O assunto girava em torno de uma menina no limiar da adolescência e crendices que envolvem o tema. Coisas íntimas que não são da conta de ninguém, mas que muitos adoram especular e dar o seu pitaco.
Então, após uma análise visual da geografia do alvo, da sua altura, de suas curvas, saliências (como as famosas “laranjinhas”) e reentrâncias, surgiu a pergunta:

-Ela já ficou mocinha?

Ora, ora, ora! Isso era por lenha na fogueira de uma discussão que prometia ir além da linguística. Atiçar o lado direito e esquerdo do cérebro da advogada, conhecida pelo prazer em contestar e habilidade de argumentar, tinha o seu preço.

-Por que “ficou mocinha”? Ontem ela era menos mocinha que hoje? Foi só menstruar que vira mocinha de um dia para o outro, como num passe de mágica?

-É o hábito… – sugeriu alguém já sem muita convicção.
-Um hábito idiota. Na verdade, um mau hábito – rebateu ela.

E tanto martelou nessa questão que a balança da Justiça pendeu para um lado. Alguém concordava. Com ressalva.

-Tem sentido! Mas, pensa comigo, não é pior que “menarca”. Eita palavrão do caramba! Lembra fuzarca, barca, comarca…

Opa! “Comarca”. Era o que faltava para a história seguir o rumo do coração. Com a palavra, a advogada contou que, durante uma audiência trabalhista, o autor do processo perdeu o caso por causa de um sorriso.

-Como assim?

Ela disse que se tratava de um processo indenizatório por danos morais decorrentes de uma alcunha constrangedora. Só que, no momento em que o reclamante teve de confirmar o apelido diante do juiz, ele sorriu. E o sorriso acendeu uma luz para o caso praticamente perdido para o empregador. Em sua argumentação, a advogada (representando a empresa) alegou que o sorriso do assediado era uma prova de que a alcunha não lhe provocava desconforto, nem diminuíra sua autoestima, já que ele achava graça, e que, se realmente fosse uma coisa vexatória, a reação do reclamante seria bem diversa.

-Uau! Me adiciona no whats. Se eu precisar de um defensor, vou te procurar. Anota aí o número…

Então o cara anunciou o nove (9), fazendo uma pausa significativa antes de ditar o resto.

-Não posso acreditar que, depois de quatro anos, o nono dígito ainda não foi incorporado ao número do celular! Isso é resistência a mudanças? O que há por trás disso? – questionou a advogada, pronta para uma abordagem psicológica.

E antes que ela começasse a puxar novo fio da meada, agora mais íntimo e perigoso, o grupo se dispersou.