Presidente do Sindicato Empresarial da Gastronomia e Hotelaria da Região Uva e Vinho (SEGH), Vicente Homero Perini Filho, acredita piamente na força do turismo da Serra e num recomeço a partir de 2021

Foto: Leandra Romani

Natural de Caxias do Sul, mas apaixonado por toda a Serra Gaúcha, que desde cedo descobriu na gastronomia a sua vocação. Autodidata na cozinha, Vicente Homero Perini Filho dirige o Q Restaurante e também, atualmente, o Sindicato Empresarial da Gastronomia e Hotelaria da Região Uva e Vinho (SEGH). Perini faz parte de uma família onde a gastronomia e os eventos correm nas veias. O pai, Vicente Homero Perini, apesar de atuar na área metalmecânica, sempre foi um exímio assador. E foi aí que o filho iniciou sua “carreira”, em ambas as áreas. Ao concluir o ensino médio, Vicente Filho cursou Ajustador Mecânico no Senai. Até atuou na função, mas foi entre as panelas que se encontrou profissionalmente. A mãe Julieta, os três irmãos, o filho Arthur, atualmente com 20 anos e a esposa Simone De Antoni Perini, todos incentivados por “seu Vicente” mergulharam neste mundo e nele vivem, inclusive nos momentos de lazer.

Quais os principais objetivos e conquistas como presidente do SEGH?

Nosso objetivo principal é fazer com que as pessoas acreditem na força que a entidade tem para ajudar e orientar os estabelecimentos dos setores os quais representamos. Queremos mostrar o porquê da existência do Sindicato. Nas dificuldades que estamos passando atualmente, queremos comprovar nossa força em nível regional e estadual. Estamos buscando alternativas para minimizar os estragos que estão sendo e serão causados por esta crise, pela qual ninguém imaginava passar. E o que precisamos é unir ainda mais nossa categoria, pois quanto mais unidos estivermos, maior será nossa força. Com relação à conquista, posso dizer que, pessoalmente, vindo do setor, conquistar a presidência da entidade é algo extremamente gratificante. Mas o que quero, para o coletivo, é conquistar a união e a força do turismo dentro da hotelaria e da gastronomia.

Como avalia o turismo na Região? E em Bento, especificamente?

O turismo na Região vem crescendo exponencialmente, principalmente em Bento Gonçalves. Toda a Região, pelo seu potencial vitivinícola, tem um público específico, que agrega valor ao produto. Não tem como voltar atrás. O turismo se firmou de uma forma a se tornar a principal fonte de renda para inúmeras famílias, em todas as cidades do entorno. A Serra Gaúcha está unida, mas tem que se divulgar mais. A grande Serra tem que fazer com que os turistas permaneçam mais tempo por aqui. Eu, particularmente, só vejo crescimento.

Quais são as maiores necessidades do setor?

Divulgação, conforme já mencionado, e uma melhor infraestrutura viária. Não temos como ter um aeroporto em cada uma das maiores cidades turísticas, então, dependemos muito das estradas. A estrutura hoteleira está bem, mas ainda precisa ser melhorada. Na área gastronômica também estamos bem. Mas precisamos aparecer mais. É muito importante a regionalização do turismo e olhar sempre voltado ao futuro.

Antes de vivermos esta crise, causada pela pandemia de coronavírus, qual era a situação do turismo local? E agora?

Viemos de um carnaval com grande perspectiva devido ao grande número de feriados prolongados que teríamos neste ano. Mas já perdemos dois – Páscoa e Tiradentes -, os quais iriam injetar milhões no turismo nacional. O fim de 2019 e o início de 2020 já tinham sido muito bons para a região como um todo. Agora temos que batalhar pelo turismo local e regional.

Como o setor irá se recuperar?

Muito lentamente, e não só no turismo. As pessoas ainda têm muito medo. O vírus não acabou e não se sabe quando vai acabar. Criamos um Comitê para desenvolver alternativas e estratégias de retomada. Mas tudo deve ser feito de forma muito responsável. A tendência é de que o movimento nacional deverá reiniciar a partir de julho. Já as viagens internacionais, creio que somente a partir de setembro. Temos uma expectativa, mas tudo é uma incógnita. Vivemos um caos muito grande e inesperado. A ocupação hoteleira na Páscoa, por exemplo, chegava a 95%. Este ano não atingiu 10%. O medo do desconhecido faz com que muitas pessoas não saiam de suas casas, mas o que precisa realmente é o respeito aos limites, a responsabilidade. Isso não pode recair somente sobre os estabelecimentos, sejam eles da natureza que forem.

