Números divulgados pela Secretaria Municipal de Saúde de Bento Gonçalves (SMS), apontam para crescimento de casos de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs), em especial, a sífilis que até este mês, alcançou a marca de 217 diagnósticos. Os números são considerados pela pasta alarmantes e requerem maior atenção e prevenção da comunidade. Afinal, se não tratada, a infecção causada pela bactéria (Treponema pallidum) pode comprometer vários órgãos como olhos, pele, ossos, coração, cérebro e sistema nervoso. Fatores como o preconceito em tratar do assunto sexualidade dentro de casa e na escola são apontados por estudantes, como um dos principais motivos pela desatenção ao proteger-se durante a relação sexual.
Conforme dados da SMS, em 2016, foram registrados 261 novos casos de sífilis. Faltando pouco mais de 60 dias para o final do ano, até a primeira semana de outubro, os números já ultrapassam a marca de 200. Segundo o secretário Diogo Segabinazzi de Siqueira, os números são alarmantes e, por isso, a pasta deve priorizar a prevenção, com a disponibilidade de meios que auxiliem na descoberta da doença, ainda no estágio inicial. “Estamos priorizando a prevenção na saúde, desde fornecimento de testes rápidos, encaminhamentos dos pacientes para exames de detecção, realizando palestras com as equipes de saúde e comunidade, enfim, acreditamos que em longo prazo estaremos reduzindo os custos se fizermos uma prevenção eficiente agora”, afirma.
Diálogo em casa e na escola
Para entender a realidade de adolescentes e jovens, a reportagem do Semanário foi até um educandário de Bento Gonçalves, que não será identificado na matéria, para conversar com alunos do segundo e terceiro anos finais, com idades entre 16 e 18 anos. Conforme os estudantes, que terão a sua identidade preservada, mesmo com a divulgação pelos meios de comunicação, ainda falta um espaço dentro de casa e na escola para que esse assunto seja discutido em maior profundidade. “Em casa, nossos pais se preocupam muito com a questão de não engravidar, mas se esquecem de que sem o uso do preservativo, estamos propensos a contrair diversas doenças. É uma questão bem complicada, porque envolve muita coisa e tudo vai depender da mentalidade da família. O diálogo deve ser constante”, afirma a estudante N.P, 16. Ela diz que, muitas vezes, a roda de amigos e a internet, são os principais meios para se inteirar do assunto. “Por se tratar de algo delicado, na visão da família, a gente acaba indo conversar com amigos ou até mesmo acessando conteúdos relacionados a doenças na internet”, explica.
Além da ausência de uma conversa dentro de casa, outro fator apontado pelos estudantes está à ideia de que o prazer é a coisa mais importante, o que resulta também a irresponsabilidade, quanto ao uso de preservativos durante o ato. “Outro fator que faz com que muitas vezes a doença seja transmitida é a questão do excesso de bebida consumida nas festas. O pessoal acaba perdendo a noção, bebe demais e esquece de usar a camisinha. Para muitos, na hora, tanto faz, porque o prazer fala mais alto”, diz P.C, 18.
Quanto a questão do debate em sala de aula, M.G, 17, argumenta que o assunto deveria ser tratado de forma mais eficaz, não apenas com palestras e visitas nas salas de aula, com a entrega de folders explicativos. “Quando isso acontece, muita gente nem lê o que estão dando. Acho que faltam iniciativas mais eficazes, que impressionem os alunos, como, por exemplo, quando se fala em mortes no trânsito. Se pessoas que passaram por uma situação de contaminação com alguma DST viessem para dentro da escola contar sobre sua vida, acho que surtiria mais efeito”, garante.
Reforço na prevenção
Para o secretário Segabinazzi, a prevenção deve ser a chave principal para evitar a proliferação das doenças. “Obviamente, a prevenção das DSTs necessita do acompanhamento das escolas, governos e das próprias famílias para podermos diminuir a incidência destas doenças”, acredita.
Conforme Segabinazzi, “as principais ações de prevenção são as ofertas dos testes rápidos, que sempre vem acompanhado do aconselhamento – serve de tira dúvidas sobre o tema, individualmente, palestras para população em geral conforme demanda e agenda nos serviços de saúde. Ainda teremos o Novembro Azul (saúde do homem) e 1º de dezembro – dia mundial de luta contra Aids”, pontua.
O avanço da doença também preocupa especialistas da área. Conforme a médica infectologista Daniela Zilio Larentis, qualquer pessoa com vida sexual ativa precisa manter o cuidado durante as relações sexuais, independente de faixa etária. “O risco em contrair uma DST indefere de qualquer idade”, afirma.
Segundo Daniela, mesmo com as diversas formas de prevenção, se o paciente contrair a doença, é necessário buscar pelo tratamento o mais rápido possível. “Ele é gratuito na rede pública de saúde e, com certeza, vai ajudar na diminuição da propagação da doença”, garante. Ela explica ainda, que se o tratamento não for realizado, o paciente pode sofrer com diversas complicações a longo prazo, como a neurosífilis (manifestação da doença no sistema nervoso central, que pode vir a causar demência). “Também evita a infecção do feto durante a gravidez, uma vez que pode causar diversas doenças ao recém-nascido”, pontua.
Para a infectologista, a prevenção é um dos principais meios para diminuir os casos. Ela salienta ainda que os números podem ser maiores, pois em muitos casos, eles não são notificados, em virtude da doença começar silenciosamente e só mostra sintomas após o segundo estágio. “Todos que possuem vida sexual ativa deveriam realizar o teste. Ele é gratuito nos postos de saúde da rede pública. É preciso prevenir”, afirma.
Estágios
A doença se manifesta em três estágios diferentes: sífilis primária, secundária e terciária. Nos dois primeiros, os sintomas são mais evidentes e o risco de transmissão é maior. Depois, há um período praticamente assintomático, em que a bactéria fica latente no organismo, mas a doença retorna com agressividade acompanhada de complicações graves, causando cegueira, paralisia, doença cardíaca, transtornos mentais e até a morte.
Sífilis Primária
pequenas feridas nos órgãos genitais (cancro duro) que desaparecem espontaneamente e não deixam cicatrizes; gânglios aumentados e ínguas na região das virilhas;
Sífilis Secundária
manchas vermelhas na pele, na mucosa da boca, nas palmas das mãos e plantas dos pés; febre; dor de cabeça; mal-estar; inapetência; linfonodos espalhados pelo corpo, manifestações que também podem regredir sem tratamento, embora a doença continue ativa no organismo;
Sífilis Terciária
comprometimento do sistema nervoso central, do sistema cardiovascular com inflamação da aorta, lesões na pele e nos ossos.