Rosângela Jardim, pedagoga e mestra em educação, destaca a importância de culturas empresariais voltadas a qualificação do profissional, a necessidade de inovação na educação e os desafios de elaborar uma boa gestão
Pedagoga, mestra em educação, discente do curso de psicologia, natural de Porto Alegre, à frente do Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio (SENAC) Bento Gonçalves há 10 anos, como diretora e gestora da instituição, Rosângela Jardim traz a necessidade de se pensar cada vez mais em qualificação, inovação e em culturas empresariais que mantenham o funcionário motivado e entregando bons resultados. Além disso, explica a importância do Senac como escola profissionalizante, tendo opção para os mais diversos públicos.
A importância da gestão
Rosângela iniciou sua trajetória como estagiária, em Tramandaí, há 18 anos. Após esse primeiro momento, trabalhou na sede de Porto Alegre, onde realizou um trainee da empresa, que visava transformar jovens colaboradores em líderes. Iniciou sua primeira gestão em Santana do Livramento, e após dois anos, deu continuidade no Município de Bento Gonçalves.
“Nesse tempo todo procurei estudar, fazer formações que fossem me ajudar nos desafios de ser uma líder, ainda mais nos tempos de hoje. O segredo é a adaptação, mudamos e inovamos, acredito que estamos vivendo em um mundo de muita pressão, principalmente psicológica. Tanto os gestores, quanto a sociedade de forma geral, muitas vezes, pelo próprio capitalismo e necessidade de sobrevivência e de consumo”, explica.
Com uma graduação completa, pós e mestrado, a gestora, com sede de novos conhecimentos, decidiu iniciar psicologia, e isso está lhe ajudando muito em seu trabalho. “O comportamento do ser humano também muda muito. Com todas essas crises, com todos esses acontecimentos, tanto daquilo que não é bom, quanto daquilo que é high-tech, tecnológico, o nosso comportamento também muda. Como gestora, é um desafio, porque lidamos com pessoas. Os processos, as técnicas, tudo se aprende e se adapta. Agora, o aprendizado com relação às pessoas, na minha opinião, é o mais difícil. Entender de comportamento humano e lidar com a sua equipe”, relata.
E complementa que “tem a política que precisamos entender e nos envolver, temos a comunidade que precisamos entender e compreender para poder atender eles, então é um universo de coisas que um gestor tem que dar conta, que se soma. Quando comecei, há 12 anos me via uma, hoje me vejo outra pessoa completamente diferente. Claro que foram pelas experiências somadas”, constata.
Para ser uma boa líder, Rosângela entende que há a necessidade de compreender o que cada funcionário demanda no momento. “Vivemos oito horas dentro de uma empresa, muito mais do que vivemos em casa com a família, porque se pensarmos que boa parte do tempo dormimos, não nos resta muito para conversarmos com nossos familiares. Logo, não existe mais aquilo que se falava, que costumava-se dizer que os problemas pessoais a gente deixa na porta, para fora da empresa. Não, a empresa acolhe tudo. É dentro da empresa que as coisas acontecem. Se um colaborador vem trabalhar contigo e ele não está bem psicologicamente, o trabalho dele não renderá tanto”, ressalta.
Ela conta que enxerga uma boa gestão também no tratamento daquele funcionário. “Talvez seja necessário conversar, explicar que o trabalho pode ser uma opção para se pensar em outra coisa. Agora, achar que não vai haver essa mistura onde o trabalho fica para um lado e o pessoal fica para o outro, não existe. Estamos vivendo em uma sociedade onde as coisas se encontram, se complementam, e precisamos nos adaptar e entender o contexto. Como gestora, que tipo de ajuda posso fornecer? Tivemos agora colaboradores que tiveram suas casas alagadas; muitas vezes, não posso colocar essa pessoa para morar comigo, mas posso ajudá-la a procurar um lugar. Às vezes uma palavra de conforto é só o que a pessoa precisa”, conclui.
