Desde muito jovem, Cedenir Postal ajudava a família nos trabalhos que envolviam a agricultura. Parou por um breve período, para concluir o Ensino Médio no Colégio Seminário dos Freis e para ingressar no quartel. Entretanto, logo voltou a exercer a atividade de agricultor da qual segue até hoje. Além disso, Postal trabalha como feirante há cerca de 25 anos.

Paralelamente a isso, desde junho de 2017 é Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bento Gonçalves, entidade que, esse ano, passou por reestruturação interna. Na entrevista a seguir, Postal fala sobre as ações do sindicato e sua visão sobre a economia da cidade, Estado e país.

Cedenir Postal ao lado da esposa Rosane e das filhas Fabiana e Eliane

Jornal Semanário: Sua trajetória profissional

Cedenir Postal: Sempre fui e continuo sendo agricultor familiar. Trabalho nas terras da família. Diferente da maioria dos agricultores da região que trabalham com uva, lido com hortaliças, tomates, pimentão, berinjela, melão, abobrinha, pepino, brócolis, repolho, enfim, culturas variadas. Vendo na feira do produtor e entrego nas fruteiras, principalmente da cidade.

JS: Seus exercícios comunitários

CP: Sempre atuei onde moro, na Comunidade de São Luiz do Rio das Antas, em todos os eventos. Ajudo na igreja. Fui festeiro da paróquia de São Roque. Quando fui Presidente da Associação dos Agricultores Familiares, participei do grupo que entrega merendas escolar para as escolas municipais e estaduais de Bento Gonçalves. Onde me chamam estou disposto a ajudar.

JS: Como está o sindicato?

CP: Conseguimos reestruturar nossa equipe interna, voltamos a ser a casa do agricultor. Hoje, as pessoas falam que dá gosto de entrar no sindicato. A prestação de serviços é de qualidade, o atendimento ao associado e ao agricultor é bem feito e a equipe de funcionários é qualificada. Temos mais de mil associados.

JS: Quais as metas para 2020?

CP: Estamos trabalhando na renovação dos convênios, com os parceiros, para reafirmarmos os que já temos e firmarmos novos, de uma forma um pouco diferente.

Pretendemos fazer uma série de reuniões em todo interior, não só em Bento, mas em Monte Belo do Sul, Santa Tereza e Pinto Bandeira. Calculamos em torno de 45 reuniões com as comunidades.

Concluímos o Plano de Prevenção Contra Incêndio (PPCI) do sindicato e já estamos executando para atender a legislação.

Queremos aproximar o jovem do sindicato, temos uma diretoria que não tem nenhum jovem. Desde o ano passado, no Congresso da nossa federação, se tornou exigência que todas as diretorias de sindicatos tenham, pelo menos, 30% de mulheres e 20% de jovens.

JS: Por que é bom ser sócio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais?

CP: Temos todo suporte para os agricultores: cadastros, documentação que o agricultor precisa, tanto pessoal quanto da propriedade, encaminhamentos para financiamentos, para aposentadoria damos todo suporte.

Nossos parceiros dão descontos para quem é associado. Se colocarmos na ponta do lápis o que o agricultor paga de mensalidade para ser associado, os serviços que vem fazer aqui e os descontos que têm dos parceiros, a mensalidade fica sem custo nenhum, praticamente.

JS: Quais setores da economia rural que mais estão crescendo? Uva, maçã, morango?

CP: Na nossa região, a principal cultura sempre foi a uva. Pinto Bandeira tem o pêssego, ameixa e caqui, que são fortes naquela região. No Vale do Rio das Antas tem aumento grande na produção de citros: laranja e bergamota. Na região de Santa Tereza também tem na várzea do Rio das Antas e como é um lugar mais quente, tem a produção de hortaliças. Monte Belo do Sul é um município que tem pouca diversificação, praticamente é só uva, mas o turismo rural e as agroindústrias estão crescendo bastante.

JS: Como está a produção e crescimento dos orgânicos?

CP: Do meu ponto de vista, não sei se é o mercado que não tem expansão, mas aqui está praticamente estagnado.

A agricultora orgânica é interessante, mas é um nicho de mercado que requer muita dedicação do agricultor, além da consciência de que, se não tiver alternativas para controlar uma praga, corre o risco de perder toda produção em questão de dias.

JS: Como o senhor vê o crescimento da vitivinicultura catarinense?

