Livro do enólogo Firmino Splendor, que será lançado em breve, aborda a importância da uva Isabel para o desenvolvimento da região

O setor vitivinícola não seria o que é hoje se tudo não tivesse começado pela Uva Isabel. Por outro lado, ela também é responsável por frear a entrada de outras variedades de uvas viníferas no Brasil porque representava segurança e estabilidade para seus produtores. Tudo isso faz parte do novo livro do enólogo Firmino Splendor, que será lançado na Wine South America e na Feira do Livro de Bento Gonçalves.
A obra denominada de Epopéia da Uva Isabel aborda aspectos históricos, econômicos e culturais que marcaram o desenvolvimento do setor vitivinícola, tendo por base a Uva Isabel. De acordo com o autor, a realização da obra teve por objetivo registrar o histórico de cultivo da videira. “O Rio Grande do Sul iniciou com uvas vitivíferas novas, porém, antes de 1900 não havia tratamentos de defesa. E aí começou a cultura da Isabel”, explica.
Até a década de 60, Splendor avalia que os produtores ficaram muito restritos ao cultivo da Isabel. “Foi difícil para os técnicos introduzir e implementar as viníferas, porque o agricultor estava ‘pregado’ na cultura da Uva Isabel”, avalia.

As fases do trabalhador

O autor divide o homem da terra, na região, em três fases. Inicialmente, era um agricultor, que se concentrava na policultura. “Ele cultivava milho, trigo, arroz, feijão e batata. Também praticava horticultura e viticultura”, enumera.
Já na segunda fase, esse homem se transformou no viticultor iniciante, de 1925 a 1960, que teve o cultivo da Isabel como variedade predominante. Na terceira fase, para Splendor, o viticultor se tornou profissionalizante. “Ele deixou de lado a policultura e dai adiante iniciou variedades diversas, que no começo eram bem restritas”, explica. Inicialmente, eram poucos tipos de uvas viníferas, como Cabernet Franc e algumas brancas.

O apego pela Isabel

Se a variedade Isabel foi decisiva para a região, ela também representou a dificuldade de inserção de outros tipos de uva. Na avaliação de Splendor, por conta da segurança e produtividade que ela representava para os produtores, muitos resistiam a plantar outras videiras. “Cabernet ficava sobrando, ficava em estoque, não escoava. Na década de 60, o mercado queria Isabel”, analisa.
Ele conta que os técnicos tiveram dificuldades para desenraizar essas ideias, sobretudo pela resistência que a uva apresentava. “A parreira de Isabel do Centro, se você observar, não tem doença”, exemplifica o enólogo.

Responsável pela vocação vitivinícola

Durante o século XX, Bento Gonçalves se firmou como Capital Brasileira do Vinho. Mas por um período bastante longo, a maior parte da produção da região se concentrou na Isabel. “Nós temos que reconhecer. Ela é a história da nossa economia, foi ela que fez Bento se tornar a maior produtora de vinho. A viticultura e seus descendentes formaram toda essas cidades, distritos e povoados, graças a Isabel”, pontua.
Ele explica que enquanto a uva em questão era garantia de produção, as demais variedades não conquistavam confiança dos agricultores. “Não tinha produtos tecnológicos como da década de 60 para cá, então todos esses são fatores que ajudaram a Isabel permanecer em predominância”, aponta.

 

Produção diminuiu ao longo dos anos

A produção de Isabel decaiu de 95% em 1910 para 32% do total em 2018. Ao longo dos anos avaliados por Splendor, a redução tem sido progressiva e gradativa. Contudo, também houve aumento na produção absoluta de uvas.
Segundo ele, a redução do cultivo da variedade precisa ser vista como um fator positivo, na medida em que surgiram novos consumidores. “A introdução de uvas novas, que não existiam antes, foi consequência da curiosidade dos consumidores, que gostariam de conhecer novos vinhos”, salienta.
Além disso, ele cita os melhoramentos técnicos do setor como fator importante para a diversidade dos cultivos. “Isso ajudou sair do Barbera Piemonte, que tinha um nível de qualidade distante do que nosso consumidor busca hoje. Ainda naquela época, não existia sequer refrigeração na indústria vitícola”, aponta.

Preservar a Isabel

Na opinião de Splendor, embora a evolução seja necessária, ele recomenda que os produtores mantenham parreiras de Isabel, mesmo que em pequena quantidade. “Nós temos que preservar nossa história. Daqui há 100 anos, essas parreiras vão ter 200 anos”, comenta.

 

Quem é Firmino Splendor

O autor é enólogo e já acumula mais de 50 anos de experiência no setor vitivinícola. Ele foi um dos primeiros formados em enologia do país e estudou especialização em Bordeaux, na França. Também é autor de diversos livros sobre o setor vitivinícola e deu aula por 30 anos.