Empresas que disponibilizam vagas, procurando profissionais qualificados, por vezes, encontram dificuldades para preenchê-las

O emprego de garçom surgiu num momento em que Gabriel Cecchin, 21 anos, mais precisava. Sua verdadeira paixão, a fotografia, não estava lhe dando retorno financeiro, pois, até então, trabalhava como assistente de iluminação. Além disso, havia sido vítima de um assalto, alguns meses atrás, na Avenida Osvaldo Aranha, quando voltava pra casa. No lamentável episódio, sua câmera, comprada a duras penas com o dinheiro de suas economias, foi levada embora pelos assaltantes. Mas essa era apenas uma das três vezes em que Gabriel passaria pela mesma situação. Em função disso, vivenciou uma forte depressão, desencadeada quando ainda tinha 15 anos. Mas com o passar do tempo, a doença o acometeu algumas vezes mais, principalmente, conforme revela, pela falta de valorização no emprego e o baixo salário.

Gabriel Cecchin é fotógrafo, mas atualmente trabalha no ramo da Gastronomia, um dos que mais empregam na cidade. Foto: Reprodução

Gabriel saiu de casa aos 18 anos. Agora vive com a namorada, no bairro São Francisco. Alimenta um forte desejo de viver fora do país, na Austrália, mais precisamente. O jovem faz parte da chamada Geração Y, nascida entre os anos de 1992 e 2010. Eles já nasceram envoltos pela tecnologia dos computadores, tablets e celulares, dando-se muito bem com esses dispositivos. Preserva certa inquietude de não adequar-se a pensamentos conservadores e vislumbra sempre um universo de possibilidades. Ela não se preocupa necessariamente em acumular bens materiais, mas, sim, viajar pelo mundo e conhecer outras culturas. Uma geração que, de acordo com a psicóloga Fernanda Duarte, carrega consigo um senso de responsabilidade social bastante apurado, ansiedade extrema, menos relações sociais, desapego das fronteiras geográficas e necessidade de exposição de opinião.

A geração de Gabriel não vislumbra permanecer a vida inteira em um único trabalho. O objetivo é ter várias experiências profissionais. No entanto, correm o risco de serem barrados pela falta de especialização. Outra característica notável, de acordo com Duarte, pode ser a impulsividade e a pouca tolerância diante das adversidades, no dia a dia do trabalho. Nesse quesito, a união da maturidade dos profissionais experientes, a inovação e imediatismo da geração mais jovem, seria a fórmula ideal de aposta para as empresas do novo milênio, acredita.
Gabriel não concluiu o ensino médio. Felipe Vargas, 21 anos, morador do bairro Progresso, também não. Da mesma forma, Henrique Rodrigues, 18 anos, do Bairro Aparecida, parou ainda no fundamental. Quando sair do exército, pois está prestando serviço militar, deseja procurar um emprego. Sua irmã, Jennifer Rodrigues, 20 anos, conseguiu um trabalho logo que chegou de sua cidade natal, Cruz Alta. A falta de estudo não é a única característica em comum entre esses jovens. Todos relataram ter muita dificuldade de conseguir um emprego.

O mercado de trabalho tem novas perspectivas

As Coordenadoras do Senai, Aline Dutra e Simone Basso, atentam para a importância do jovem estar qualificado e também cuidar da postura pessoal e profissional nas mídias sociais. Foto: Isabelle Domingues

De fato, algo a ser observado na atualidade é a procura cada dia maior de profissionais especializados, que aprimorem os conhecimentos em sua área de trabalho e estejam em sintonia com a inovação e necessidades exigidas pelo mercado atual. Principalmente em função da tecnologia que, se por um lado tende a substituir determinadas profissões, por outro, exige do profissional constante aperfeiçoamento, flexibilidade e criatividade.