Qual o prejuízo estimado com o fechamento temporário dos restaurantes durante a pandemia?

Prejuízo em valores ainda não temos como mensurar. Mas a queda no faturamento, de forma geral, falando em turismo, gira em torno de 85%. As casas noturnas, por exemplo, estão tendo uma queda de 100%. A hotelaria, de 95 a 100%. A gastronomia sofreu um pouco menos, devido a sistema de tele entrega e take away. Alguns restaurantes que trabalhavam apenas por sistema de delivery também sofreram perdas com o ingresso de outros estabelecimentos no sistema. Estima-se para estes, cerca de 50%. Em valores, isto é incalculável. O que vemos é que as pequenas empresas têm condições de se manter por 25 a 30 dias. Se não fosse autorizada a reabertura, muitas delas não conseguiriam cumprir com as obrigações de aluguel, impostos, entre outras. Mas mesmo assim, posso afirmar que o fluxo ainda está baixíssimo, entre 5 e 10% do que seria normalmente.

Como o senhor vê o Brasil daqui 90 dias?

Ainda tentando sair da crise, buscando alternativas. Com muitos fechamentos e desemprego. É daqui 90 dias que vamos conseguir ver o que realmente aconteceu, o estrago que foi feito, porque é quando encerram os benefícios que estão sendo oferecidos, caso não sejam prorrogados. Estimamos, na nossa área, o fechamento de 20% dos estabelecimentos, com 30% de demissões entre a gastronomia e a hotelaria.

Quanto tempo será necessário, em média, para recuperar o montante perdido?

Ainda em 2020 poderá haver um equilíbrio. Mas começar mesmo, somente em 2021. Claro que cada caso é um caso. Cada um sabe das suas condições. São muitas as incertezas. Talvez alguns nem vão se recuperar. Na realidade, ainda estávamos saindo de uma crise. A margem de lucro já estava enxuta. Os valores praticados, em muitos estabelecimentos, estavam abaixo do mercado. Hoje o foco está voltado a negociações, aumento de prazos, parcelamentos, tudo para não precisar fechar. Vamos precisar de muita garra e vontade de superar esta crise.

No segmento hotelaria sabemos que muitos hotéis encerraram temporariamente suas atividades, ao passo em que outros fecharam definitivamente. O que tem a dizer a respeito?

Com relação aos fechamentos definitivos, creio que ocorram e tenham ocorrido por uma série de fatores, como localização e taxa de ocupação, por exemplo. Já os temporários estão ocorrendo com o objetivo de reduzir despesas, diminuir os prejuízos. Ainda em quem ache que vá voltar tudo ao normal, mas não vejo isso a curto prazo. E não vai mais ser como era antes. Os hotéis dependem muito dos turistas, aqueles que vêm para ficar dias, ao contrário dos restaurantes e pontos turísticos em que as pessoas podem chegar de manhã, fazer o roteiro e ir embora à noite, sem precisar se hospedar. E a probabilidade é de que outros hotéis encerrem suas atividades.

Somos sabedores de que o turismo encontra dificuldades em fechar seus quadros de funcionários, principalmente devido à carga horária, que abrange domingos e feriados. Com as demissões que vêm ocorrendo, como deverá ser a retomada?

Alguns estabelecimentos estão atuando com carga horária reduzida. Os setores que estão empregando mais hoje são saúde e gêneros alimentícios, cujas cargas horárias são semelhantes à nossa. Depois que isso tudo passar, vai sobrar mão de obra. Até o fim deste ano, se retornar o movimento, também irão voltar as vagas de emprego. Quem gosta do que faz não se importa com o horário.

Quais são as ações que o SEGH está desenvolvendo para lidar com esta situação de pandemia e auxiliar seus associados?

