Nos últimos anos, Bento Gonçalves tem se destacado como um polo cultural no Rio Grande do Sul, graças à implementação de projetos culturais financiados por diversas leis de incentivo e pelo Fundo Municipal de Cultura. Essas iniciativas têm sido fundamentais para o desenvolvimento, preservação e promoção da cultura local, além de estimular a economia criativa e proporcionar inclusão social.

A importância dos projetos

Os projetos culturais são essenciais para o desenvolvimento da cultura local. A cultura não apenas movimenta a economia, representando 3,11% do PIB nacional, como também gera um retorno significativo aos cofres públicos. O fomento à cultura, através de impostos retornados ao setor, permite a realização de muitos projetos que, de outra forma, não seriam possíveis.

Para Sandro Giordani, coordenador do Ponto de Cultura Vale dos Vinhedos / Circolo Trentino, muitos projetos culturais só são possíveis de serem realizados graças a este método. “Muitos projetos e o próprio fomento das culturas de base só são possíveis com o retorno dos impostos ao setor cultural”, explica.

A Lei Rouanet, conhecida formalmente como Lei de Incentivo à Cultura, é uma das principais ferramentas de fomento cultural no Brasil. Ela permite que empresas e cidadãos destinem parte do Imposto de Renda devido para patrocinar projetos culturais. Em Bento Gonçalves, essa lei tem possibilitado a realização de eventos, exposições, e a produção de conteúdo cultural que enriquece a vida da comunidade.

A Lei Aldir Blanc, criada durante a pandemia de COVID-19, tem sido vital para apoiar artistas e espaços culturais que enfrentaram dificuldades econômicas. Ela proporcionou um alívio financeiro crucial e permitiu a continuidade de diversas atividades culturais, garantindo que a cultura permanecesse viva durante tempos difíceis.

Já a Lei Paulo Gustavo, sancionada mais recentemente, visa ampliar ainda mais os recursos destinados à cultura. Ela promete fortalecer a indústria cultural, fomentar a produção artística e assegurar que mais projetos culturais possam ser desenvolvidos em todo o Brasil, incluindo Bento Gonçalves.
Os editais possibilitam a oportunidade para todos concorrerem dentro de regras claras para terem direito ao saber e fazer cultural. “Os editais são o caminho adequado para que se recebem recursos públicos para a execução da proposta cultural. Em regra, os editais são justos. Neles estão as regras oficiais e publicizadas para que se obtenha um parecer positivo. A aplicação das cotas também auxilia a minimizar as desigualdades sociais para um Brasil mais justo e igualitário”, diz Giordani.

O Fundo Municipal de Cultura de Bento Gonçalves é outra peça fundamental no cenário cultural da cidade. Este fundo permite que artistas e produtores culturais locais tenham acesso a recursos necessários para a realização de seus projetos. Os editais do fundo são acessíveis e buscam minimizar as desigualdades, promovendo a inclusão de diversos segmentos da sociedade.

Daniela Sandrin Copat, presidente do Conselho Municipal de Política Cultural de Bento Gonçalves, destaca a importância dos projetos culturais. “Eles desempenham um papel fundamental, com benefícios que se estendem muito além do “apenas” entretenimento. Incentivando projetos culturais, o poder público está promovendo uma ampla variedade de eventos, oportunizando à comunidade acesso a diferentes expressões culturais e artísticas. Desta forma, promove a inclusão e participação democrática”, explica.

Impacto na comunidade

Os projetos culturais têm um impacto significativo na identidade e no senso de comunidade entre os moradores de Bento Gonçalves. Eles promovem a aproximação entre os membros da comunidade, fortalecendo os vínculos e ressaltando a essência cultural local. Além disso, muitos projetos são desenvolvidos junto às comunidades de base, resgatando saberes e fazeres esquecidos ou pouco observados. Para Giordani, o município é rico culturalmente pode-se notar isto nos bairros e distritos. “Bento conta com várias iniciativas culturais e recursos federais que vão acrescento ao fundo municipal. Ainda não é possível contemplar a todos os projetos propostos, mas a qualidade das ações propostas pode ser vista nas comunidades e bairros, bem como nos distritos de Bento Gonçalves”, frisa.

Além do enriquecimento cultural, os projetos financiados por leis de incentivo e pelo Fundo Municipal de Cultura trazem inúmeros benefícios econômicos. Eles geram empregos, contratam prestadores de serviços, artistas e consomem materiais locais. Isso impulsiona a economia criativa e contribui para a geração de conhecimento e produtos culturais de livre usufruto.