Para preparar e atender a demanda do mercado, desenvolvendo competências, criam-se espaços de qualificação. Um deles é o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), cujo objetivo é formar mão de obra voltada para a indústria, com cursos didáticos nas mais variadas áreas. Dentre elas, se destacam a aprendizagem para o setor da madeira e mobiliário, polímeros e mecanica de manutenção de máquinas industriais. Trata-se de áreas de gestão, moveleira, eletroeletrônica e eletromecânica. A Coordenadora Técnica de educação profissional do SENAI, Aline Dutra, diz perceber que o jovem, quando está lá dentro, e pretende entender a busca da indústria por mão de obra qualificada, procura se inserir nas mais variadas formações que há dentro dos planos de curso da instituição.

Os cursos são voltados para jovens a partir dos 14 anos. Sendo eles oriundos do Jovem Aprendiz, não precisam pagar pela especialização. Há opções também para aqueles que procuram uma oportunidade de aperfeiçoamento e qualidade profissional. São oferecidos ensinos técnicos e de formação inicial e continuada. Para quem já estudou no SENAI, há ainda opções com pacotes de descontos.

A Coordenadora Pedagógica do SENAI, Simone Basso, explica que as empresas dirigem-se a instituição para buscar informações no balcão e já realizarem a contratação, assinando a primeira carteira profissional do aluno. Lá, todos os cursos ofertados são pensados de acordo com as necessidades da indústria.

A conquista do primeiro emprego

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístia (IBGE), a taxa de desemprego no Brasil ficou em 12,5% de fevereiro a abril. Esse índice subiu 0.5 pontos percentuais em relação a novembro de 2018 a janeiro de 2019 (12,0%), mas teve uma leve queda de 0.4 ponto percentual na comparação com o mesmo período do ano (12,9%). O número de pessoas desempregadas chegou a 13,2 milhões. Houve uma alta de 4,4%, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), numa análise de novembro, dezembro, janeiro; fevereiro, março e abril etc). Na comparação com igual período de 2018, ficou estável, segundo o IBGE.

Conforme relatos, em Bento Gonçalves as pessoas são atraídas pela promessa de emprego e prosperidade, mas percebem que sem um currículo extenso, há poucas chances de disputarem uma vaga, a menos que sejam indicados por alguém. Com Cristiane de Moraes, 28 anos, comerciária, também foi assim. Ela já havia trabalhado como garçonete de um restaurante, em Farroupilha, mas desejava retornar a Bento Gonçalves. Porém, só conseguiu emprego, numa loja de variedades, através de uma indicação. A moça ainda destaca outro ponto, a aparência. Ela acredita que a beleza, por vezes, se torna decisiva no mercado de trabalho. “Tem pessoas que veem a gente só pela aparência”.

Cleonice de Almeida, 39 anos, moradora do Bairro Vila Nova II, hoje está desempregada, procurando uma vaga de auxiliar de cozinha. No entanto, tem encontrado muita dificuldade, devido à falta de experiência. “Quando a gente é adolescente, não está nem aí. Depois é que paramos pra pensar no quanto o estudo faz falta em nossa vida”, revela. Cleonice também não estudou, mas está contente pelo fato de seus filhos, uma menina de 12 anos e um garoto de 15 anos estarem seguindo um caminho diferente. Ele, por exemplo, está tentando ser aceito no programa Jovem Aprendiz e tem planos de ser médico veterinário.

Estudo e qualificações são importantes

Rosângela Jardim, Diretora do Senac Bento Gonçalves, fala com muito carinho do Jovem Aprendiz. “É um dos programas mais antigos do Senac-RS”.
Com base na Lei 10.097/2000, as empresas de médio e grande porte devem contratar jovens entre 14 e 24 anos como aprendizes. Eles ganham experiência e a oportunidade de já ficarem empregados. Rosângela comenta que, assim como os outros integrantes do Sistemas S, o Senac oferece oportunidade de trabalho e aprendizagem durante a durabilidade do programa. No final desse período, o jovem tem grandes chances de ser efetivado.

