Sabe, quando você é tomado por um turbilhão de ideias malucas e fica em dúvida de qual agarrar? Embora seja o oposto de quando a página em branco é a foto do seu cérebro, o dilema é o mesmo: “O que vou escrever hoje?”

Da série Poltergeist, o mistério ainda não foi desvendado. Sei que alguma criatura física – ou não – anda rondando os aposentos aqui, de casa. Já fizemos várias armadilhas em vão. O encanador está arrebentando azulejos. Diz que aí tem coisa… “Que coisa?”, perguntei. “Vamos abrir mais pra ver…”, me disse ele com um sorrisinho enigmático. Enquanto isso, o buraco aumenta. Não sei o que vai sair de lá.

Aí me deu um click. E se contasse o que não aconteceu, mas que poderia muito bem ter acontecido, há pouco mais de dois anos, com consequências inimagináveis? Na verdade, inimagináveis para mim, porque a galera, daqui de casa, não só imaginou como dramatizou a ponto de me fazer sentir culpa. Foi assim:

Dia de dentista. Sou meio obcecada pelo tempo, por isso não gosto de perder minutos valiosos sentada na cadeira aguardando a minha vez. As pernas ficam inquietas, as mãos não sossegam, fico tamborilando, suspirando, coisa e tal. Atualmente o celular preenche um pouco o vácuo, mas chega uma hora que começo a bufar.

Naquele dia, para evitar esse desassossego, até porque eu estava excepcionalmente adiantada, resolvi me exercitar, subindo os trinta lances de escadas que dariam à clínica dentária – meus joelhos ainda não reclamavam. Ao chegar ao décimo andar, me deparei com uma porta esquisitona fincada no degrau, imprópria para a passagem de quem subisse. Estava na cara que o engenheiro da obra só havia pensado no sujeito fugindo de eventual incêndio escada abaixo. Foi aí que aconteceu. Puxei a maçaneta com o vigor dos meus… “quarenta” anos e simultaneamente caí, com uma das pernas prensada.

A noite chegou, a luz apagou, o prédio fechou, o povo sumiu, e eu aí, presa. Sem celular. Meu pessoal se mobilizou, mas a procura não deu em nada. Afinal, quem iria imaginar onde eu estava?
Felizmente, a passagem acima não aconteceu, porque consegui me erguer e segurar a porta sacana. Meu corpo acompanhou a perna que não desistira e ultrapassei o umbral do inferno rumo ao meu destino.