Devido aos danos causados pela estiagem, fruta não atingiu o calibre desejado, perdendo valor de mercado e dificultando a venda
Embora a Serra Gaúcha seja conhecida mundialmente pela uva, quem circula pelo interior, também encontra a produção de outras variedades de frutas. O pêssego, que teve a safra finalizada recentemente, é um exemplo. Por isso, a reportagem do Jornal Semanário conversou com alguns agricultores, para saber qual a avaliação deles sobre a quantidade, qualidade – principalmente em um período de seca – e preço final.
Na Linha Palmeiro, interior de Farroupilha, Emerson Bellaver, 29 anos, começou a trabalhar com agricultura para dar sucessão ao que já vinha sendo feito, há muitos anos, com o amor e suor das mãos familiares. O pai, Adair Bellaver, 71 anos, continua no ramo. Pai e filho trabalhavam com parreiras, mas para aumentar a renda, optaram por produzir pêssegos em três hectares de terra.
Faça sol ou chuva, calor ou frio, o trabalho nunca tem fim, pois o pêssego é muito delicado e requer muita dedicação. “Desde a poda até o fim da colheita, para fazermos uma fruta bonita, de qualidade e graúda, temos que ter todos os cuidados, porque ela é sensível a qualquer variação do tempo. Se faz muito frio ou geada, queima. Chuva de pedra, com qualquer batida, mancha”, explica Bellaver.
Porém, quando se fala em tempo, os agricultores não tem controle sobre o que vai acontecer, tornando-se reféns das situações climáticas. Esse ano, por exemplo, a estiagem que está assolando o Rio Grande do Sul, vem causando prejuízos aos agricultores.
Na propriedade da família Bellaver, a colheita da safra iniciou dia 10 de outubro de 2021 e foi finalizada no dia 22 de dezembro. “De arrancada, a safra foi boa, tanto em preço quanto em qualidade. No começo, tínhamos estimativa boa, mas por causa da seca, foi diminuindo essa perspectiva. Então, chegou no fim, ruim de preço e ruim de qualidade, foi para desanimar mesmo”, afirma.
A família produz uma média de 60 toneladas de pêssego. Esse ano, foram 45. O agricultor conta que, após uma avaliação, decidiu não colher tudo que tinha. “Abandonei um pedaço, porque não valia a pena colher, deixei tudo em cima dos pés, porque colher daria mais prejuízos ainda. Em alguns pedaços ficou 60% da fruta em cima das plantas, mais da metade. Esse ano as perdas foram significativas. Fruta miúda, murcha”, garante.
Questionado se já tinha vivenciado um período de estiagem como esse, o jovem relata que não dessa forma. “De não valer a pena colher a fruta, foi a primeira vez, tanto minha, quanto do meu pai, porque mesmo com um pouco de seca, a gente conseguia colher tudo, as plantas conseguiam se manter”, garante.
Ainda assim, apesar dos prejuízos, Bellaver acrescenta que a qualidade dos pêssegos que puderam ser colhidos, foi boa. “A fruta que a gente conseguiu colher tinha qualidade, gosto, coloração, aceitação de mercado. O que deu para colher foi bom”, destaca.
Preço abaixo do esperado
De acordo com Bellaver, os agricultores ganharam entre R$1,50 e R$2 pelo quilo do da fruta nesse ano. “O pêssego deveria ser vendido a partir de R$2 para termos algum lucro, para girar um pouco de dinheiro. Abaixo disso, estamos trabalhando para empatar, porque os insumos, os adubos aumentaram até 100%”, analisa.
O agricultor afirma que o ganho dessa safra foi muito inferior, quando em comparação com a última. “Ano passado estávamos ganhando R$3,50, R$4 ao quilo e esse baixou para R$1,50, mas subiu o diesel que é nosso principal combustível. Temos muitas despesas”, alerta.
Próximo passo: investir em irrigação
Para evitar que as próximas safras continuem sofrendo danos devido ao tempo, Bellaver antecipa que a família decidiu que vai investir em irrigação. “Seria bom se fosse tudo perfeito, chuva na hora certa, quantidade certa de frio, calor no final, mas tempo perfeito acredito que não vai mais ter, não tem mais estação definida, está bem descontrolado. Vou ter que investir em irrigação, até para conseguir ter a produção. Depender só do clima está complicado, quando faz geada faz seca ou, as duas no mesmo ano”, afirma. Então, vamos começar com a irrigação para tentar amenizar a seca, por enquanto. Depois, futuramente, fazer um anti geada para tentar ter produção certa todo ano”, salienta.
Desistir não é uma opção
Apesar do desanimo causado pelas perdas, Bellaver salienta que desistir de trabalhar com agricultura não está nos planos. “O trabalho é árduo, de sol a sol, nesses dias que estão fazendo 40 graus estamos lutando e desistir é a última opção do agricultor”, afirma.
Contudo, o jovem pede mais valorização para os produtores. “A expectativa sempre é que venha uma safra perfeita, mas a gente sabe que isso não vai acontecer. O que sobra é a teimosia para continuar trabalhando. Como venho de sucessão familiar, optei por essa área, mas a cada ano estou desanimando mais. Continuo aqui por ver toda plantação, todo investimento, dá pena de abandonar, tem todo um amor a profissão, mas a gente gostaria de uma valorização”, finaliza.
Família Bohm
Na mesma localidade, o agricultor Roberto André Bohm, 29 anos, também trabalha com o cultivo de pêssego. “Para nós, esse ano, a safra começou ali pelo dia 10 de novembro, adiantou um pouco. finalizamos em torno do dia 20 de dezembro”, lembra.
Na avaliação de Bohm, a safra foi grande, porém, como rendeu grande quantidade de fruta, o preço caiu. “Foi boa, grande, o pêssego não estava tão feio, mas em compensação, como tinha muita fruta no mercado, não agregou valor. Foi um ano de muitos gastos com insumos e não tivemos uma volta desejada. Se empatou os lucros, foi muito”, analisa.
Avaliação do sindicato
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Cedenir Postal, avalia que a safra do pêssego foi um pouco prejudicada pela estiagem. “O fruto não atingiu o calibre ideal, então, a fruta ficou um pouco menor do que o esperado e comercialmente perdeu valor, até porque tinha super safra, então, com pêssego mais miúdo, os produtores tinham dificuldade de venda”, afirma.
Além disso, Cedenir afirma que, em alguns períodos, houve muito descarte da fruta. “O pêssego tinha que ser jogado fora, porque devido ao excesso de calor, amadurecia muito rápido, amolecia e não tinha mais valor comercial”, finaliza.