Jane Krüger
Quando pequena, durante a minha primeira infância, tínhamos uma humilde, pequena e velha casa de madeira. Meu pai era agricultor e não tínhamos nenhum luxo. Não havia chuveiro, tomávamos banho com um balde de alumínio que tinha um pequeno chuveirinho acoplado ao mesmo. Lembro de minha mãe saindo todos os dias pelas manhãs para tirar leite das vacas – muitas vezes eu ia junto e gostava de ver ela trabalhar. Lembro nitidamente dos rituais diários para tratar os animais e cuidar de todos os afazeres do sítio. Apesar de ser um mundo tão humilde aquele, lembro o quanto era perfeito e feliz. A paz imperava ali todos os dias.
Como pessoas tão pobres podiam ser tão felizes e viver bem com tão pouco? Apesar das poucas condições, parecia que nada nos faltava.
Não fazia falta uma casa requintada, me divertia mais andando na carroça do que com o fusquinha amarelo cor de ouro que meu pai adquiriu depois. Quantas viagens nele fizemos! Em seis, meus pais e quatro filhos, e ainda sempre tinha lugar para mais um. Contudo, a pergunta não pode calar, o que alegrava os nossos dias?
Tenho a lembrança vívida de meu pai, quando vinha da roça com a roupa suja e surrada, adentrando o portão de casa quase sempre cantando e uma de suas canções favoritas era:
– “O chão dá se a gente plantar, se a gente não planta, o chão não dá, o chão não dá… “. E quando não cantava, assobiava.
Já, minha mãe, deixava a casa tão simples um paraíso, com flores plantadas em toda sua volta, e tudo carinhosamente arrumado. Tudo feito com esmero e amor.
Aquela alegria invadia toda a casa e esquentava nossos corações. Não lembro em nenhum momento da minha infância de meus pais murmurando. Eles passaram por inúmeras e grandes dificuldades. Foram tantas colheitas perdidas, muitas frustrações vividas, porém no seu rosto não faltava um sorriso, o olhar sempre carregava uma visão de que o paraíso pode ser aqui na terra embora vivendo nas adversidades mais duras dos desertos da vida.
Diante de tudo isso, humildemente mas com confiança reitero, da maneira como começamos nosso dia, provavelmente o terminaremos.
Se levanto mal-humorado, brigando e amaldiçoando minha vida, meu trabalho, meus relacionamentos ou o que quer que seja, uma nuvem escura se apodera e impera sobre a legalidade das palavras liberadas.
Desta forma, não posso me espantar se as coisas vão tão facilmente de mal a pior, o trem simplesmente descarrilha. Contudo, quando conscientemente escolho ser grato, quando decido cantar em vez de murmurar, incrivelmente as nuvens escuras se dissipam e as bênçãos se instalam, trazendo alegria e leveza ao meu dia.
Sendo assim, agora pergunto:
– Que lembranças estamos imprimindo na memória de nossos filhos? Como se lembrarão de nós? Que marcas temos deixado?
Porque, no final de tudo, você não é o que você tem. És, sim, as memórias que deixas. As lembranças que ficam.