Felipe Draghetti, 21 anos, tem muito a agradecer. Através do Programa, conseguiu seu primeiro emprego, aos 16 anos, numa loja de roupas da cidade. Hoje, passados seis anos de atuação, tornou-se gerente. Ele comenta estar muito feliz com seu trabalho e que pretende continuar atuando na área. “Sempre zelei por tratar bem o público. No meu ponto de vista, o diferencial, acima de tudo, é o bom atendimento e dar a assessoria que as pessoas procuram”.

Felipe considera que a experiência não deveria ser algo crucial para a contratação. “Acho que não é o mais importante e, sim, a vontade. Sempre busquei aprender, me aperfeiçoar. Fui contratado e pude demonstrar isso. É só demonstrar vontade, querer evoluir que, com certeza, dá certo. Eu sou a prova disso”, considera.

O cenário atual

Fernando Casagrande poderá concorrer na maior competição de educação profissional do mundo, em Xangai, na China. Foto: Isabelle Domingues

Tratando do mercado de trabalho em Bento Gonçalves, Rosângela faz uma análise de quais áreas estão contratando mais. Para ela, o cenário atual está direcionado ao viés turístico da região. “Profissões voltadas para a gastronomia, como cozinheiro, garçom, recepcionista, confeiteiro, gestão de restaurantes, são profissões que, em nosso contexto, estão entre as mais procuradas. Além do setor do comércio, pois também atende turistas” destaca.

Quando perguntamos à Rosângela Jardim quais setores do mercado, de uma forma geral, são, hoje, as promessas mais lucrativas de investimento, a diretora destaca as áreas da Gastronomia e da Beleza. Para ela, cada vez mais as pessoas buscam trabalhar o seu negócio, como empreendedores, e não dependerem necessariamente de serem contratados. Ela cita como exemplo os cursos de manicure e cabeleireiro, áreas que possibilitam atuar por conta própria.

Esse é o caso de Fernando Casagrande, estudante do curso de Cabeleireiro, que ficou na posição de segundo melhor do estado, em sua ocupação, representando o Senac Bento Gonçalves, nas Competições Senac de Educação Profissional. A conquista dessa colocação é importante, pois ela garante que o jovem bento gonçalvense possa representar o estado num próximo evento a nível nacional. Porém, para que isso ocorra, será necessário passar por uma prova, ano que vem, para desempate entre ele e a primeira colocada, Anna Luiza Ramos. Ambos continuarão estudando e se aperfeiçoando até a eliminatória. A partir dessa etapa, os primeiros colocados irão para a WorldSkills, a maior competição de educação profissional do mundo, que acontecerá em Xangai, na China, em 2021.

Cursos online

É preciso, em conformidade com a motivação e valorização da empresa em relação ao funcionário, que esse profissional também busque alternativas para estar se reinventando e acompanhando as mudanças e evoluções necessárias à função exercida, assumindo, dessa forma, a sua parcela de responsabilidade por seu aprimoramento profissional. Alternativas não faltam. Já que estamos falando em tecnologia, sabemos da função primordial da internet, nesse contexto.

Hoje é possível também se especializar através de cursos inteiramente online, e gratuitos. A Fundação Getúlio Vargas, instituição brasileira de ensino superior, que atua desde sua fundação, em 20 de dezembro de 1944, dialoga com esse tempo oportunizando cursos de extensão e qualificação online, em seu site. Basta o interessado fazer o seu cadastro no site e escolher o curso desejado.

Independente da visão e área de interesse de alguém que está buscando emprego, uma coisa é certa, conforme observa o Coordenador da Agência FGTAS/Sine, Sandro Castagnetti. A escolaridade e a falta de experiência estão entre os fatores nos quais os candidatos mais têm pecado, ultimamente. Ele comenta que nas conversas com as empresas, na busca de que elas abram algum precedente, pouco sucesso obtém, pois os critérios são determinados pela própria empresa. “A pessoa que está buscando, hoje, uma vaga no mercado de trabalho, se ela não tem o segundo grau completo, que termine o segundo grau e depois vá se qualificar”, acrescenta.