Volmar Centenaro se formou no curso de Tecnologia em Viticultura e Enologia pelo IFRS aos 56 anos, após mais de três décadas sem estudar

Nunca é tarde para realizar sonhos, e Volmar Centenaro é a prova disso. O agricultor teve uma infância difícil no interior de Bento Gonçalves, o que o impediu de concluir seus estudos, momentaneamente. “Sou natural de Flores da Cunha, meu pai veio morar com os filhos pequenos no interior, nos Caminhos de Pedra, há mais de cinco décadas”, conta

Começando a vida em um novo lugar, a família Centenaro precisou de muito trabalho para se estabelecer no Distrito de São Pedro. “Na época, a gente trabalhava no arado e como o meu pai já estava ficando com mais idade e eu era o filho mais velho, quem tinha que puxar a carroça era eu, fazia o tratamento de parreira e cuidava do arado. A gente fazia vinho, plantava feijão e até arroz. Começamos a trabalhar desde pequenos, inclusive o meu pai mandava fazer as enxadas sob medida, para que a gente pudesse carpir desde a infância”, explica.

Volmar Centenaro junto a seus pais e cinco irmãos

Apesar de terem dado início aos estudos, os irmãos não conseguiram dar continuidade, pois o trabalho na agricultura era árduo, requeria tempo e disposição física. Na época, estudar não era prioridade para quem morava no interior. “Meu irmão e eu levantávamos 6 horas da manhã, acendíamos o fogão à lenha para tomar o café e caminhávamos um quilômetro para pegar o ônibus e ir estudar na Escola Estadual Landell de Moura. Quando eu chegava em casa, tinha que comer quase de pé para logo ir ajudar o meu pai a plantar nas parreiras, pulverizar e ir na colônia carpir. Nós paramos de estudar para trabalhar, pois não tínhamos como administrar o tempo entre a escola e o trabalho”, lembra Centenaro.

Muitos brasileiros passam pela mesma situação, deixando de estudar para trabalhar. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dos brasileiros com mais de 25 anos, 33,1% não terminaram o ensino fundamental, 6,9% nunca estudaram, 8,1% têm o ensino fundamental completo e 4,5% possuem o ensino médio incompleto. Em contrapartida, apenas 26,9% da população desta faixa etária concluiu o ensino médio.

Após sair da casa dos pais durante a juventude, a falta de incentivo e a urgência em sustentar a nova família que formou, fizeram Centenaro focar ainda mais no trabalho e deixar de lado a necessidade de estudar. “Com 23 anos eu saí de casa, constituí família e tive um casal de filhos. A partir daí fui industrialista, trabalhei como criador de frangos de 1980 a 2002 e entre esse período fundei uma mecânica, trabalhando também nesse ramo até 2010”, relata.

Após conquistar a formação no ensino fundamental, Centenaro soube que tinha potencial para ir ainda mais longe em sua vida escolar. Foi quando resolveu concluir também o ensino médio. “Comecei a estudar no Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), no ensino médio, junto com técnico em comércio, me formei em 2013. Eu queria eliminar o ensino médio, mas não sonhava em faculdade, porque jamais pensei que tinha capacidade”, destaca.

Enólogo celebra término do curso em instituição federal

Concluir a educação básica já seria uma grande conquista para se orgulhar, mas com o incentivo de seus professores, Centenaro resolveu fazer o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). “Tanto no primeiro, quanto no segundo e terceiro ano os professores nos aconselhavam a fazer o ENEM. Eu decidi fazer e passei para o curso de Tecnologia em Viticultura e Enologia no IFRS”, relata.

Sobre como lidou com as novas tecnologias necessárias para a vida acadêmica, o enólogo diz que hoje tem tudo, “como por exemplo, e-mail. Sou um pouco mais lerdo que as outras pessoas, mas eu faço tudo por causa dessa tecnologia. A nossa geração tem dificuldade de entrar no ritmo para mudar”.

Após cinco anos de estudo no ensino superior, o filho de agricultor vindo do interior concluiu o curso em março, aos 56 anos. “Aprendi muito, porque durante o curso explicam até com se alimentar. Também estudei sobre toda a parte fisiológica da planta, desde o solo, fitossanidade, até saber como tomar vinho”, conta o tecnólogo sobre as lições aprendidas durante o seu curso, que forma um profissional que atua em setores de vinhos, planejando, implantando e avaliando todas as etapas da sua elaboração, desde o cultivo da uva até a fase de comercialização.

O tecnólogo aconselha todos a estudarem para que mudem seus hábitos, afirmando que essa foi uma transformação de grande importância para a sua vida. Segundo Centenaro, “para mudar é preciso estudar, se não a pessoa não evolui”. O enólogo afirma também que é necessário dar o primeiro passo para a realização de um sonho, começando com uma atitude. “O mais difícil é começar, em qualquer situação. Precisa ter uma tomada de decisão, porque o tempo vai passar. Se não tivesse tomado uma decisão, eu não teria essa história para contar”, finaliza.