Dados do Panorama do Câncer de Mama revelam que o Brasil possui menos de 24% de cobertura mamográfica, bem abaixo dos 70% recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O estudo também aponta disparidades raciais significativas: 44% das mulheres pretas e pardas recebem diagnóstico tardio, contra 36% das brancas.
A mamografia é um exame de imagem que utiliza raios X de baixa dose para detectar anomalias nas mamas. De acordo com o gestor médico do Tacchini Diagnósticos, Dr. Adriano Boz, o diagnóstico é fundamental para a detecção precoce do câncer de mama. “É considerada o método mais eficaz para o rastreamento da doença e o único com eficácia comprovada em programas de saúde pública na redução da mortalidade”, explica.
O câncer de mama é o tipo mais comum entre as mulheres no Brasil, excluindo os casos de câncer de pele não melanoma, com estimativa de 73.610 novos diagnósticos por ano, segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA). Apesar dos avanços na medicina, a doença ainda representa uma das principais causas de mortalidade feminina no país.
Boz alerta que ampliar o acesso aos exames e fortalecer políticas públicas de prevenção são passos fundamentais para mudar esse cenário e reduzir o impacto da doença na população feminina.
O que o exame diagnostica?
Segundo o gestor, a mamografia permite identificar nódulos, microcalcificações, distorções e outras alterações teciduais em estágios iniciais do câncer. Além disso, pode detectar lesões benignas, como cistos e calcificações, contribuindo também para o diagnóstico de outras doenças mamárias.
Quem deve fazer mamografias?
A mamografia com finalidade diagnóstica pode ser indicada em qualquer faixa etária, especialmente em mulheres que apresentam sinais ou sintomas relacionados às mamas. “No entanto, para mulheres jovens, a ultrassonografia é preferida como exame inicial, devido à maior densidade mamária, que pode limitar a sensibilidade da mamografia nesse grupo”, aconselha Boz.
As diretrizes recomendadas pelo médico para a realização de mamografias de rastreamento do INCA e do Ministério da Saúde são:
- Mulheres assintomáticas entre 50 e 69 anos: mamografia a cada dois anos.
- Mulheres com maior risco ou histórico familiar: iniciar o rastreamento mais cedo, conforme orientação médica.
Sociedades médicas como a FEBRASGO, a Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM) e o Colégio Brasileiro de Radiologia (CBR) recomendam que mulheres entre 40 e 49 anos também realizem mamografia de rastreamento, mesmo na ausência de sintomas.
Quem pode realizar o exame após a idade recomendada?
É fundamental conversar com um médico para avaliar os riscos e benefícios de forma individualizada, especialmente no caso de mulheres com histórico familiar de câncer de mama ou outras condições que elevem o risco da doença. Conforme orientação do Instituto Nacional de Câncer (INCA), o rastreamento sistemático é recomendado até os 69 anos. A partir dessa faixa etária, a indicação do exame deve ser avaliada caso a caso, levando em conta o estado de saúde da paciente e sua expectativa de vida. “A decisão deve ser personalizada, considerando fatores clínicos e o contexto de cada mulher”, destaca o especialista.

No que a baixa cobertura impacta?
A baixa cobertura dos exames de rastreamento, como a mamografia, impacta diretamente na eficácia do diagnóstico precoce, o que pode resultar em consequências graves tanto para as pacientes quanto para o sistema de saúde. “A baixa cobertura compromete a detecção precoce da doença, reduzindo a chance de cura. Isso resulta em maior número de diagnósticos em estágios avançados, aumento da complexidade e dos custos do tratamento e, consequentemente, maior mortalidade por câncer de mama”, afirma.
Sem o exame regular, os tumores costumam ser identificados apenas em estágios avançados, exigindo tratamentos mais agressivos e reduzindo as chances de cura. Além disso, a falta de acesso amplia as desigualdades sociais e sobrecarrega o sistema público de saúde, que precisa lidar com casos mais graves e complexos.
Fatores que contribuem para a falta de cobertura
Para o médico, existem diversos fatores que influenciam, sendo os principais:
- Socioeconômicos: menor escolaridade e renda reduzem o acesso ao exame; mulheres em áreas urbanas têm mais acesso do que as residentes em áreas rurais.