Estamos atendendo 24 horas, em sistema de plantão, para auxiliar os 19 municípios associados. Contamos também com a assessoria da Federação Nacional, que nos dá todo o suporte quando tratamos de salários, redução de jornada, suportes governamentais. Acompanhamos todos os decretos e flexibilizações. Estamos nos direcionando também a orientações para negociação. Quando a crise chegou ao Brasil, de imediato, realizamos a negociação coletiva com o Sintratur, prevendo férias, paramentos de férias, banco de horas, entre outros, auxiliando o empresário e beneficiando o trabalhador. Estamos acompanhando o que está ocorrendo em toda a base de abrangência do SEGH. Bento Gonçalves tem um decreto com a maior flexibilização na região e temos sido bastante ouvidos. Também criamos o Comitê Pró-Turismo Bento, com todas as entidades que fazem parte do Trade Turístico, visando pensar “com os pés no chão”, juntamente com todos os empresários, pensando numa retomada sem ter que voltar atrás.

Foto: Júlio Soares

Faça uma avaliação de Bento Gonçalves no que diz respeito ao Turismo de Negócios.

Certamente ele é muito importante para o Município. É um setor fortíssimo, do qual as vinícolas também acabam se beneficiando. Mas é outro setor que vai ter que se reinventar. Todo o tipo de turismo é essencial para a hotelaria e para a gastronomia.

O que poderia ser feito para estimular o Turismo Religioso em Bento Gonçalves e pequenas cidades do entorno?

Precisamos apoiar o turismo como um todo, a diversidade dele. A cultura local, de origem italiana, o vinho. O turismo religioso está neste pacote, com seus capitéis espalhados pelo interior, seus belíssimos santuários. Existem muitas possibilidades, eventos fortes voltados a este tema. Precisamos divulgar.

Como a comunidade bento-gonçalvense lida com o turismo e com o turista?

Eu, particularmente, sempre fui muito bem tratado e muito bem recebido. Como não sou daqui, são poucas as pessoas que me conhecem. E costumo me apresentar sempre na saída, quando tenho algo a dizer, principalmente em forma de elogio ou estímulo. A oferta aqui é muito grande e diversificada. O bento-gonçalvense está sempre disposto a dar informações e o acolhimento é muito bom. Mas sempre podemos melhorar. Não são pessoas frias e isso é raro de se encontrar. Vejo que o turismo passou a ser motivo de orgulho para a comunidade, e isso incentiva todo mundo a dar seu melhor para o desenvolvimento contínuo do setor.

O que o senhor faria para desenvolver o eixo Caxias-Gramado-Canela-Flores da Cunha-Farroupilha-Bento-Barbosa-Garibaldi? O que nos falta urgentemente?

O desenvolvimento é crescente nos 19 municípios. Em todos a intenção de crescer é muito grande. A abertura de fronteiras é fundamental. Quando se rala em Região, não existem limites entre municípios. O SEGH é parceiro do G-30 e, para logo após a pandemia, já estamos preparando uma campanha de promoção da Serra Gaúcha. Caxias, no centro da Região, é um ponto de distribuição do turismo e do turista. A Rota do Vinho com o encantamento da Região das Hortênsias são complementares.

Com a expansão da vitivinicultura em Santa Catarina, em Vacaria, na Fronteira Oeste, este setor, na Região Nordeste, a nossa região, está perdendo força e significação econômica?

Não vejo desta forma. São territórios com produtos distintos. A Serra Gaúcha sempre será a precursora no cultivo próspero da uva e elaboração de vinhos.  E também pioneira como o destino enoturístico. A concorrência sempre existirá. Acredito que esta atitude vanguardista fez e fará este território estar sempre à frente.

Tecnicamente, o que está faltando para desenvolver e qualificar a nossa vitivinicultura? 

Não sou da área, mas pelo que acompanho como consumidor os últimos anos tem sido de ganhos para o setor e com avanços tecnológicos, fato provado pelo reconhecimento internacional dos nossos vinhos e espumantes.

A importância do cooperativismo para o setor vitivinícola, perdeu força?

Creio que a essência do cooperativismo está na Região, se observar o turismo tem esta prática.  Juntos, em qualquer setor, nos tornamos mais competitivos.

O senhor incentivaria alguém a plantar uva e produzir vinhos? Por quê?

Por não ser um expert do setor, mas apreciador vinhos, acredito que há espaço sim para produzir uva e elaborar vinhos. Se observarmos, a oferta de produtos enoturísticos tem sido um grande atrativo para visita às regiões produtoras. O turista vem para conhecer nosso estilo de vida e vivenciar tudo sobre o mundo do vinho, que não se resume à garrafa, fato sempre bem lembrado pelo Sr. Rinaldo Dal Pizzol .

