Após as devastadoras enchentes e deslizamentos de terra em maio, a Serra Gaúcha luta para recuperar seu brilho como destino turístico, unindo esforços de empresários e autoridades para reconstruir a confiança dos visitantes

Nos últimos meses, Bento Gonçalves e Serra Gaúcha tem enfrentado uma série de enchentes e deslizamentos de terra que impactaram severamente o setor de turismo local. Conhecida por suas vinícolas, paisagens deslumbrantes e uma rica oferta de eventos culturais, a região viu uma queda significativa no número de visitantes, gerando preocupações entre empresários e autoridades sobre os efeitos a longo prazo na economia.

Os últimos anos têm sido pujantes quanto ao turismo em Bento Gonçalves. O município tem se destacado pela variedade de atrativos turísticos oferecidos entre a área urbana e rural. Com base nesse cenário, a Secretaria de Turismo (Semtur) divulgou números de 2022, alcançando 1.767.512 visitantes, frente a 1.475.434 de 2021. Antes de 2022, o melhor ano de visitação registrada foi em 2019, quando foi atingida a marca de 1.694.462 visitantes.

As chuvas intensas de maio resultaram em grandes prejuízos, incluindo a perda de vidas e danos significativos às infraestruturas locais. Marcia Ferronato, Diretora Executiva do Sindicato Empresarial de Gastronomia e Hotelaria região Uva e Vinho (SEGH), explica que o setor de turismo, ainda em recuperação dos efeitos da pandemia, foi duramente atingido pela drástica queda no fluxo de turistas.

Em resposta à situação caótica, o setor turístico se mobilizou rapidamente. Empresas e entidades se uniram em iniciativas solidárias, como o movimento “Unidos por Bento” e “Todos pela Serra Gaúcha”, para ajudar os atingidos e buscar soluções para os acessos às áreas afetadas. Além disso, aderiram à ação “Abrace Bento”, que visa acolher visitantes e mostrar que a região está aberta e precisa continuar funcionando. “As chuvas de maio foram duras com o RS. Na região e em Bento muitos atingidos e vidas perdidas. O setor de turismo, que ainda não estava recuperado dos reflexos da pandemia, novamente está duramente impactado, devido à queda drástica do fluxo turístico. Diante da situação caótica o setor se mobiliza, ingressa na corrente da solidariedade ajudando pessoas atingidas, bombeiros e equipes de apoio”, revela Marcia.

O desempenho do setor

Marcia descreve o mês de maio como catastrófico para o turismo na Serra Gaúcha. Embora muitos negócios não tenham sofrido danos diretos pelas chuvas, o impacto foi sentido pela quase nulidade do fluxo de turistas. A retomada foi tímida, começando no feriado de Corpus Christi, graças à ação ‘Abrace Bento’, organizada pela Secretaria de Turismo e o Conselho Municipal de Turismo (COMTUR), com a participação do SEGH. “Foi um mês quase nulo em fluxo, retomando timidamente no feriado de Corpus Christi; graças a esta ação Abrace Bento orquestrada pela Semtur e Comtur, e que o Segh faz parte”, explica.

Com o final de maio, houve uma leve retomada do turismo, principalmente nos finais de semana. No entanto, junho e julho continuam abaixo das expectativas, devido às dificuldades de acesso e à insegurança gerada pelas imagens das enchentes veiculadas na mídia. Para reverter essa situação, a Semtur Bento e outros negócios, como a Maria Fumaça, estão reforçando projetos de estímulo à visitação local e promovendo o destino em feiras e eventos. “Infelizmente, é natural diante da realidade do Rio Grande do Sul, que ainda de com dificuldade de acessos via algumas estradas e principalmente na limitação do aéreo, além da insegurança devido as imagens veiculadas. Julho historicamente é um mês de alta temporada, graças as férias escolares e inverno. Juntos no projeto ‘Abrace Bento’ seguimos reapresentando os produtos e serviços, convidando para que nos visitem. São muitas ações se somando a esta inciativa, vídeos e portifólios com programações tentadoras, participação em feiras promovendo o destino. Com isso, nossa esperança é de ampliar o fluxo turísticos de julho. Somos resilientes, vamos superar”, declara

Nos últimos dois anos, a Serra Gaúcha enfrentou diversos problemas, desde polêmicas com trabalho escravo até enchentes e deslizamentos. Esses desafios têm impactado a imagem da região entre os turistas. Segundo Marcia, o trade turístico mantém o foco na oferta de excelência e na comunicação verdadeira, que gera confiança nos visitantes.

Avaliação dos turistas

Os turistas, de maneira geral, têm sido solidários e mantido suas viagens programadas, remarcando quando necessário. Com a entrada na alta temporada, espera-se que a maioria dos turistas seja da região e de áreas próximas, devido às dificuldades de acesso.

Renata Fernandes Machado, arquiteta e urbanista de 43 anos, compartilhou sua experiência e percepções sobre a Serra Gaúcha após os desastres naturais que assolaram a região em maio. Residente de Santos, São Paulo, Renata é uma frequentadora assídua da Serra e traz uma visão pessoal sobre o impacto das enchentes no turismo local. “O que mais me atrai, além da paisagem e o clima, é a cultura e a gastronomia da Serra”, afirma Renata. A arquiteta sempre apreciou as visitas à Serra Gaúcha, destacando que suas experiências anteriores foram maravilhosas, sempre caracterizadas por momentos divertidos e tranquilos.

