Localizado no Vale dos Vinhedos, conta com diversos estabelecimentos e poucos moradores e, todos os dias, recebe turistas do país inteiro

A linha 8 da Graciema é uma comunidade bastante popular nos dias de hoje, há 30 anos atrás o espaço não contava nem com asfalto ou com um grande número de visitantes. Após estas três décadas, a localidade tem diversos restaurantes, cafés, lojas e hotéis. A moradores que revelam que o local perdeu sua característica de interior, outros se animam com as oportunidades que o turismo trouxe para a região.

O turismo instalado

O Vale dos Vinhedos é uma das rotas mais procuradas por turistas, por volta de 1995 foi se transformando no que é hoje, uma extensão de 72 quilômetros com diversos estabelecimentos, que vão desde restaurantes, a lojas e hotéis. Lenira Salibel trabalha em uma loja de chocolates localizada na 8 da Graciema. Há dois anos, após fechar seu salão de beleza na pandemia, passou a trabalhar na loja de sua amiga, que foi pensada durante seu trabalho de conclusão de curso. “Durante o tcc, a dona da loja tinha que criar uma empresa e assim ela fez uma fábrica de chocolate. E foi se aprofundando, estudando, e hoje já faz 12 anos que ela está aqui no Vale”, e complementa que é possível ver muitas mudanças na rota desde então. “Quando a loja surgiu aqui já era uma rota turística, mas o vale cresce muito, todo o dia tem empreendimentos novos, ele está sempre aumentado”, explica Lenira.

Por estar todos os dias no estabelecimento, ela consegue ver como se dá o movimento turístico e nota o que ainda precisa melhorar em relação ao atendimento desta clientela. “O fluxo turístico é bem grande, vem de todos os estados e regiões. Para nós aqui na loja é muito bom, mas o que falta ainda para o Vale, principalmente na segunda-feira, são estabelecimentos que fiquem abertos. Cafeterias, restaurantes… Tem bastante investimentos aqui, mas que ficam abertos de segunda a segunda são muito poucos”, revela.

Lenira Salibel, atendente, cobra que mais estabelecimentos funcionem de segunda a segunda

Uma loja de chocolates é um atrativo diferente na rota, que em sua maioria, conta com restaurantes e vinícolas. “Atrai muito o público porque as fábricas de chocolate são só em Gramado e Canela, e aqui tem e é única. E sobre o público, o final de semana é muito aqui da região, os pais moradores de Bento vem com a às as crianças e elas brincam no parquinho e durante a semana são mais turistas, pessoas que vêm de longe”, relata.


Ronicleia Monteiro é psicóloga e trabalha em uma loja de peças de design no Vale, um dos diferentes comércios presentes no local. Ela explica que o surgimento do espaço veio poucos meses antes da pandemia, mas que ele sobreviveu a esta complicada fase. “Em 2019 surgiu a ideia do espaço, em 2020 veio a pandemia, mas ela conseguiu se organizar e seguir. Após isso mudou para um ponto maior, aumentou as peças e começamos a vender móveis na parte de baixo da loja”, traz.

Os artefatos vendidos vão desde decoração até xícaras e pratarias. Cada objeto presente é escolhido cuidadosamente pela dona da loja e muitos vêm de outros lugares do mundo. “O pessoal visita o Vale todos os dias, então mantemos aberto de segundo a domingo. O fluxo depende muito, cada dia é uma coisa, às vezes a segunda é mais movimentada que o domingo. E os nossos clientes não são só os turistas, mas o pessoal de Bento vem para cá também e compram nossos itens”, conta.
Antes de trabalhar lá, Ronicleia já ia como visitante, moradora de Bento há alguns anos, passeava pelo local e agora numa nova perspectiva, enxerga mudanças. “Quando conheci aqui já era turística e sempre gostei muito do Vale. Mas percebo que o número de empreendimentos tem crescido muito. E faz muito sentido uma loja de decoração aqui, porque tem coisas pequenas e diferentes, peças que quem está viajando pode levar com tranquilidade. Sem falar 90% dos nossos produtos são importados, isso traz um diferencial”, destaca.

