Com os olhos presos na tela, eu vagava pela Internet, meio robotizada, zonza de tantos brindes e sorrisos virtuais, incapaz de filtrar conteúdos e recusar ofertas, quando me deparei com uma escultura de tirar o fôlego anunciada como artesanato.
Fascinada pelo objeto estético saído de um pedaço de madeira, acordei daquele marasmo. Curiosa, procurei pelo nome do autor que, por alguma razão fora destinado à invisibilidade.
Então me veio à mente uma exposição de pinturas abstratas exibida no Campus, nos anos… Faz muito tempo. Lembro que fiquei parada diante de um quadro pintado a óleo, todo amarelo. Chapado. Arte intangível, espiritual, filosófica, transcendental…?
Fui envolvida pelo amarelo sem fim… e sem linhas, sem tons, sem formas nem movimento. Ele me reportou de um universo a outro. Dos girassóis da Rússia às tardes de domingo, com o Faustão me causando fastio, naquela época pré-colombiana, quando a TV era praticamente um unicórnio, exibindo uma antena com cabelo de Bombril para diminuir o chuvisco nas imagens. Depois fui além… ou aquém, porque me vi no quadro. Eu era o próprio amarelo, uma lembrança tatuada na memória, da hepatite que me tingiu ameaçadoramente. A diferença entre a arte e mim estava nas tonalidades que eu adquirira na evolução da doença.
Enfim, a pintura havia conseguido capturar minha atenção e me provocado sentimentos diversos. Estaria então a obra cumprindo com suas funções e, portanto, poderia ser classificada como arte? Ou seria apenas uma prova de que o autor não tinha o talento necessário para pintar nem coisas concretas, nem abstrações? Ou a intenção dele era apenas fazer um quadro decorativo para uma parede de sua casa que, acidentalmente, acabou exposto numa galeria?
Daí para outro evento artístico que repercutiu muito, elevando os ânimos nas redes sociais – onde a valentia cresce de forma assustadora –, foi um passo. A mostra contava com obras icônicas e com alguns desenhos de autores brasileiros que retratavam sexo explícito, inclusive interespécies. Fiquei me questionando se os quadros tinham valor estético, ou se pretendiam apenas romper paradigmas… E se movimentos de finalidade transgressora como aquele, independentemente do resultado final, seriam sempre manifestações artísticas…
Sem respostas, acabei retornando àquela peça talhada em madeira que, segundo o enunciado, não atingiu o status de arte. Enfim, “O” artista que esculpiu aquela arte com tesão – no sentido de intensidade e arrebatamento – será reconhecido como “Um” talentoso artesão.