- Infraestrutura: desigualdade na distribuição de mamógrafos e profissionais habilitados, com maior concentração em regiões metropolitanas.
- Desinformação e medo: medo da dor, desconhecimento da importância do exame e receio do diagnóstico.
• Impacto da pandemia: em 2020, o serviço de mamografia do Hospital Tacchini teve uma queda de 21% no número de exames, reflexo das medidas restritivas. A partir de 2022, os números retornaram aos níveis pré-pandemia.
Desinformação
A falta de conhecimento sobre a importância da mamografia é uma das principais barreiras à adesão. Estratégias eficazes incluem:
- Campanhas permanentes, como o Outubro Rosa.
- Educação em saúde, com participação de agentes comunitários, equipes da atenção primária e uso de redes sociais para esclarecer dúvidas e incentivar o exame.
Políticas públicas
O médico aponta a necessidade de investimentos mais consistentes em políticas públicas permanentes, como:
- Rastreamento organizado, com convites ativos, lembretes e monitoramento de resultados.
- Ampliação da infraestrutura, com mais mamógrafos, profissionais capacitados e unidades móveis.
- Fortalecimento da atenção primária, integrando monitoramento da mamografia em rotinas de saúde das mulheres, com agentes de saúde atuando ativamente no controle e acompanhamento.
- Campanhas locais de conscientização e isenção de taxas de coparticipação, como ocorre nas campanhas do Outubro Rosa.
- Monitoramento contínuo dos indicadores pelo SISMAMA/SISCan.
Dados
Em nota, o Ministério da Saúde reforçou que todas as mulheres têm direito garantido ao acesso a exames de imagem, como mamografia, ultrassonografia e ressonância magnética, pelo SUS.
De acordo com a pasta, somente em 2024 já foram realizadas mais de 4,3 milhões de mamografias na rede pública. O Ministério também informou que o país conta com mais de 9 mil mamógrafos em funcionamento, considerando tanto os equipamentos da rede pública quanto os da rede privada, conforme dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES).
A Região Sul lidera os índices de cobertura mamográfica no Brasil, segundo dados oficiais. Ao longo dos últimos anos, os percentuais, embora oscilantes, se mantêm entre os mais altos do país. No biênio 2015-2016, a cobertura foi de 31,3%. Em 2017-2018, houve leve queda para 30,5%. Já nos períodos seguintes, os índices recuaram ainda mais: 22,9% em 2019-2020 e 24,3% em 2021-2022. No levantamento mais recente, referente a 2023-2024, a taxa subiu para 27,2%. Apesar da liderança regional, os números ainda estão abaixo da meta preconizada pela Organização Mundial da Saúde, que recomenda uma cobertura de, no mínimo, 70% da população-alvo.
Faixas etárias mais afetadas
Entre 2015 e 2024, quase 500 mil novos casos de câncer de mama foram registrados no SUS. A maior parte das ocorrências se concentrou em mulheres entre 30 e 49 anos, que representaram 31,4% dos diagnósticos. Em seguida, aparecem as faixas de 50 a 59 anos (26,5%), 60 a 69 anos (24,9%) e acima dos 69 anos (15%). Casos em mulheres com menos de 30 anos corresponderam a 2,2% do total.
Apesar da legislação garantir prazos máximos para atendimento, 30 dias para diagnóstico e 60 dias para início do tratamento, conforme as Leis nº 12.732/2012 e nº 13.896/2019, esses limites seguem sendo amplamente desrespeitados. Em 2023, o tempo médio de espera para o início do tratamento no SUS foi de 214 dias, ou seja, 154 dias além do que determina a lei, comprometendo o prognóstico e a chance de cura das pacientes.
Bento Gonçalves
No município, os dados mostram uma das melhores coberturas do estado, como aponta Boz:
- Em 2021, segundo a Resolução CIB-RS nº 360/2022, a cobertura bianual foi de 60%, superando a meta estadual mínima de 35%.
- Em 2023, conforme o Boletim Epidemiológico do RS, Bento alcançou 68,1% de cobertura na faixa etária recomendada, com 67,9% de exames realizados em relação à necessidade populacional. Isso se compara a 51,2% da taxa regional e 35,3% da taxa estadual para usuárias do SUS.
