Após sofrer uma queda de 53% no número de visitantes, empreendimentos apontam que, aos poucos, negócios retomam na região

Bordado de vales e vinhas verdejantes, o Roteiro do Vale dos Vinhedos é chamado de Europa brasileira, lembrando muito bem as regiões italianas. Sendo uma das seis rotas turísticas de Bento Gonçalves, o Vale abriga aproximadamente 80 empreendimentos, de acordo com a Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale), e atrai anualmente uma média de 300 mil visitantes.

Neste ano, a pandemia afetou consideravelmente o setor turístico, não só de Bento, mas do mundo todo. Ainda segundo a Aprovale, de janeiro a setembro de 2020, o roteiro recebeu 155 mil visitantes, uma queda de 53%, em relação ao mesmo período do ano anterior, quando foram registrados 333 mil.

Para atravessar esse momento de incerteza econômica, muitos empreendimentos do roteiro tiveram de se adaptar e encontrar novas formas de fazer negócio. É o caso da vinícola Almaúnica, que deixou de ofertar visitação e passou a agendar antecipadamente, algo inovador no local.

A empresa retomou as atividades em outubro e, desde então, aponta um aumento de 80% no fluxo de visitantes. “O feriado de Nossa Senhora Aparecida (dia 12) foi muito movimentado. Tivemos pessoas de Porto Alegre e região. Estamos trabalhando com uma programação de hora em hora e com grupos menores”, pontua a auxiliar administrativo Mariana Carraro Stello.

No dia da visita à vinícola, um grupo de São Paulo, que havia agendado há meses, mas, devido à pandemia, teve que adiar, participava de degustação de vinhos. “Conheço a Toscana e outras regiões da Europa, Bento é muito parecida. Me arrependo de não ter vindo antes. Temos que valorizar mais o Brasil”, destaca um dos turistas, o empresário Gustavo Kass. “Gostei muito da cidade, fiquei bem surpresa”, afirma a publicitária Ana Beatriz Akee.

Aumento do e-commerce

A sócia-proprietária da biscoiteria Itallinni, Lúcia Burille, enaltece que o e-commerce já era praticado dentro da empresa. “Já vínhamos trabalhando dessa forma. Com a pandemia, intensificamos a venda online, o contato com os clientes, fizemos lançamentos de produtos e ofertamos a eles diretamente. Aumentou muito o envio até as casas. Temos convênio com os Correios, com transportadoras e a loja virtual, que facilitam a entrega no país todo”, enfatiza.

Regiões sudeste e nordeste são os locais de origem mais frequentes dos visitantes. Foto: Franciele Zanon

Lúcia notou também um aumento no movimento diário. “As últimas três semanas foram bem boas, inclusive o feriado. Com certeza o pessoal já está voltando a visitar o Vale e a região toda. A gente percebe que são pessoas de longe, que tem me dito que se sentem muito seguras em vir aqui (no roteiro) como um todo”, observa. O empreendimento tem recebido uma média de 30 visitantes por dia.

Estímulo do turismo regional

Famílias deixam de viajar para fora do país e passam a fomentar o turismo interno. Brasília, Recife, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Santa Catarina e São Paulo são os principais estados de onde vem os visitantes.

Segundo o coordenador do varejo da vinícola Miolo, Cristian Corbelini, o consumo está cada vez maior. “Ainda é um turismo regional forte, mas percebemos muito os particulares que estão vindo de carro de outros estados, principalmente da região sudeste. No sábado e domingo do último feriado veio muita gente desses estados e na segunda-feira, algo mais regional. A procura tem crescido, comparado a março. Este mês foi de movimento inclusive superior. Em faturamento, setembro e outubro foram melhores do que o mesmo período do ano passado. É um reflexo do consumo de vinhos durante o período mais restritivo da pandemia, e, agora, que as coisas estão começando a ficar mais flexíveis, o pessoal está vindo e comprando muito bem”, reitera.