“O turismo trouxe empregos”

Maria Buschi veio de Monte Belo do Sul, após se casar, foi morar na Linha 8 da Graciema quando a rota turística ainda não existia. “Moro há 34 anos aqui, nasci em Santa Bárbara em Monte Belo. Quando mudei para cá, ainda não existia essa rota turística. Nós plantávamos milho, cuidávamos da roça, nem asfalto tinha ainda”, recorda.

A partir do momento que o local foi virando rota, a vida de Maria foi tendo mais oportunidades. “O turismo trouxe muitos benefícios, gerou mais empregos, já trabalhei em vários locais aqui, então foi muito benéfico, principalmente para mim, portanto gosto muito de morar no Vale. Fora que, a gente vive entre cafés e restaurantes, em um quilômetro temos diversas opções. Não vejo nenhuma parte ruim de viver na linha oito e o movimento não me atrapalha em nada”, reflete.

Com a valorização dos terrenos e do local, quem não vendeu suas terras, abriu seu próprio negócio, o que fez com que a agricultura do lugar diminuísse um pouco. “O que tem de plantação aqui é parreirais, e mesmo assim é difícil de encontrar. Mesmo antes da rota acontecer, o que mais tinha de plantação aqui era uva. Antigamente tinham pessoas com granja também, mas hoje em dia diminuiu muito. Atualmente, cuido de um terreno que a vizinha me deu, aqui planto minha hortinha, não vendo nada, é tudo para uso próprio ou para dar para a família, amigos e vizinhos. Mas o meu filho trabalha com algumas parreiras”, conta.

Assim como o número de moradores que também decaiu, claro que com suas exceções, viver, atualmente, na Linha 8 da Graciema não é tão barato. “Diminuiu o número de moradores que eram daqui, porque até temos loteamentos, mas são de pessoas com mais dinheiro, os terrenos se tornaram caros. Então, moradia não tem muitas, mas estabelecimentos têm. Quem vive aqui é geralmente quem já tinha casa ou já vivia antes”, declara.

E sobre a juventude, muitos jovens tem se mantido por lá, afinal, o número de empregos é realmente bom, e além disso, abrir o próprio negócio muitas vezes é rentável. “Os jovens que já moram aqui ficam. Tem muito emprego, alguns empreendem, outros tem suas parreiras. Inclusive, sentimos falta de pessoas para trabalhar, porque muitos não querem vir aos sábados e domingos, e para nós o movimento acontece mesmo é nesses dias”, finaliza.

“Aqui perdeu um pouco as características”

Ainda é possível encontrar moradores que nasceram na localidade, como Bernardete Berselli que toda a sua vida viveu próximo ao lugar em que nasceu. “Nasci e sempre morei aqui na Linha 8. Meu pai era funcionário público, trabalhava com a limpeza das estradas e a minha mãe era dona de casa. Basicamente vi todo o desenvolvimento acontecendo, quando meu filho tinha dois anos, asfaltaram aqui. E foi a partir daí que iniciou essa movimentação”, relembra.

Ela lembra que no momento em que a rota foi se formando, muitos residentes foram percebendo aos poucos. “Nos últimos anos foi ficando ainda maior, e nós moradores, na época, não sabíamos o que estava acontecendo. Do nada foi surgindo estes estabelecimentos. Têm o lado bom, mas tem o lado ruim que é ter muito movimento. O barulho dos carros é muito alto, e gostava de viver aqui justamente pela tranquilidade”, lamenta.

