Guerra entre Rússia e Ucrânia e commodities levam dólar ao patamar dos R$ 4,70
Após uma semana de queda do dólar, na sexta-feira, 25, a tendência permaneceu pelo oitavo dia consecutivo. Às 16h02min, a moeda dos Estados Unidos foi cotada a R$ 4,7521, um recuo de 1,65%. Na última quinta-feira, 24, a queda foi de 0,25%, percentual que fez com que o dinheiro norte-americano tivesse o menor valor frente ao real em dois anos, fechando a R$ 4,8319.
Segundo a coordenadora do curso de Comércio Internacional da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Simone Andrade Klein, há duas razões centrais para as mudanças econômicas. A primeira é o fato de que a Rússia e a Ucrânia estão em guerra. “A Rússia é uma grande fornecedora global de commodities, operando com grãos, trigo, petróleo e carnes. O Brasil é, também, um grande exportador desses itens. Considerando que o país russo sofra restrições e a própria guerra impossibilite que ele mantenha essa condição, abre-se espaço para outras economias, outros países”, explica.
O segundo motivo diz respeito a investimentos, porque há um ano, em março de 2021, a Taxa Selic estava em 2% ao ano, o que mudou radicalmente nas últimas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom). “Agora ela está praticamente 12%, ou seja, aumentou seis vezes. Isso se reflete na atração de investidores internacionais, que buscam maior rentabilidade e acabam ponderando o risco das oscilações e também da instabilidade e da vulnerabilidade financeira, mas colocando seu dinheiro, aqui no Brasil, com vistas a maior retorno”, salienta Simone.
A docente ressalta, ainda, que comparativamente, a taxa de juros brasileira só fica atrás da Rússia. Os investidores, entretanto, entre os mercados emergentes, não colocariam dinheiro lá neste momento, pois buscam segurança. “Isso faz com que o Ibovespa esteja subindo dia após dia, porque os investidores também sabem que as grandes empresas que ocorrem em bolsas são do setor de commodities. O preço em alta tende a favorecer melhores resultados, um retorno financeiro grande para esses empreendimentos”, esclarece.
Para Simone, em linhas gerais, pode-se destacar esse aumento da atração de investidores internacionais para o mercado brasileiro, sobretudo em empresas produtoras de commodities, devido à própria exportação em alta desses itens atrai mais capital estrangeiro. “Existe esse contexto da valorização do real e a crise que faz com que a Rússia fique menos atuante, abrindo espaço para o Brasil em alguns itens”, sublinha.
Queda deve continuar?
De acordo com a professora, a estimativa é que a queda não perdure por muito tempo. Isto porque, nas próximas semanas deve haver um movimento de desvalorização do real de novo. “Talvez dentro dos três próximos meses o dólar volte ao patamar de R$ 5, porque a gente tem no radar algumas projeções, uma delas é o aumento da taxa de juros norte-americana para que eles consigam conter a inflação. Se isso acontece, naturalmente os investimentos internacionais retornam para os Estados Unidos, buscando segurança, estabilidade e rentabilidade um pouco maior”, prevê. Além disso, Simone relata que o mercado brasileiro interno está repleto de incertezas políticas, ainda mais por ser um ano de eleições, que costuma resultar em turbulências e mudanças.
Impactos no consumidor final
Quanto mais a taxa de dólar cai, segundo a docente, isso se reflete no comércio internacional e simboliza um estímulo às importações. Com o dólar no patamar dos R$ 4,80, ela afirma que aumenta a possibilidade de a compra de produtos estrangeiros ser feita com um desembolso menor. “Isso amplia a competição aqui no mercado interno, mais concorrência e, consequentemente, melhora a condição de compra para as famílias. Para o consumidor final, lá no mercado, você ter ali não só um azeite de oliva brasileiro, mas ter um espanhol, português, chileno, argentino, exerce uma pressão dos preços para baixo. Isso é um mecanismo de controle e combate à inflação. Nesse patamar está longe de ser um desestímulo à exportação, pelo contrário, continua sendo uma cotação bem interessante, mantendo a alta produtividade das nossas empresas, gerando emprego e renda para os trabalhadores”, finaliza.
Exportação e importação no Brasil
Conforme o supervisor comercial de exportação de países do Oriente Médio, África e Ásia para a empresa Nutrire Alimentos Ltda, Lorenzo de Paris, em um contexto geral, a queda do dólar para o mercado internacional não está afetando muito a exportação brasileira, pois o mercado externo está aquecido, devido aos últimos anos em que os patamares do dólar estavam acima de R$ 5,00. “Por outro lado, para a importação, a valorização da moeda nacional pode animar os importadores que buscam por produtos estrangeiros. O que temos que levar em conta é a oscilação do real no momento em que vivemos, pois existem inúmeros fatores e incertezas que podem influenciar”, realça.
De Paris comenta, ainda, que economistas ressaltam que, caso a queda for sustentável, haverá um alívio da inflação. “Mas eles também salientam que o aumento de juros dos Estados Unidos e o ano de eleições presidenciais podem estagnar essa tendência”, declara.
O supervisor comercial está, atualmente, na feira ‘Global Pet’, em Orlando (EUA), e declara que para empreendimentos com cultura exportadora, a procura por novos mercados é contínua. “Não podemos somente estar presentes no comércio internacional quando o dólar está favorável, a procura é constante e as empresas precisam ter planos para mitigar a oscilação da moeda norte-americana, pois no Brasil, esse fator sempre irá influenciar as transações internacionais”, observa.
O profissional de comércio internacional também diz que o momento atual é de instabilidade mundial. Para De Paris, todas essas movimentações no mundo acabam influenciando o mercado brasileiro nas questões econômica e comercial. “Porém, mesmo com a queda, o dólar ainda está favorável à exportação, fazendo com que a curto prazo não tenhamos mudança significativas no bolso do consumidor brasileiro. Já a longo prazo, a incerteza de uma moeda estável aumenta, pois estamos em ano de eleições e vai depender muito de qual será o rumo dos problemas políticos e econômicos que o mundo vive atualmente”, reitera.