Qualificação da mão de obra
Como diretora do Senac, Rosângela entende que cursos profissionalizantes são de extrema importância quando se fala sobre qualificação da mão de obra. “Diria que o Senac, dentro desse caminho, conseguiu avançar bem, porque nós somos e fazemos educação profissional. E hoje a educação profissional é extremamente importante para o desenvolvimento do país, porque nós precisamos de profissionais qualificados. ”, alega.
Ela completa que nos dias de hoje, há três formas de ingressar na escola, facilitando assim o acesso ao conhecimento para esses futuros profissionais e para as empresas, que terão funcionários capacitados. “Hoje o SENAC atua basicamente, se pudesse resumir, com três públicos. O primeiro público seria o de prefeituras e empresas. Chamamos eles de In Company, que são soluções corporativas para a empresa. A segunda possibilidade são os cursos de mercado para pessoa física. Atendemos também é o público do PSG, que seria o Programa Senac de Gratuidade, que oferece cursos de qualificação e capacitação profissional totalmente gratuitos. Nesse momento, a pessoa está desempregada e não tem como pagar o curso. Então, o Senac hoje disponibiliza muitos cursos, isso no Rio Grande do Sul inteiro, de gratuidade. Ele vai consultar no site do Senac RS, ver quais são as oportunidades que tem lá de cursos gratuitos via edital”, explica.
Hoje, os carros chefes da instituição são os cursos de gastronomia, confeiteiro, cabeleireiro e sommelier. “Trabalhamos com a necessidade do mercado, fazendo com que nossos alunos sejam futuros profissionais que esse mercado vai absorver. Claro que, também existe a possibilidade de ele trabalhar como autônomo ou empreendedor do seu negócio, como maquiador”, reflete.
Uma reclamação bastante comum é que não há qualificação de funcionários, mas Rosângela entende que também falta buscar essas pessoas. “Têm muitas empresas que reclamam que não tem profissionais no mercado. Na contramão, tem algumas escolas, não só o Senac, tem o Instituto Federal, que é um instituto de qualidade e gratuito, formando pessoas. Talvez o que nós precisamos também é mudar um pouquinho a mentalidade dos empresários, fazendo com que eles contratem quem tem qualificação, porque isso vai auxiliar que essas pessoas busquem por ela”, realça.
Ela também diz que há necessidade dos próprios empresários incentivarem seus funcionários, seja através de cursos para as empresas, ou lhes mostrando o caminho. “Outra alternativa é que mandem seus funcionários se qualificarem. Hoje, com todas essas vagas e oportunidades, de gratuidade, de mercado, de soluções corporativas, não tem por que a gente não ter essa possibilidade de educação profissional”, explica.
Cultura Empresarial
Como gestora, Rosângela acredita que há atitudes necessárias para manter um trabalhador motivado. “Às vezes a empresa contrata a pessoa para trabalhar e daqui a pouco ela troca porque a outra empresa paga um pouquinho mais. Então, cada empresa tem que buscar mais políticas, benefícios, organizar a sua gestão de equipes no que tange à méritos, desenvolvimento, para que a pessoa que vai trabalhar ali trabalhe porque gosta do ambiente. Assim a empresa vai conseguir ter um colaborador muito mais inserido e por muito mais tempo”, elenca.
Ela traz sobre a necessidade de uma adaptação e uma mudança nos novos modelos de trabalho. “Temos uma geração de jovens, por volta de seus 18, 19 anos, que começam a trabalhar e não buscam mais só a questão financeira, buscam se identificar com aquela empresa, estar em um clima que para eles é importante. Claro que nem relógio trabalha de graça, sabemos disso, a grande questão é que dentro de um viés, de uma economia que se movimenta cada vez mais para o ter, o que podemos fazer pelas pessoas? Portanto, buscar políticas que beneficiem os colaboradores, políticas que desenvolvam eles e que façam com que estejam dentro das empresas e queiram estar”, exalta.