Embora haja um apoio significativo, os produtores culturais ainda enfrentam desafios, como a baixa participação da comunidade e a necessidade de rígidos controles para prestação de contas. Copat acredita que os projetos culturais contribuem para a inclusão social e a democratização do acesso à cultura.“A cultura é um agente de transformação social, que traz aos cidadãos o senso de comunidade, de pertencimento e de identidade. Permite viver tradições, costumes e crenças. A cultura tem um valor intrínseco para a sociedade e não pode haver preconceito com as manifestações. Se gosta, curte. Se não é do seu gosto, apenas respeite, pois é de alguém”, conta.

O cenário cultural em Bento Gonçalves continua a evoluir. Com a implementação de novas tecnologias e a influência das novas mídias, há um potencial crescente para a criação e execução de projetos culturais inovadores. No entanto, é fundamental que os jovens sejam conscientizados sobre o uso adequado dessas tecnologias para evitar a disseminação de informações distorcidas.

Realizando sonhos

Diana Ruggeri Brandão, terapeuta holística, teve sua vida transformada graças ao apoio do Fundo Municipal de Cultura. Durante uma sessão de atendimento a uma menina de 12 anos, que estava ansiosa e com medo de uma prova de matemática, Diana sentiu a necessidade de criar algo que acolhesse crianças e as ajudasse a lidar com suas emoções. A inspiração para o livro “Borboleta Flora” veio durante uma aplicação de Reiki, onde a história surgiu completa em sua mente.

A história de Flora é singela e poderosa. Flora pensava que já deveria nascer borboleta, sem passar pelo processo de transformação. Através de momentos difíceis, ela aprende com sua mãe que é preciso confiar em si mesma e no processo da vida, cultivando paciência e aguardando o momento certo para que as coisas aconteçam.

Diana destaca que o Fundo Municipal de Cultura foi essencial para transformar a história da Borboleta Flora em um livro impresso. Com os recursos recebidos, ela pôde realizar seu sonho, produzindo um livro de alta qualidade que superou suas expectativas. Sem esse apoio, a realização do projeto teria sido impossível, pois envolveria diversos profissionais e recursos financeiros que ela não tinha acesso. “Com o recurso que recebi pude realizar o sonho de transformar a ‘História da Borboleta Flora’ em um livro impresso. Sem essa ajuda não conseguiria, pois para lançar um livro são necessários diversos profissionais e recursos financeiros”, explica Diana.

A maior dificuldade enfrentada por Diana foi não saber por onde começar. Através da ajuda da produtora cultural Daniela Copat, Diana descobriu o Fundo Municipal de Cultura e, a partir daí, tudo fluiu. O livro foi aprovado, lançado e Diana começou a ser convidada para contar a história em escolas e instituições de Bento Gonçalves e outras cidades do Rio Grande do Sul. “Achei que ficaria nos limites do nosso município, onde fui muito prestigiada, mas alcançou diversas cidades do Rio Grande do Sul, através da contação no teatrinho. Também fiz vendas de livros para vários estados brasileiros e alguns para o exterior. Quanto aos feedbacks foram muitos, em áudio, comentários nas redes sociais e presencialmente, e cada um teve um significado especial para mim”, revela.

O projeto foi um sucesso inimaginável, alcançando diversas cidades e estados brasileiros, além de feedbacks emocionantes de leitores, inclusive adultos. Esse sucesso motivou Diana a continuar escrevendo e ela já tem outros projetos em andamento, como o livro “A Corujinha Sabichona”, que aborda temas como empatia, sabedoria e humildade.

Diana acredita que promover mais eventos culturais e investir em programas de educação artística nas escolas pode despertar e incentivar o interesse das crianças e jovens pela cultura. Ela enfatiza que o reconhecimento e a valorização do trabalho dos artistas e projetos culturais são fundamentais para um ‘mundo novo’, onde a cultura transforma as pessoas. “Se os governos encararem a cultura como uma área da sociedade prioritária, teremos um ‘mundo novo’, pois a cultura transforma as pessoas”, expressa.

No teatro, uma paixão

Mônica Blume descobriu sua paixão pelo teatro aos 18 anos, após ser convidada por uma amiga para participar de uma apresentação. Desde então, ela tem dedicado sua vida à arte teatral, estreando com uma peça infantil em 1986. Mônica lembra com carinho de suas primeiras apresentações em escolas do município, onde percebeu que o teatro seria sua vocação.

Ao longo dos anos, Mônica participou de diversos projetos, como a circulação da peça infantil “Parque Mundo Verde” e iniciativas com o grupo sênior de teatro “Superando com Arte”. Mais recentemente, ela tem se dedicado à criação dos espetáculos de palhaçaria “As Phynas em Fenabephy” e “Enólifa Someliê”, além do projeto “Corpos em Cena – Núcleo de Pesquisa Cênica” e o esquete de palhaçaria “Um Jantar Romântico” no Circularte.

