Ter uma família parece algo simples e fundamental, mas no Rio Grande do Sul não é a realidade de 620 crianças e adolescentes que sonham em fazer parte de um lar. A Coordenadoria Estadual da Infância e da Juventude, contabilizou em agosto do ano passado, 6,2 mil pretendentes habilitados no Estado. Especificamente em Bento Gonçalves, esse número também é contrastante. De acordo com a Assistente Social Judiciaria, Cristina Rosa, de um lado, há dois adolescentes prontos para receber uma família. Do outro, 97 candidatos habilitados. Mas por que essa conta não fecha?
Em Bento, existe uma casa de acolhimento municipal, que atualmente está abrigando doze pessoas. Dessas, dez devem voltar para as suas famílias, assim que elas estiverem reestruturadas. Já os dois adolescentes, com idades de 14 e 15 anos, não tem previsão para receber um lar. “Não existe candidatos que aceitem adotar pessoas com essa idade”, afirma Cristina.
O Promotor da Infância e da Juventude, Elcio Resmini Meneses, relata que são muitas as dificuldades em relação à adoção tardia. “Os candidatos não querem crianças e adolescentes, querem recém-nascidos ou com até dois anos de idade. Conforme os anos vão passando, as chances de encontrar pessoas interessadas diminuem significativamente, não se encontra ninguém”, conta.
Ainda de acordo com Meneses, a cada três meses são realizados verificações na lista local dos interessados em adoção, para checar se entrou alguém com interesse no perfil de adolescentes, mas sem sucesso. “Muitas vezes a alternativa é a adoção internacional, mesmo o processo sendo muito mais difícil, acaba sendo a única saída para os adolescentes. Não existe hipótese de adoção local e nacional para alguns perfis”, declara.
Quando um adolescente é adotado, existe o chamado estágio de convivência, geralmente com prazo estipulado de seis meses a um ano. “A adoção é irrevogável, uma vez dada, não tem como voltar atrás, mas a adoção não é dada de forma imediata, nesses casos. Adoção é algo muito cuidadoso, se não da certo, podemos causar um problema muito maior, a consequência tem que ser muito bem pensada.”, explica Meneses.
Em Farroupilha, desde 2012 existe o Grupo de Apoio a Adoção DNA da Alma, criado com o objetivo de sensibilizar as pessoas e estimular reflexões sobre o tema, usando estratégias para buscar e preparar famílias com interesse na adoção e ajudando nas adoções que consideram necessárias e que não tem pretendentes no Cadastro Nacional de Adoção (CNA).
Com o trabalho voluntário do Grupo, a realidade de Farroupilha foi modificada. O tempo de permanência de crianças e adolescentes na Instituição de Acolhimento Casa Lar Padre Oscar Bertoldo passou de sete anos, para 11 meses.
Segundo a psicóloga e fundadora do Grupo, Rejane Conin, o conceito de adoção tardia é usado para crianças acima dos dois anos de idade e é o maior desafio encontrado por quem trabalha com a temática. “Boa parte dos pretendentes aceitam crianças com até cinco anos. A maior dificuldade e resistência estão em aceitar crianças acima dos oitos anos. No CNA, não existem habilitados para adotar crianças acima de doze anos. A maior dificuldade não está nas crianças e sim nos adultos, com pré-requisitos muito elevados”, conta Rejane.
Rejane acredita que o medo fica evidenciado quando se pensa na adoção tardia. “As crianças com mais de sete anos são descartadas por causa da ideia de que nessa idade elas já têm a personalidade formada e pelo medo da família não conseguir mostrar o jeito correto de ver a vida, mas isso é um grande engano. As crianças estão prontas para amar, elas precisam de alguém que as acolha e ofereça amor”, finaliza.
O Grupo DNA da Alma faz reuniões no primeiro sábado de cada mês, no Instituto Federal em Farroupilha, iniciando às 14 horas. A reunião é aberta a todos os interessados sobre o tema.