- Para o médico responsável pela área de diagnóstico por imagem, a infraestrutura de saúde em Bento Gonçalves tem um papel fundamental nos resultados alcançados na prevenção do câncer de mama: “Esses números destacam Bento como um município com estrutura eficiente, especialmente com a atuação do Hospital Tacchini e clínicas regionais, o que contribui para um rastreamento mamográfico mais eficaz que a média estadual e regional”, finaliza o gestor.
Segundo a secretária de Saúde Daiane Piuco, atualmente o município mantém 100% de cobertura para a faixa etária preconizada. “A meta da Secretaria Municipal de Saúde é manter a cobertura em 100%. O monitoramento é feito por meio do número de exames realizados, faixa etária atendida e dados por unidade de saúde”, destaca.
Nos últimos 12 meses, o município contabilizou 4.909 exames de mamografia na rede pública de saúde. “A média é de aproximadamente 410 mamografias por mês”, conta. Bento Gonçalves também é referência para os municípios de Pinto Bandeira, Santa Tereza e Monte Belo do Sul.
Daiane explica que os exames de mamografia no município são realizados por meio de um prestador credenciado, selecionado via edital de chamamento público. Atualmente, o município não conta com mamógrafo próprio, mas, segundo ela, a contratualização tem se mostrado financeiramente vantajosa, já que os pagamentos seguem os valores da tabela do SUS. Além disso, o serviço contratado atende plenamente à demanda local, garantindo agilidade no acesso aos exames e contribuindo para a eficiência do rastreamento mamográfico na rede pública.
Questionada sobre a possibilidade de o município adquirir mamógrafos próprios, Daiane afirma que não há essa previsão. “Não há levantamento indicando necessidade de aquisição ou atualização de mamógrafo, pois a atual estratégia via prestador credenciado tem se mostrado eficiente e econômica”, explica.
Atualmente, o município não enfrenta gargalos na realização das mamografias. A oferta de exames é considerada suficiente para atender à demanda, sem registro de fila de espera, aponta a secretária.
De acordo com ela, os dados referentes aos exames de mamografia são organizados pelo setor de Saúde da Mulher em planilhas detalhadas por unidade de saúde, com informações sobre a faixa etária e o número de exames realizados. Ela destaca ainda que não há dificuldades de acesso ao serviço e que as unidades promovem regularmente ações e campanhas de conscientização voltadas à prevenção e ao diagnóstico precoce do câncer de mama. “Por meio do trabalho dos agentes comunitários de saúde, que mantêm planilhas de controle por território e realizam busca ativa das mulheres que ainda não realizaram o exame”, explica.

Como realizar?
Para fazer uma mamografia pelo SUS em Bento Gonçalves, você deve procurar uma unidade básica de saúde para avaliação médica e encaminhamento para o exame, se necessário. “O agendamento da mamografia ocorre na mesma semana da solicitação, sem fila de espera”, conta Daiane.
Após o exame
Daiane salienta que, ao receber o resultado, o médico da unidade de saúde avalia a paciente. “Se houver alteração, é feito o encaminhamento ao Centro de Referência Materno Infantil (CRMI), onde é avaliada por mastologista. Se necessário, a paciente é encaminhada a Unidade de Alta Complexidade em Oncologia (UNACON), para investigação ou tratamento especializado”, determina.
Campanhas
Durante o Outubro Rosa, o município realiza uma série de ações em parceria com a Liga de Combate ao Câncer, o Centro Revivi e o Gabinete da Primeira-Dama, com foco na conscientização sobre a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama.
Além disso, nas unidades de saúde, as mulheres que realizam o exame citopatológico (Papanicolau) e se enquadram na faixa etária indicada já são automaticamente encaminhadas para a mamografia, o que contribui para ampliar o acesso e agilizar o rastreamento da doença.
Autoexame
Além dos exames de imagem, como a mamografia, o Instituto Nacional de Câncer (INCA) recomenda que as mulheres estejam atentas ao próprio corpo e realizem a observação e a palpação das mamas sempre que se sentirem confortáveis.
A prática do autoexame não substitui os exames clínicos e de rastreamento, mas pode ser uma ferramenta importante para a detecção de alterações. Especialistas reforçam que a valorização de descobertas casuais, como nódulos, secreções ou mudanças na textura e no formato das mamas, pode acelerar a busca por atendimento médico e contribuir para o diagnóstico precoce.