As enchentes e deslizamentos de maio mudaram algumas percepções de Renata sobre a região. Embora ela tenha receios sobre a chegada ao aeroporto e as estradas, sua principal preocupação é não atrapalhar a comunidade local, que já enfrenta desafios significativos com os recursos disponíveis. “Tenho alguns receios em relação à chegada no aeroporto e estradas até a chegada na Serra. Mas o principal é o receio de ‘atrapalhar’ e levar ao local mais pessoas para usarem os insumos, energia, água etc. do local”, explica.

Renata ficou sabendo das enchentes através das redes sociais, logo após os eventos. Ela ressalta que, apesar das preocupações com a infraestrutura, não sente medo de que os desastres se repitam durante uma visita. No entanto, está consciente da necessidade de apoiar a região na reconstrução.
Apesar dos desafios, Renata acredita que a Serra Gaúcha continuará sendo um destino turístico viável. “Acredito que continuará sendo um destino turístico e que mais pessoas poderão visitar, após as coisas melhorarem, a fim de fomentar o turismo e ajudar na economia do estado”, afirma. Ela enfatiza a importância de que as melhorias na infraestrutura e segurança sejam feitas para garantir um turismo sustentável e seguro.

A reorganização do setor turístico está sendo feita através da união de forças entre Semtur, Comptur, Segh, Convention e outras entidades, focando na reapresentação dos produtos e serviços e gerando segurança ao turista por meio de informação e divulgação.

Nicole Sachet Maso, Diretora de Marketing da Casa da Ovelha, destaca que as enchentes impactaram fortemente o setor turístico da região, resultando em movimentação praticamente nula em alguns momentos devido às condições adversas nas estradas e aeroportos. Apesar de não haver danos estruturais significativos, a redução no fluxo de visitantes representa um desafio considerável.

Maio foi um mês desafiador, com uma baixa significativa no número de turistas. No entanto, em junho, houve um aumento considerável de visitantes, especialmente das regiões próximas, promovendo o turismo local. Nicole acredita que investir no mercado local é uma solução viável para a recuperação gradual do setor.

A principal dificuldade na retomada do turismo é o acesso via aeroporto, com a redução de voos e o aumento nos preços das passagens. Nicole destaca a importância de encontrar soluções para promover um acesso mais conveniente e acessível para os visitantes. “Uma das principais dificuldade na retomada do turismo na região está relacionada ao acesso via aeroporto. Anteriormente, tínhamos um número significativo de voos que facilitavam a chegada de turistas à região. No entanto, houve uma redução drástica nesse serviço. Além disso, o aumento nos preços das passagens aéreas também tem impactado negativamente, dificultando ainda mais a retomada do fluxo turístico para nossa área”, explica Nicole.

O restaurante Di Paolo, embora não tenha sofrido danos diretos, foi afetado indiretamente pelas enchentes. A falta de estradas e aeroportos operacionais dificultaram a chegada de clientes, gerando insegurança tanto para os moradores locais quanto para os turistas.

Para o sócio-proprietário, Emiliano Castaman, os turistas têm mostrado grande solidariedade, e a união das empresas em ações de auxílio e doações tem sido fundamental para a recuperação da região. A resposta positiva dos turistas e a dedicação das empresas locais destacam o espírito de resiliência da Serra Gaúcha. “O clima hoje, gera uma insegurança tanto para o cliente local quanto ao turista, afinal, nos arredores a destruição foi muito grande, famílias que perderam entes queridos. Isso sim é perda real”, diz Castaman.
Com a gradual normalização das condições de acesso, espera-se uma melhora no fluxo de clientes. A colaboração entre empresas e entidades está ajudando a restabelecer a normalidade e promover a região como um destino acolhedor e seguro. “Precisamos que aeroporto de Porto Alegre volte a funcionar o quanto antes e que o aeroporto de Caxias do Sul, por exemplo, realmente receba incentivo tão necessário para melhorias e receber voos com segurança e tranquilidade, tanto para quem vem para fazer turismo, ou no caso empresas da região que recebem os clientes, fornecedores, insumos”, declara.

As enchentes e deslizamentos de terra representaram um desafio significativo para o turismo na Serra Gaúcha, afetando diretamente a economia local. No entanto, a resiliência, a união e os esforços coordenados entre governo, empresários e a comunidade mostram um caminho para a recuperação. A transparência, a comunicação verdadeira e o investimento no mercado local são fundamentais para superar os desafios e fortalecer o setor turístico da região. “Neste mês de junho já se percebe uma pequena melhora na circulação de clientes na região, pois várias ações realizadas em parceria público privada fizeram diferença. Na construção de pontes, aberturas e melhorias de estradas. Essas ações são vistas e valorizadas pelas pessoas que gostam da região automaticamente farão com que elas venham para cá ,também valorizando o trabalho voluntário de empresas e entidades que não mediram esforços para o restabelecimento local”, conclui.