Inovação
A palavra inovação vem sido mencionada já há alguns anos. A gestora conta que durante a pandemia, foi um momento onde o mundo teve que se acostumar com uma nova realidade. “Conduzimos essas crises no primeiro momento com aulas EAD, e aí fomos cada vez mais nos aprimorando, entendendo as necessidades do mercado e até nos adaptando. Antes nós tínhamos uma realidade que um aluno vinha e buscava um curso de qualificação e ficava aqui de quatro a cinco meses. Hoje já não dá mais para ser assim, pois o aluno e o mercado requer agilidade. Nisso, nos adaptamos fazendo produtos e cursos que fossem um encontro desse novo perfil, que quer entrega, atender as pessoas, financeiramente estar melhor colocado. Então penso que há necessidade de avançar, mas que o Senac foi se adaptando e compreendendo essa realidade e tem cada vez mais buscado alternativas para lidar com esse novo momento que é de inovação”, declara.
Mas ela acredita que essa questão deve permear outros assuntos, e não somente quando se fala em educação. “Sempre discutimos essa questão da inovação, não só Senac, como em alguns lugares que frequento. Primeiro, o que é inovação? Algo totalmente inexistente ou recriar e reinventar? Acredito que com relação a esse assunto, a cidade precisa avançar um pouco. Nós temos o InovaBento, temos algumas iniciativas, mas nós poderíamos mais. Porque é através da inovação que vamos conseguir fazer as mudanças que debatemos”, diz e complementa que “um exemplo são as estradas. Sabemos que tem muitos lugares bons aqui em Bento, mas nós temos difícil acesso. Estradas que ainda não têm a possibilidade de chegar lá como se gostaria e o que dificulta. Talvez a inovação entraria aí, para que possamos discutir mais sobre esses assuntos. Então nos carece de um olhar para a inovação, de um entendimento, e na minha opinião a inovação poderia ser um tema já trabalhado nas escolas públicas, com projetos, para que o aluno tenha o olhar de metodologia, pensar sobre uma mudança, e isso consequentemente requer conhecimento. Então, acredito que precisamos avançar muito, não só Bento, não só o Senac, como no país inteiro mesmo”, reflete.
Comércio
Rosângela identifica o comércio de Bento Gonçalves sendo bastante completo, mas que ainda existem necessidades de melhorias. “Por sermos um dos maiores destinos turísticos, não só do Rio Grande do Sul, como do país, o comércio fica basicamente voltado também para isso, em especial comércio varejista. Hoje a gente tem um comércio forte, que tem tudo que precisamos, mas que ainda carece de melhorar o seu atendimento. E mais uma vez vamos falar sobre qualificação”, relaciona.
Mas o Senac vem buscando soluções para essa situação. “Escuto muito os empresários fazendo essa reclamação de falta de mão de obra qualificada. E isso vai impactar no nosso atendimento do nosso comércio. Logo, cada vez mais estamos buscando soluções, inclusive abrimos a possibilidade de cursos de gratuidade para o comércio. Cursos que vão começar no segundo semestre, cursos rápidos, ágeis, que tem a intenção de melhorar a qualidade do atendimento do nosso comércio”, traz.
Bento Gonçalves
A porto alegrense transformou o Município da Serra Gaúcha em seu lar, desde que passou a viver no local há 10 anos. “Vivemos em uma cidade com características de interior, porém com uma estrutura quase que de capital, já que quase tudo o que se necessita tem. Então, vejo Bento muito melhor do que 10 anos atrás. Gosto que a cidade não se preocupa só com o turista, pois vejo várias iniciativas pensando no seu público local. É uma região que constantemente está preocupada com ações para a comunidade também. Atendo empresas, prefeituras, e percebo isso. Talvez precise melhorar muito, mas quem não precisa?”, esclarece.
Para ela, há diversas qualidades importantes no Município que o tornam ainda melhor. “Nós temos turismo, sossego, uma economia boa, pessoas que querem trabalhar muito e que querem cada vez mais ofertar produtos e destinos para esses turistas. Nós somos um povo acolhedor. E quando digo nós somos, é porque já me vejo de Bento. E acredito que a cidade ainda tem muito mais para avançar”, finaliza.