Mônica destaca que muitos de seus projetos foram realizados de forma independente, com pouco apoio das instituições e empresas locais. A falta de profissionais capacitados, poucos espaços para apresentações e ensaios, e o alto custo dos serviços necessários são alguns dos desafios enfrentados.
Os projetos culturais promovem a aproximação entre os membros da comunidade, fortalecendo os vínculos e ressaltando a essência cultural local. “Eles geram empregos, contratam prestadores de serviços, artistas e consomem materiais locais, impulsionando a economia criativa”, conta Mônica.

Mônica acredita que a promoção de mais eventos culturais e o investimento em programas de educação artística nas escolas são essenciais para despertar e incentivar o interesse das crianças e jovens pela cultura. “O reconhecimento e a valorização do trabalho dos artistas e projetos culturais são fundamentais para transformar a sociedade”, conclui.

Uma longa jornada nas artes

Cristian Bernich começou sua jornada nas artes cênicas em 1999, transitando entre teatro e dança. Com uma formação sólida que inclui um mestrado em Letras e Cultura, pós-graduação e mestrado em Educação Especial, além de uma graduação em Dança, Bernich dedicou sua vida à arte. Ele não apenas se apresentou em palcos, mas também fundou uma companhia de dança e teatro contemporâneo, desenvolvendo trabalhos inclusivos com a metodologia Dance Ability, aprendida com um professor dos Estados Unidos e aperfeiçoada em Portugal. “Trabalho com dança inclusiva desde que fiz uma especialização em 2022, na Ilha da Madeira, com a Companhia Dançando com a Diferença. Isso me permitiu criar obras que envolvem pessoas com diferentes habilidades, promovendo a inclusão através da arte,” comenta Bernich.

Em 2010, após retornar da Bahia, onde foi estudar, Cristian ingressou na recém-criada Secretaria de Cultura de Bento Gonçalves. Embora inicialmente tenha deixado a comissão de avaliação de projetos devido a divergências com o conselho, ele acabou assumindo a presidência do Conselho de Cultura entre 2013 e 2015. Durante sua gestão, contribuiu significativamente para a criação do Plano Municipal de Cultura, que, apesar de aprovado, ainda enfrenta desafios na implementação de várias metas. “A gestão cultural é complexa. Muitas vezes, os gestores não têm conhecimento profundo da área e isso impacta a execução dos projetos. Os fomentos culturais são essenciais porque permitem que a sociedade desenvolva a cultura local de maneira genuína,” explica.

As leis de incentivo, como a Lei Rouanet, Lei Paulo Gustavo, e Lei Aldir Blanc, junto com o Fundo Municipal de Cultura, têm sido fundamentais para a realização de projetos culturais em Bento Gonçalves. No entanto, Bernich aponta que os valores disponibilizados muitas vezes são insuficientes, levando a produções de qualidade inferior e a uma grande carga de contrapartidas para os proponentes. “Os valores dos projetos culturais não são justos. Em 2013, trabalhávamos com projetos de R$ 30 mil, hoje são de R$ 20 mil. Esse descompasso financeiro dificulta a contratação de profissionais qualificados e a execução de projetos com a qualidade desejada,” destaca.

A experiência de Bernich como conselheiro e presidente do Conselho de Cultura demonstrou a importância de uma gestão cultural eficiente e participativa. Ele enfatiza a necessidade de revisar e atualizar o Plano Municipal de Cultura, e de garantir que os projetos culturais recebam financiamento adequado para prosperar. “O futuro da cultura em Bento Gonçalves depende de uma gestão comprometida e de leis de incentivo que realmente atendam às necessidades dos artistas. A cultura local é um reflexo da nossa identidade e deve ser valorizada e apoiada adequadamente,” conclui.

Bernich destaca a burocracia envolvida no processo de inscrição e prestação de contas dos projetos culturais. “É muito detalhado e burocrático. Acho que tanto o Conselho quanto a Secretaria deveriam rever esse processo, pois poderia ser muito mais facilitado. A burocracia é um grande obstáculo para iniciantes e até para aqueles já experientes no campo da produção cultural”, argumenta.

Ele enfatiza que o valor investido em projetos culturais retorna para a economia local. “Quando produzi meu livro, não fiquei com nenhum desse valor. Todo o dinheiro voltou para o município, pagando serviços de diagramação, transporte, entre outros. Investir em cultura é investir na economia local, o dinheiro não se esvai, ele sempre retorna”, afirma Bernich.

As políticas públicas de incentivo são fundamentais para a produção cultural. “Elas permitem que agentes culturais, pessoas que vivem e respiram a arte e a cultura do município, possam desenvolver e apresentar novas visões e roupagens para suas obras. Isso enriquece a cultura local e promove um entendimento mais profundo das artes produzidas na cidade”, destaca Bernich.