O futuro do nosso vinho.

Tivemos neste ano uma safra excelente, que agregará valor ao produto. O vinho está cada vez mais forte e presente na mesa dos brasileiros. E não tem como diminuir esta presença. Pelo menos não vejo isto. O enoturismo, a enogastronomia, a história, o mundo do vinho, fazem parte do desenvolvimento de toda região. O produto em si, que vem dentro da garrafa, é 10% de todo o contexto. A experiência que tem por trás é o que verdadeiramente conta. Temos muita história para contar. Não é só vender vinho. É um estilo de vida.

O que poderia ser feito para estimular os jovens a investirem seu tempo e suas carreiras voltadas à área do turismo?

Para fazer qualquer coisa tem que ter amor. A pessoa tem que gostar. Tem que saber que vai trabalhar sábado, domingo, feriado, noite, madrugada. Tem que conhecer a realidade antes de optar por qualquer profissão que seja.

Rota Uva e Vinho versus Rota das Hortênsias. Fale sobre os diferenciais, o que é bom e o que é ruim em cada uma delas.

A Rota do Vinho é fantástica. Tem toda uma história que a envolve, um contexto, uma cultura, uma religião, uma grandiosidade ímpar. Foi muito bem aproveitada. As paisagens naturais são belíssimas, assim como o contraste do antigo com o novo. O único ponto negativo é a dificuldade de logística, o deslocamento de um ponto a outro, porque ela é muito “espalhada” e alguns roteiros acabam sendo prejudicados.

Já a Rota das Hortênsias foi construída com a estratégia de se transformar num produto de desejo para os que querem consumir e comprar. Os idealizadores conseguiram levar magia, criar uma beleza, uma harmonia desde a entrada, os hotéis, as residências. Foi muito bem projetada e conseguiram manter. Como pontos negativos vejo o trânsito, a água, a estrutura de táxis e o estacionamento. Alguns hotéis até oferecem o serviço, mas apenas nas épocas de alta temporada. A capacidade de carga não foi dimensionada.

O que falta para atingirmos um nível de excelência em desenvolvimento no setor de turismo?

Estamos quase lá, mas isso depende muito das pessoas. Quem tem que determinar o nível de excelência é o turista. Todos os estabelecimentos estão tentando atingir esse nível, mas a perfeição não existe. O caminho está traçado, porém, podemos perder a excelência no detalhe. Para quem conseguiu construir e desenvolver todo um caminho relacionado ao turismo em cerca de 20 anos, como é o caso de Bento Gonçalves, já atingiu a excelência. Mas o desafio é contínuo. É necessário investir em qualidade, criatividade e inovação. Este é o caminho.

Qual sua visão sobre a volta do transporte ferroviário na Região?

Seria perfeito! Para o turismo, considero um avanço enorme! Hoje, percorrer a Europa de trem é sensacional. Nossa região tem uma das maiores concentrações populacionais do Estado. O transporte ferroviário traria benefícios à indústria, ao comércio e ao turismo, estimulando a economia como um todo.

O Aeroporto de Vila Oliva para a Região. Qual sua visão a respeito?

Este é outro fator que trará um crescimento enorme. O aeroporto irá atender toda a Serra, trazer desenvolvimento para toda a região. Mas precisaremos de melhoria nas estradas. O conjunto é de extrema importância para o turismo de lazer e de negócios.

Qual é o seu Brasil sonhado. Acredita nele?

Acredito no Brasil, acredito nos brasileiros. Sonho com um país mais livre de burocracias, sem corrupção e sem politicagem. Mais igualitário.

Dê dicas para quem pretende empreender na área do turismo. Ainda há alguma carência que pode ser aproveitada para quem quer começar?

Estude bem o que quer fazer. Planeje o negócio, seja inovador. Compreenda o mercado, a localização, a gestão do negócio. O SEGH está à disposição para prestar todo o auxílio. As carências, especificamente para a Rota da Uva e do Vinho, são voltadas aos públicos infantil e jovem.

No que se resume seu lazer? Culinária, atividades físicas, etc.

Adoro conhecer outros restaurantes. Por incrível que pareça, nas minhas folgas, que são aos domingos, saio para passear a fim de conhecer restaurantes. Amo servir, mas também amo ser servido. E viajar, sempre que posso!

Com a esposa Simone De Antoni Perini e o filho Arthur. Foto: Leandra Romani