Bernardete Berselli nasceu na Linha 8 e acredita que o local perdeu sua originalidade

Bernardete revela que já houveram ofertas pelo seu terreno, e ela ainda pensa sobre o assunto. “Às vezes penso em vender e viver em uma outra casa de interior que tenho, lá é mais tranquilo. A localização aqui é ótima, mas sinto que perdeu a originalidade. Antigamente era menos desenvolvida, menos movimento, mas tinha suas características, e sinto que se perderam. Muitas pessoas foram embora e venderam seus terrenos. E entendo ter virado a rota que é hoje, quando vivemos em um lugar, não percebemos a beleza que existe”, expressa.

A Escola do Vale

Entre Linha 15 e 8 da Graciema, há a Escola Municipal de Ensino Fundamental Lóris Antônio Pasquali Reali, o colégio foi pensado para unir todas as pequenas escolas que existiam ao redor do Vale. “A escola foi inaugurada em maio de 2005, e atendemos diversas localidades como um pedaço do Municipal, todo o Santa Lúcia, 40 e 15 da Graciema, e o 8 da Graciema. Ao total temos 209 alunos, que são atendidos desde o Jardim A, até o nono ano. A escola surgiu da necessidade de termos um local onde unificasse todos aqueles colégios pequenos que existiam nas comunidades, onde havia um único profissional que era um professor multisseriado. Basicamente, em uma sala de aula tinham alunos de diversas séries diferentes. Este profissional além de dar aulas, também fazia a limpeza do local e servia a merenda. E como tinham muitas destas escolas espalhadas foi unificado em uma única, pensando no melhor aprendizado dessas crianças”, explica a Diretora, Carina Zucchi.

Sobre os alunos que frequentam, a direção vem notado problemas em relação ao desenvolvimento escolar. “Eles são muito bons disciplinarmente, são educados. Porém, nós os sentimos muito apáticos e com pouco interesse pelo estudo, muito desmotivados. Desde a pandemia ficou pior, mas este é um comparativo que já fazemos com outras escolas. Não sabemos se é o caso de não dar tanta importância aos estudos, ou se é algo com a adolescência, porque notamos isso mais forte a partir do sexto ano. Mas claro que isso acaba diretamente ligado com a família, porque a criança só vai se interessar se tiver alguém que a estimule em casa. Mas dos adolescentes sentimos um comodismo muito forte”, frisa.

Sobre a estrutura do colégio, ainda não foram feitas reformas de fato, visto que o local tem 18 anos e é considerado bastante jovem. Entretanto, melhorias vêm acontecendo. “Fazemos manutenção anualmente, por isso não precisamos fazer grandes reformas. Claro que estamos buscando junto da Secretaria algumas mudanças de estruturas, como fechar a quadra para melhorar este espaço. A Secretaria entende a nossa demanda e está fazendo o possível. A estrutura daqui é muito grande, fora as dez salas de aulas, temos biblioteca, laboratório de ciência e de informática. O espaço físico é super completo, mas o laboratório de informática está com os computadores ultrapassados e não temos um profissional, então ele está fechado”, alega.

A partir de 2023 os alunos passaram a receber o transporte público locado, visto que antes eles acabam utilizando o de linha. “Todos os nossos alunos recebem o transporte, depois de muita luta, a secretaria da educação, neste ano, disponibilizou um ônibus locado e ele passa em todas as comunidades, são quatro linhas diferentes e eles não precisam se deslocar grandes distâncias para pegar a condução. Agora, a nossa dificuldade é com as pessoas que trabalham na escola em relação ao transporte público porque, o funcionário não pode utilizar o transporte do aluno e não tem quase ônibus para cá”, alerta.

Uma situação que acaba entristecendo a diretora, é a falta de presença dos responsáveis. “A comunidade tem sido pouco presente, convidamos todos para assistir um palestrante conceituado que iria vir até a escola e foram no total de alunos, pais e professores 80 pessoas. E esperávamos no mínimo 300 pessoas e não tivemos nem 100. E essa é a grande dificuldade, a participação dos pais, e quando digo participação, não é cobrança. Porque muitas vezes os pais exigem muito da escola, mas não fazem o seu papel”, critica.