CP: Santa Catarina até um tempo tinha uva basicamente para o vinho, mas assim como nossa tendência, também partiu para a produção do suco de uva. Tem regiões especificas nos municípios de Videira, Pinheiro Preto, Tangará que são produtoras, mas hoje a vitivinicultura se espalhou praticamente para o Brasil inteiro, alguns polos avançaram mais e outros menos. Isso é graças também as pesquisas da nossa Embrapa Uva e Vinho que desenvolveu variedades novas que se adaptam em outras regiões.

Cresceu a produção de uvas para sucos, a exemplo da Bordô, Magna, que é uma variedade nova com qualidade e a nossa tradicional Isabel, que representa 40% da produção uva. Existem ainda parreiras centenárias que continuam produzindo muito bem.

Suco de uva e espumantes são os que mais cresceram. Existe uma projeção de que esse ano mais de 70% da uva será destinada para os sucos.

JS: Qual sua visão sobre Vale dos Vinhedos – Aurora – Faria Lemos?

CP: O Vale dos Vinhedos já é um roteiro turístico consolidado. Com o Vale Aurora, Faria Lemos, Caminhos de Eulália, Caminhos de Pedra, a minha preocupação é que a urbanização que está indo para esses locais e podemos perder a característica rural. O turista sai das grandes cidades e vem para cá querendo ir embaixo das parreiras, ter a tranquilidade da vida do interior. Não adianta saírem de uma cidade grande e virem para um lugar movimentado, com o mesmo estilo de onde estavam. Sabemos que quando começa a urbanização, os problemas de violência, movimentação de pessoas e deslocamentos são mais difíceis e em alguns casos falta infraestrutura.

JS: A ligação asfáltica do Vale – Aurora – Faria Lemos faz falta? Por que?

CP: Faz muita falta, tanto para o turismo quanto para os agricultores. No caso do Vale Aurora, a estrada é de chão, no Caminhos de Eulália também, os acessos são difíceis. Faltam investimentos em infraestrutura por parte do poder público. Nos últimos 20 anos foram asfaltadas poucas estradas do interior. Algumas são muito movimentadas e nada foi feito.

JS: Sua visão sobre a feira livre

CP: Sou feirante há cerca de 25 anos. Precisamos de uma infraestrutura melhor, de um espaço abrigado, de um pavilhão. Poderia ser na Praça Centenário, não iria interferir no trânsito, mas precisa de recursos e vontade política para fazer.

A feira é um local onde vendemos bem. Os consumidores gostam de ir porque compram produtos direto do produtor, colhidos no dia anterior, frescos e de qualidade. Existe contato entre produtor e consumidor, a gente conversa, eles perguntam como é a produção, criamos um relacionamento e isso é legal.

JS: Sua visão da assistência ao viticultor

CP: A assistência que a prefeitura dá é focada nas agroindústrias. No passado tivemos o Programa de Máquinas terceirizadas, mas deixa a desejar. É tão pouco o orçamento destinado para a Secretaria de Agricultora. É tão pouco o que os agricultores precisam. Às vezes as empresas não se deslocam da cidade para ir ao interior, sabemos que é difícil, precisa de caminhões grandes, as estradas são de difícil acesso e não é viável economicamente, mas se é por meio da prefeitura, consegue-se chegar nos agricultores mais distantes, mas isso está faltando por parte da prefeitura.

A Emater tem vários programas de assistência e está sempre junto com os agricultores. É um excelente parceiro do sindicato com um belo trabalho. Acompanha as agroindústrias na produção, nos projetos técnicos, na orientação dos agricultores e na assistência. Porém, não consegue atender a demanda dos agricultores pela carência de funcionários, precisam de mais.

A Embrapa trabalha bastante nas pesquisas, no desenvolvimento de novas variedades, inclusive para atender outras regiões do Brasil, que estão dando certo.

O governo do Estado dá assistência via Emater, que é uma entidade privada, sem fins lucrativos. E o Governo Federal dá subsídios no Seguro Agrícola. O nosso principal é o Seguro Granizo, que o governo auxilia com 40%.

JS: Que conselhos daria para um pequeno empreendedor rural? Plantar o que?

CP: Às vezes é difícil indicar alguma cultura. Temos que considerar a localização, para qual cooperativa ou indústria pretende vender, porque se for para suco de uva, tem que plantar para essa variedade; se for para espumantes, tem que ser outra. É preciso fazer uma análise sobre a localização do agricultor e o que tem de mão de obra.

JS: Qual sua visão do desenvolvimento social e cultural de Bento?

CP: Uma cidade como Bento, pela característica turística, teria que limitar a expansão urbana, até para preservar os roteiros turísticos e nossa identidade como cidade de porte médio. Precisamos do desenvolvimento sim, mas não a qualquer custo. Temos casos onde a urbanização avançou em áreas rurais e os agricultores não podem tratar os parreirais porque tem vizinhos que não tem nada a ver com a agricultura.

