Coincidência ou não, somos chamados a fazer quarentena em pleno tempo de quaresma – 40 dias em preparação à Páscoa – um tempo litúrgico que a Igreja nos propõe para revisitar nossa história, avaliar o quanto a nossa vida está alinhada com a vontade do Criador sobre nós mesmos e sobre a humanidade. Jesus, voluntariamente, retirou-se e foi ao deserto meditar, focar-se no essencial e decidir seguir o projeto de Deus, com tudo o que isso implicava.

Crentes ou não, façamos desta quarentena a nossa quaresma. Neste momento histórico no qual estamos imersos, a única certeza é a de que vivemos em meio a muitas incertezas. A pandemia Covid-19 nos recorda o quanto somos vulneráveis. Deparamo-nos com um vírus capaz de modificar nosso ritmo da vida, bem como a ordem mundial. De outra parte, esse impacto nos faz reconhecer que somos uma aldeia global, afetada pelo inesperado de forma quase equânime neste momento. Se não o fazemos por opção, agora vemo-nos forçados a deixar de lado qualquer individualismo, a abandonar nossos “egos”, a abrirmo-nos aos “ecos” (ecossistema, ecologia integral, economia solidária etc.) e a cuidar uns dos outros, como família global.

Uma crise supõe tomada de decisões com base em novos critérios, e esta crise, especialmente, nos exige reflexão pessoal e institucional sobre a solidariedade e como vamos vivê-la, genuinamente, sem romantismos. Que estilo de vida, esquemas e hábitos devemos deixar ir, para permitir que um novo modus vivendi se incorpore ao nosso cotidiano? Do lado de quem estamos?

Junto a quem vamos prestar nossa solidariedade? Neste momento, não cabem mais lamentações, passividade e, muito menos, indiferença. É tempo propício para pensar no bem comum, abertos para a partilha. É tempo de nos empenharmos na arte e na cultura do cuidado. É isso que pode reacender a esperança, na certeza de que não estamos sós.

Ir. Inacio Nestor Etges
Presidente da Rede Marista