseguir fazer a fisioterapia PediaSuit, um método para tratamento de pessoas com distúrbios neurológicos, como paralisia cerebral. “Iria ajudar ele no equilíbrio e ele conseguiria fazer várias coisas sozinho. A gente fez, mas deu a pandemia e tivemos que comprar os brindes para dar, daí não sobrou muito”, lamenta.

Daqui para frente

Para dar continuidade ao tratamento, a família está em contato com um advogado. “Ele está vendo para nós conseguirmos via judicial, já está ajeitando os papeis. Se a gente conseguir, vamos levar o Willian de novo, e se não, vamos ter que fazer alguma campanha novamente”, prevê.

A história de Willian

Nascido em 2001, Willian era uma criança normal, mas era internado frequentemente com bronquite e laringite. Aos dois anos, passou por uma crise respiratória grave e foi para o hospital. “O pediatra deu nebulização com adrenalina e antibióticos e ele veio para casa no dia 6 de setembro de 2003. Deu uma melhorada, mas dia 7 houve uma piora, fazia muito barulho para respirar”, recorda Rejae.

Ao voltar ao plantão, o médico optou por auxiliá-lo na respiração com o oxigênio e mandou ele para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI). “Chegando lá, a doutora até falou que era exagero de o médico deixar ele ali, que logo ia ficar bem e seria encaminhado para o quarto. Só que cada vez ele respirava pior, então trocou o plantão e a médica disse que teria que intubar ele. A médica disse que era para eu sair, que ela ia fazer um raio x e de repente vi uma correria, e eu para o lado de fora. Depois a madrinha dele, que trabalhava na UTI, saiu na porta e eu perguntei ‘como é que está o Willian’?, e as lágrimas escorreram do rosto dela. Aquele foi o pior dia da minha vida”, assegura.

Willian teve uma sequência de paradas cardíacas, que conseguiram reverter. “Depois o pediatra disse que o tubo não estava na traqueia, pois ele tinha estreitamento de nascença e conforme ele foi crescendo, ela não foi desenvolvendo junto com o corpo. Por isso, tiveram que fazer às pressas uma traqueostomia nele para ele poder respirar”, relata a mãe.

Daquele momento em diante ele ficou em coma. “Isso foi em setembro, em outubro ele ainda estava desacordado. Os resultados dos exames davam sempre alterados. O neurologista chegou a me dizer que era para eu estar preparada para ele ficar vegetando, só que aí ele começou a reagir e acordou. Porém, entrou de um jeito e saiu de um bem diferente, ele perdeu a visão, o equilíbrio e a parte motora dele ficou toda comprometida”, lembra.

No final de outubro, Rejane conta que seu filho foi mandado para o quarto e, em dezembro, transferido para um hospital de Porto Alegre, onde corrigiriam a traqueia dele. “A doutora falou que iria mandar ele para casa para passar o Natal e Ano Novo com a família, mas era para termos todo o cuidado porque ele estava com pneumonia. Em 13 de janeiro eu tinha me comprometido de levar ele no hospital, porque ficou um granuloma na traqueia e ele tinha que corrigir. Quando eles estavam fazendo essa correção o aparelho a laser explodiu na garganta dele, queimou ele, a boca dele era toda inchada. Me falaram que o que estava por fora não era nada, porque a queimadura era por dentro mesmo. Ele foi para a UTI de novo e ficou internado até o final de agosto”, afirma.

De tempos em tempos ele precisava ficar internado por conta da queimadura. “Ele teve os plásticos que iam nos canos do aparelho afetando os pulmões dele e a traqueia ficou toda estreita”, conta.
A partir disso, a vida deles mudou completamente. “A gente fez fisioterapia em Bento, Porto Alegre, e nunca parava.

Encaminharam ele para o Hospital Banco de Olhos, para fazer uma fisioterapia para a visão. A gente ia de duas a três vezes por semana, era muito puxado, acordávamos às 5h para chegar lá. Transferiram ele para a Associação dos Pais e Amigos dos Deficientes Visuais de Caxias, ele fez estimulação para os olhos lá”, sublinha.

Agora, todos estão acostumados com o “novo normal” de Willian. A mãe, entretanto, ainda carrega na memória as lembranças da infância dele. “Ele ia para o banheiro sozinho, gostava de tomar banho, jogava bola”, salienta. No coração, entretanto, Rejane leva a esperança de um futuro brilhante para o filho.