Bento é uma cidade desenvolvida, rica, com muitas oportunidades, mas tem problemas. Se a gente circular pelo eixo principal, pelo centro, pelos bairros mais ricos, não vemos os problemas que tem nos bairros mais afastados porque às vezes estão maquiados, escondidos, mas a gente vê problemas de infraestrutura, de violência, não temos tratamento de esgoto.

JS: O que você defende como prioritário em termos de rodovias?

CP: São três rodovias importantes para o nosso desenvolvimento, para quem precisa escoar a produção, mas não adianta melhorar da porta para fora se a gente não arruma dentro da própria casa.

Temos que nos preocupar a nível estadual, quem vai para Porto Alegre sabe a dificuldade que temos depois que passamos de Garibaldi.

É importante a extensão da Rodovia do Parque, mas temos que fazer o dever de casa, melhorar o que temos, nossas estradas, nossa infraestrutura.

O aeroporto de Vila Oliva e o Porto de Arroio do Sal ou Torres? Sua visão a respeito

CP: Todas são importantes. Aeroporto a nível regional, em Caxias é importante, um porto também, hoje nosso maior destino é o Porto de Rio Grande para escoar nossa produção, mas também poderia ser investido em ferrovias, temos muitas estradas de ferro abandonadas. Nosso modal de transporte priorizado no passado foi o transporte rodoviário e infelizmente estamos com as estradas sobrecarregadas, mal conservadas e não é algo que se resolve de uma hora para outra.

JS: A expansão industrial de Bento, como o senhor vê?

CP: Me preocupa. Está aumentando as indústrias e a população e precisamos cada vez de mais espaço, mas nossa cidade é limitada geograficamente. Na direção de Santo Antão já estamos em Garibaldi; para o lado do Barracão tem a bacia de capitação; no Vale dos Vinhedos tem o roteiro turístico; na região de Tuiuty tem as áreas agrícolas. Temos que parar de aumentar em volume a cidade, porque ela já está do tamanho que deve ser, não comporta mais. Temos que aumentar a qualidade de vida de quem já vive aqui.

JS: Qual é a Bento dos seus sonhos?

CP: Uma cidade com menos violência do que hoje, porque temos níveis de cidades muito maiores. Que a gente consiga manter os agricultores nas propriedades. Que as comunidades mais distantes tenham as mesmas condições de quem mora mais próximo do centro. Que um maior número de moradores tenha acesso a todas as políticas públicas de educação, segurança, transporte e saúde.

JS: O senhor tem medo que a inflação volte?

CP: Nossa economia está estabilizada, pode aumentar em alguns períodos devido às questões climáticas ou como agora com o coronavírus, que pode subir ou baixar, porque os produtos que poderiam ser exportados não vão e tem outros que viriam de fora e acabam não vindo. Temos casos de incerteza, mas acho que a inflação não volta mais.

JS: Bolsonaro – Leite – Pasin

CP: Bolsonaro foi eleito como uma forma de trocar quem estava lá, era a única opção do momento para renovar e tirar o PT do poder, a população já estava cansada daquele modelo. O que a gente ouve é muita conversa e pouca ação. Não tenho nada contra, mas as coisas continuam as mesmas, até piores.

O governo do Eduardo Leite parece que não se encontrou ainda. Temos um secretário da agricultura que, sinceramente, é um desastre, não mostrou o que veio fazer, não tem nenhuma política pública nova, todas as ações do governo passado, que vinham sendo feitas, estão em atraso.

O Pasin foi reeleito com aprovação muito grande, mas não tem nada de novo, a gente não vê pela cidade algo que foi feito por essa gestão como grande feito, ele foi empurrando as coisas com a barriga. Não temos investimentos no interior, as estradas não estão boas. Os outros municípios estão fazendo asfalto, levando fibra ótica para o interior, para ter internet e luz elétrica com qualidade. Obras pela cidade, as maiores foram colocar asfaltos em cima de calçamentos. O Programa de Máquinas para o interior foi praticamente parado. Nossos distritos estão sucateados.

JS: No que se resume seu lazer, culinária, cultura física, condições de saúde

CP: Gosto de ir nas festas do interior, praticamente todos os finais de semana estou em alguma localidade. Quando não tenho esses eventos, faço passeios com a família. Não faço praticamente nada de atividade física, mas nas horas de folga trabalho na roça, às vezes no fim da tarde, quando sobra um tempo. Muitas vezes fui para casa fazer canteiro de noite, tratar as verduras, porque não sobra tempo cedo. É uma vida corrida.