Neuropsicopedagoga e psicóloga mencionam sinais que as crianças dão quando estão enfrentando problemas de adaptação. Além disso, elas ressaltam a importância da conscientização sobre o bullying

Janeiro chegou ao fim, e junto com ele o período de férias escolares também está indo embora. Com a compra de materiais e uniformes, os pais e alunos se preparam para um novo ano letivo. Para os estudantes, algumas dificuldades podem ser encontradas nesta época de retorno.

A neuropsicopedagoga da Evolui Clínica Infantil, Marcia Rossatto Marini, explica que sentimentos como a insegurança e ansiedade são normais. “É um desafio para as crianças, afinal, é uma nova etapa, novos professores, colegas já conhecidos e outros diferentes, uma rotina precisa ser desenvolvida e isto tudo também gera preocupação por parte dos pais”, salienta.

Conforme Marcia, sua sugestão como psicopedagoga e mãe é, inicialmente, dar abertura aos pequenos para falar sobre o assunto. “Converse sobre este novo momento e o quanto será bom e importante para ele, pergunte sobre seus medos também, conte sobre quando você era pequeno e que talvez também tenha passado pela mesma situação. Escute e acolha suas inseguranças e lembre-o que estará sempre lá para ajudá-lo. Atitudes como esta fortalecem os vínculos”, destaca.

Para a profissional, é preciso, desde cedo, que os pais ensinem os filhos a enfrentar a realidade e sempre mostrar que o ambiente escolar é o lugar onde aprenderá, fará novos amigos, brincará e será feliz. “Em contrapartida, a escola também precisa estar preparada, criando espaços onde as crianças se sintam acolhidas, como rodas de conversa, cantar e dançar. Os professores precisam estar prontos para lidar com as emoções, pois muitas vezes o choro se chama saudade”, evidencia.

Além disso, o quanto antes, em casa, é interessante retornar à rotina, principalmente de dormir e acordar mais cedo. “Crie momentos em família onde todos estarão voltados ao interesse da criança em relação à escola, como a compra e a organização de materiais, etiquetar e montar um espaço destinado aos estudos. Tudo isso, por mais simples que pareça, traz segurança”, afirma

De acordo com a psicóloga da Evolui, Thalia Rucks, há alguns sinais que podem esclarecer que o aluno está ansioso por conta do retorno às salas de aula. “Algumas crianças conseguirão comunicar seus sentimentos através da fala, outras poderão demonstrar por meio de outros comportamentos. A ansiedade é adaptativa, isto significa que é importante para a sobrevivência do ser humano. Contudo, quando desproporcional à realidade, pode causar extremo sofrimento. A diferença entre a saudável e a desadaptativa é a intensidade e a frequência”, alerta.

Segundo Thalia, o recesso escolar, na maioria das vezes, impacta a rotina das crianças. “É esperado e necessário que esse período seja utilizado para descansar e recarregar as baterias, o que amplia consideravelmente os momentos de lazer. Além disso, é comum, por exemplo, que ocorra uma flexibilização no horário de acordar e de dormir, na alimentação, na prática de exercícios, no tempo e acesso às telas. Todos esses fatores acabam influenciando e podem tornar mais custoso o retorno. Diante disso, é importante manter alguns hábitos, mesmo nas férias. Dessa forma, o impacto não será abrupto e desgastante para a criança e seus familiares”, aconselha.

Com o objetivo de reduzir esses problemas e fazer os pequenos se acostumarem com a ideia do retorno, a comunicação é central no processo de retorno à escola, como revela a psicóloga. “Contudo, informar pode não ser o suficiente. Os adultos têm facilidade em dimensionar o tempo, mas isso não ocorre com tamanha facilidade com crianças. Diante disso, é importante tornar concreto o retorno à rotina. Uma estratégia que pode auxiliar é confeccionar um calendário e deixar visível – seja com um adesivo, uma foto ou um desenho da escola, o dia em que ela retornará. A partir da marcação diária, a criança poderá visualizar a data de volta, o que dará previsibilidade a ela”, reitera.