A movimentação de visitantes cresceu em setembro e outubro. Foto: Franciele Zanon

Ainda de acordo com Corbelini, o mês de maior fluxo, tanto em quantidade de turistas quanto em valor de vendas, é julho, o qual teve uma queda de 85%. Em comparação a setembro e outubro, quando o crescimento foi de 15%, ainda há um déficit na ordem de 60%. Entretanto, a expectativa é positiva, não sendo necessária a demissão de funcionários por parte da empresa.

O proprietário da Mondê Chocolates, Lauri Rasia, confirma que o turismo de fora do Rio Grande do Sul diminuiu e o regional cresceu. “Antes da Covid-19, o fluxo de visitantes era de 80% de fora do estado, agora está 50% cada”, respalda.

Lado positivo da pandemia

Questionada sobre a situação do empreendimento, levando em consideração a pandemia, a proprietária do café e padaria Charmosie, Denise Vicari, comenta que o momento trouxe um lado positivo. “Para mim foi bem melhor a pandemia. Veio mais pessoas de Bento, as que não conheciam, acabaram vindo por não ter onde ir. Como aqui é padaria, temos café colonial, fica mais uma opção de onde comer. O movimento forte é depois das 16h, pois eles vêm, tomam o café e vão embora”, conta.

Denise observa que nos meses de pico da doença, as vendas diminuíram pela metade. “Nos primeiros 15 dias que mandaram fechar tudo, íamos encerrar o Café, porque estava bem fraco, eu estava desistindo. Aí, negociamos o aluguel, baixamos custos, demitimos funcionários e, aos poucos, fomos voltando”, pondera. Segundo ela, de agosto para cá, precisou contratar duas funcionárias para o fim de semana.

Municipalização da ERS-444: O que dizem os empresários?

Prefeitura quer que se sejam repassados pelo Daer 14,1 quilômetros de extensão. Foto: Franciele Zanon

O Projeto de Lei, que prevê que parte da ERS-444, no Vale dos Vinhedos, se torne responsabilidade municipal, foi assinado pelo prefeito Guilherme Pasin. A solicitação feita ao Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (DAER) inclui um trecho de 7,22 quilômetros de extensão, iniciando no acesso ao roteiro, na BR-470, até entroncamento na localidade do 40 da Leopoldina. Além disso, serão repassados mais 1,26 quilômetro de rodovia até as proximidades da empresa Suvalan e ainda 5,64 quilômetros até a divisa com o município de Monte Belo do Sul.

Os empresários da Rota Turística foram, na maioria, a favor da municipalização.

Mariana Stello

“Sou a favor. A ERS fica abandonada, acostamento e manutenções feitas pelo Daer são bem ruins. Será melhor com a municipalização”, Mariana Stello
Lauri Rasia

“Acho que é válido, porque o Estado demora muito para arrumar a rodovia. Vejo que o município tem mais condições de assumir”, Lauri Rasia
Lúcia Burille

“Como empreendedora do Vale, sou a favor. Temos a questão de que é feito o pedido e é difícil para vir a verba do governo. Como é uma ERS muito movimentada, quando chove um pouco mais, já começa a abrir buracos, e o turista que vem enxerga tudo isso. Cortando um pouco os caminhos, conseguimos desburocratizar e facilitar a manutenção que é necessária”, Lúcia Burille
Denise Vicari

“Acho bem importante, porque às vezes eles (Daer) não conseguem dar conta, começa a vir mato, não tem a manutenção do asfalto. O município tem um pessoal mais qualificado”, Denise Vicari
Cristian Corbelini

“A gente observa que o Daer, que é o responsável, possui uma certa dificuldade até mesmo para cuidar das roçadas, tapar buracos. A questão principal é também se a prefeitura consegue abraçar isso, pois sabemos que é um trajeto longo. Ainda não tenho uma opinião formada, preciso avaliar um pouco melhor para ver o que demanda”, Cristian Corbelini

Foto capa: Franciele Zanon