Beato é conhecido como o “Pai dos Migrantes”, por ter se empenhado nessa missão durante toda a sua vida

No dia 9 de outubro o Papa Francisco presidiu, no Vaticano, a Missa em que o bem-aventurado João Batista Scalabrini foi proclamado santo. Ele foi uma figura impactante para Bento Gonçalves, pois, em vida, pisou no solo da Capital do Vinho.

Além disso, uma das grandes referências das ideias do santo é o Colégio Scalabriniano Medianeira. A irmã Isaura Paviani, diretora da instituição de ensino, destaca que Dom João Batista é o precursor da escola. “Ele fundou a nossa congregação em 1895, em vista da necessidade das crianças e das mulheres migrantes que estavam partindo da Itália”, conta.

Entre as prioridades de Scalabrini em vida, estavam os migrantes, principalmente aqueles que vinham de terras italianas para a América Latina. A diretora evidencia que com o passar do tempo, os italianos vinham para o Rio Grande do Sul e uma grande parte se instalou em solo bento-gonçalvense. “Eles escreveram para Scalabrini que aqui viviam como animais, porque não tinham nada”, historia.

De acordo com a irmã Isaura, Bento Gonçalves tem o primeiro colégio do Rio Grande do Sul de irmãs Scalabrinianas, que foi criado, inicialmente, com o objetivo de ajudar os migrantes italianos. Mesmo com a morte precoce do padre José Marchetti, um dos braços de Scalabrini na missão de ajudar os migrantes, sua irmã Assunta Marchetti seguiu com o trabalho. “A madre continuou, foi a superiora geral, veio para Bento, fundou a nossa escola e depois foi para Farroupilha, Caxias, Guaporé, Anta Gorda, Roca Sales, e assim foram se estendendo”, relata.

Irmã Isaura, ao lado de um dos retratos de Scalabrini no Colégio Medianeira

Para a diretora, no Brasil a congregação se firmou mais em educação, porque havia muitos italianos migrantes que não tinham escolaridade. “O Colégio Medianeira foi o primeiro na construção da Feira do Livro, a audição de piano era aqui, tínhamos escolas de vários instrumentos musicais, então sempre foi uma referência culturalmente. No início, eram só meninas, depois, com o tempo, as escolas foram se abrindo”, ressalta.

Conforme a educadora, Scalabrini foi um homem de uma visão ampla. Um exemplo é o direito de voto das mulheres italianas. “Ele falou com as autoridades e com o Papa para garantir que elas votassem”, menciona. Ademais, Isaura explica que o carisma da congregação, que é a fundação do São João Batista Scalabrini, é justamente para atender os migrantes. “Por exemplo, na África nós trabalhamos com os refugiados políticos e de guerra. Já em Moçambique, trabalhamos na área da saúde”, expõe.

A irmã destaca que, para ajudar os pobres, o fundador da congregação dormia quatro horas por noite. “Como na época teve muita pobreza, ele vendeu os cavalos, que eram o transporte deles, para adquirir outros. Vendeu também o cálice, que era de ouro, e todas as peças. Transformou toda a catedral porque ele era um homem das artes, da ciência e do social”, salienta.

Sobre a canonização, Isaura evidencia que há alguns critérios, como visitação no túmulo, que neste caso está na catedral de Piacenza. Outro fator são as virtudes e, depois, a beatificação, que aconteceu em 1997. Também são necessários dois milagres, mas Scalabriniano foi canonizado com apenas um. “O fato de ele estar nos altares, para nós, não modifica nada, porque continua sendo um homem com os pés no presente, mas a visão e os olhos no futuro. Ele queria uma congregação de irmãs que enxergassem longe, era esse o propósito dele. Para nós, é um momento extremamente importante”, sublinha.

3 princípios fundamentais para Scalabrini, segundo a irmã Isaura

1º – Manter a fé, para ele era fundamental, não importasse a crença. “Ele já trabalhava com várias religiões no norte da Itália”, frisa.

2º – Educação também era prioridade. “Se a gente for ler o que ele fala da educação lá do século passado, são as políticas atuais: o protagonismo dos alunos, educação integral e metodologias ativas. Ele foi professor, bispo e fundador”, enaltece.

3º – Saúde. “Em Bento, primeiro foi fundada a escola na rua Barão do Rio Branco, com as irmãs italianas, falando a língua e trabalhando com os italianos o gramatical. Depois, fundamos o Hospital Tacchini, junto com o doutor Bartholomeu Tacchini, que era um médico italiano. Scalabrini também criou, na Itália, a escola de surdos-mudos, como eram chamados os deficientes auditivos. A escola da Apae estava dentro do Medianeira. Segundo a história da escola, em 1966 nós a tínhamos aqui”, sublinha.

Importância da canonização para Bento

De acordo com o padre Volmir Comparin, responsável pela Paróquia Santo Antônio, a canonização trata, acima de tudo, do caminho da santidade. “É o jeito de a pessoa ter vivido, motivada pelo evangelho, gastando a vida para fazer o bem. É quando alguém se tornou um exemplo pelas virtudes. Uma pessoa corajosa, cheia de bondade, de paz”, explica.

Ele reitera que primeiro a pessoa é reconhecida pelas virtudes, depois ela é inscrita, e, após, se torna bem-aventurada. “Significa que fez um milagre, que os médicos locais e da Itália reconheceram que houve cura milagrosamente e ela perdura. Não é algo que dura 15 dias. Em muitos casos, um segundo milagre vem para ser santo, mas para Scalabrini, o Papa autorizou a canonização sem o segundo milagre, por esse homem ter se ocupado muito pelos migrantes, pelo sofrimento de quem precisava trocar de terra, de país, para ir trabalhar”, realça.

Comparin enfatiza que Scalabrini fundou as congregações dos padres e irmãs Carlistas e do instituto São Rafael para ajudar os migrantes. “Foi reconhecido que esse homem estava cheio de virtudes ou milagres, e agora ele é santo e pode ser venerado na igreja”, esclarece.

Padre Volmir Comparin com relíquia que fica na Paróquia Santo Antônio

O pároco sublinha que esta canonização, em específico, é ainda mais importante porque ele pisou em terras bento-gonçalvenses. “Ele esteve aqui em dois momentos, um deles em 27 de setembro de 1904. Estava vindo de Garibaldi, passou por aqui, ficou mais ou menos um dia, depois seguiu para Veranópolis e Nova Prata. Depois, nos dias 10, 11, 12 e 13 de outubro ele passou aqui. Scalabrini celebrava missas no Santuário Santo Antônio e fez muitas crismas. Não temos um número específico, porque não ficaram registros da época”, cita.

Sobre Bento Gonçalves, Scalabrini disse que em poucos anos, teve muito desenvolvimento, por ser um local de gente trabalhadora, religiosa e boa. “Um santo pisou a nossa terra, uma vez se pensava que eles estavam só longe. Tudo aquilo que nos marca, por exemplo, a relíquia que a gente tem, é um pedacinho dele. Como não temos ligação com o passado, pelo menos sabemos que ele existiu, que passou por aqui e que agora faz parte da comunhão dos santos no céu e pode ser um intercessor”, conclui.

Fotos: Thamires Bispo