Durante as aulas, os novos deveres com relação aos estudos também podem levar os estudantes a desenvolverem a ansiedade, mas, conforme realça Thalia, isso varia muito de acordo com cada situação. “A forma como a família, professores, monitores e amigos abordam essas responsabilidades é relevante, ou seja, o ambiente em que a criança está inserida aumenta ou diminui a probabilidade dela se sentir mais ansiosa ou não. A comunicação entre o adulto e a criança é uma das principais ferramentas e é um meio de esclarecer quais são suas tarefas e o porquê elas são importantes”, sustenta.

Levar os pequenos a expressarem seus sentimentos também é um fator relevante durante o processo de aprendizado. “É significativo que, no âmbito familiar e escolar, sejam ofertados espaços de escuta à criança, para que ela possa descrever como está se sentindo diante das novas atribuições escolares. A partir do diálogo, os familiares e professores poderão compreender se ela está em sofrimento”, ressalta.

A profissional aponta que um atendimento psicológico é necessário quando os comportamentos causam prejuízo à criança ou à família. “Quando se trata do público infantojuvenil, o leque de procura por atendimento é grande. Alguns exemplos são: agressividade, explosões emocionais, ansiedade, separação dos pais e dificuldade de aceitação por parte da criança, violência psicológica, sexual, bullying, timidez excessiva, medos extremos, enurese (xixi na cama) e encoprese (problema intestinal)”, menciona Thalia.

Impactos do bullying

A neuropsicopedagoga garante que um ponto muito importante a ser mencionado, e extremamente delicado, é a questão do bullyng na escola. “Por vezes, a correria é tanta, que demoramos em perceber o que está acontecendo e os estudantes nem sempre nos falam. Assim, a criança começa a se sentir desconfortável e a se isolar, sentir tristeza, medo de ir à escola, preferindo ficar sozinha ou alegando não estar se sentindo bem, começa a ter perdas escolares”, orienta.

Segundo Marcia, a escola também precisa estar atenta. “O professor é o primeiro profissional a perceber que algo não anda bem, por isso reforço o quanto é importante o vínculo afetivo com o docente, desta forma, a criança poderá se sentir mais confortável em conversar sobre este assunto”, frisa.

O diálogo entre escola e familiares também é de grande relevância, como sublinha a psicopedagoga. “Pais, professores e estudantes precisam estar juntos, manter diálogos mais constantes, construir um bom relacionamento entre as famílias, ensinar que o respeito às diferenças é o que nos faz crescer. Lembrar-se de manter sempre um canal de comunicação em casa, com os filhos, é uma oportunidade de sabermos o que está acontecendo na vida deles, pois é na escola que as crianças acabam se tornando independentes, portanto, precisamos ficar ligados”, reforça.

A psicóloga Thalia acrescenta que a literatura evidencia que crianças que sofrem bullying podem experienciar um sofrimento intenso. “Uma das primeiras atitudes observadas é o isolamento e reclusão social. Aversão à escola, queda no rendimento escolar, baixa autoestima e ansiedade são alguns dos sintomas que podem surgir. Por isso, é imprescindível que a escola e a família se atentem a qualquer alteração no comportamento. O âmbito escolar é muito importante nesses casos, principalmente para conscientizar e intervir com seriedade e comprometimento”, enfatiza.

Para a profissional da psicologia, a maneira como cada sujeito interpreta essa situação varia muito, impactando de maneira divergente cada criança. “Dessa forma, a intervenção mais adequada é precaver a prática, conscientizando sobre o bullying e suas consequências. Estabelecer uma comunicação aberta com a criança é fundamental para que a família note quando alguma coisa não vai bem. Tão logo perceba-se que algo foge à normalidade, a escola deve ser comunicada. Quanto mais cedo o problema for identificado, mais rápida será a atuação de toda a rede, que pode oferecer suporte. O atendimento psicológico, por vezes, é necessário para lidar com os danos causados”, finaliza.