Elpídio Antônio, neto do quarto prefeito de Bento Gonçalves, começou cedo sua relação pelo meio de transporte e também ciclismo

Em julho de 1955 tinha início, a que talvez seja, a mais espetacular onda de frio já registrada oficialmente no Brasil. Na climatologia, desde 1950, a MetSul encontrou a temperatura média de 10,7° naquele ano. Foi nessa mesma época que Elpídio Antônio Franklin Barboza, mais conhecido como Tonico, 82 anos, venceu a competição de ciclismo Volta de Porto Alegre, no auge dos seus 18 anos, uma atividade parecida com a Volta a Espanha (La Vuelta) e o Tour de France.

Sua paixão por bicicletas e por esportes começou de forma precoce. E o estímulo por questões culturais também. Seu avô, o coronel Arlindo Franklin Barboza, se mudou para Bento Gonçalves, a pedido do então governador do Rio Grande do Sul, Borges de Medeiros, para chefiar o Palácio Municipal, cargo que ocupou de 1932 a 1935, sendo o quarto intendente (como se chamava o prefeito na época) da cidade.

O Coronel trouxe o filho Elpídio Franklin Barboza, que assumiu como tabelião da cidade, e a esposa, uma espanhola que veio de navio a Porto Alegre, onde conheceu quem se tornaria seu marido. Na época em que a mãe de Elpídio Antônio estava grávida, o estado registrava um surto de tifoide. Dez meses após o nascimento do filho, ela falece aos 23 anos.

O filho Barboza volta a capital para morar com os avós e lá começa o apreço por bicicletas. Perto de sua casa, na avenida Getúlio Vargas, havia um senhor que tinha uma Júpiter modelo alemã de 1937, a qual tratou logo de negociar. A partir daí, seu amor só cresceu e ele se envolve com competição de bicicletas, como a da década de 1955. Também teve contato com Remo, Tiro ao Prato, Caçada e Iatismo.

A publicação do jornal da época “Circuito Ciclístico de Belém Novo” estampa o foto de Elpídio ao vencer a Volta de Porto Alegre, em 1955

Casou-se com Marli, aos 27 anos, e voltou a residir na Capital do Vinho, onde assume o tabelionato do pai. Neste período, parou com as atividades esportivas, mas o entusiasmo em acompanhar as competições sempre se manteve forte. Resolveu, então, olhar as bicicletas de outro jeito: restaurá-las. Consertou uma Adler de 1937 e conseguiu uma Júpiter, do mesmo modelo de sua primeira, além de carros, inclusive de pessoas importantes da cidade, a convite de amigos. “Era criança quando se envolveu com elas, em uma época em que Porto Alegre tinha um certo glamour com relação às competições de bicicletas. E comparativamente depois de uma pandemia”, pontua a filha mais velha Luciana Barboza, 53 anos.

Em meio a esta atual doença, o coronavírus, Elpídio Antônio aproveitou o tempo da quarentena para retomar antigos hábitos e trazer à tona o sentimento de nostalgia. Construiu uma bicicleta baseada no modelo inglês penny farthing, estilo que nasceu por volta de 1870, em que a roda dianteira chegava a três metros de diâmetro. “Como não pode sair, não teve como comprar o pneu massivo utilizado no transporte, então utilizou um menor, mas uma réplica de uma penny, a qual apelidou de Corona, devido ao momento atual”, conta a filha.

Em áudio enviado ao Jornal Semanário, é notório a alegria em restaurar e construir novamente. “É um serviço mais leve do que fazer mecânica e restaurar carros antigos, que é correria, dependo de terceiros, e nas bicicletas depende de ti apenas. Vejo na internet as peças que preciso e mando buscar, não saio de casa. Uma bicicleta não pesa, dá para carregar para lá e para cá. Os problemas são bem menores do que com um carro, e outra: eu gosto (risos), sempre gostei”, comenta.

Coleção

Elpídio Antônio Franklin Barboza conta com uma coleção de cerca de 25 modelos dispostos na sala de casa. Faz parte as bikes antigas, em especial as modelos speed, sendo uma Júpiter, Rudge e a Adler de 1937, e ainda dois triciclos. A mais rara é uma Legnano, cujo modelo foi usado por Gino Bartalli para vencer o Tour de France e também usada para salvar judeus do holocausto, no qual era transportado nos canos documentos falsos impressos na Itália, trocando os nomes das pessoas para nomes de cristãos.

Atualmente, ele se detém na construção de suportes para os modelos. Em seu currículo profissional ele carrega ainda o de técnico em mecânica de aviões da Varig e de tabelião.

Devido ao período de isolamento, infelizmente a reportagem do Jornal Semanário não teve contato pessoalmente com seu Elpídio. Sua história foi relatada pela filha Luciana, psicóloga, a primogênita de outros dois filhos, Liane e Leonardo, engenheira e mecânico autônomo. Barboza tem ainda dois netos, Thiago e Lorenzo, e permanece morando em Bento Gonçalves.

Fotos: Arquivo pessoal