Andar pelas ruas do centro de Bento Gonçalves possibilita perceber os vendedores ambulantes, instalados em lugares movimentados, oferecendo meias, toalhas e produtos variados. Na maioria são imigrantes haitianos, senegaleses e ganeses. Também há migrantes brasileiros, que viajam de outros estados, ou indígenas com filtros de sonhos e manufaturados chineses. Grande parte desses trabalhadores preenchem as estatísticas do trabalho informal. As entidades ligadas ao comércio bento-gonçalvense alegam que eles praticam concorrência desleal, uma vez que não pagam impostos e os preços praticados são menores.

Para discutir a questão, a Câmara de Vereadores de Bento Gonçalves abriu a Frente Parlamentar de Combate à Informalidade na noite de quarta-feira, 26. O objetivo é buscar soluções para coibir o trabalho informal e trazer mais arrecadação aos cofres públicos municipais.

Segundo o presidente da Frente, vereador Rafael Pasqualotto (PP), é necessário fortalecer a fiscalização e tornar as leis mais rígidas. “Não podemos deixar que Bento Gonçalves fique na mesma situação em que está Caxias do Sul e Porto Alegre, nós somos uma cidade turística”, argumenta.

Além disso, Pasqualotto reafirma a necessidade de trazer os trabalhadores à formalidade como forma de aumentar a arrecadação municipal, visto que a demanda pelos serviços públicos, como saúde e educação, é crescente. “Se não retirá-los dessa situação, eles vão ser prejudicados da mesma forma”, complementa. A previsão do presidente é de que seja realizada uma audiência pública para ouvir o lado dos trabalhadores informais, mas ainda não há data marcada.

O presidente dos camelôs, Jeferson Pereira, estava distante dos microfones da tribuna e acompanhava o debate em meio à plateia da Câmara de Vereadores. Ele afirma que os camelôs não estão certos em vender determinados produtos, mas ao mesmo tempo, parte da população não tem poder aquisitivo para consumir os mais caros. “Nós temos que dialogar para ver o que é melhor para a cidade e para o povo”, ressalta.

Uma estimativa realizada pela Fecomércio-RS e Sindilojas avalia que, em 2016, o comércio informal movimentou cerca de R$ 848,7 milhões no município. O cálculo ainda demonstra que a arrecação municipal poderia aumentar em R$ 21 milhões caso o montante tivesse sido comercializado de maneira formal.

Para o diretor do Sindilojas-BG e vice-presidente da Comissão de Combate à Informalidade da Fecomércio-RS, Daniel Amadio, os produtos informais, como os óculos falsificados, acabam criando problemas de saúde que o sistema público terá que atender no futuro. “Queremos identificar problemas, trazer soluções e criar diálogo entre as forças vivas”, salienta.

Teve que regularizar

O artesão Jorge Moura, de 52 anos, está regularizado há oito anos. De acordo com ele, o que motivou a abertura de uma empresa e a adoção do documento de Microempreendedor individual (MEI) foi a repressão sofrida pelos órgãos de segurança. “A polícia chegou parecendo que ia para a guerra, prenderam nossos materiais e fomos presos”, relembra. 

Apesar de ter se regularizado, Moura frisa que os comerciantes de rua sempre enfrentam problemas. No momento, ele relata que está em uma situação tranquila se comparado a quando começou a vender artesanatos, há 32 anos. “Eles (o Poder Público) querem fazer um projeto para a gente ficar aqui, isso ajuda”, avalia. 

Meio de sustento

O indígena Vagner Claudino, de 19 anos, estava comercializando produtos artesanais e manufaturados em frente à Igreja Santo Antônio na manhã de quinta-feira, 27. Ele conta que sua família trabalha com medo de a fiscalização aparecer e apreender a mercadoria. “Estamos fazendo pelos nossos filhos e nossos irmãos, eles não podem fazer isso”, reinvidica. 

Segundo Claudino, após alguns casos de coerção da fiscalização municipal, o grupo indígena buscou a Prefeitura para chegar a um consenso sobre o impasse, mas o encontro não se concretizou.  “Essa é nossa forma de sobrevivência”, aponta. Claudino revela que os manufaturados são comprados em Porto Alegre e revendidos em Bento Gonçalves.