Medida que pretende transformar o COMPAHC (Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural) em um órgão exclusivamente consultivo gera debates

No dia 2 de janeiro, o prefeito Diogo Siqueira, encaminhou à Câmara de Vereadores o Projeto de Lei Ordinária nº 01/2025 (PLO nº 01/2025), que propõe a alteração da Lei Municipal nº 4.445/2008, que regula o COMPAHC. A principal mudança é a retirada do caráter deliberativo do conselho, tornando-o apenas consultivo. A justificativa para essa alteração é evitar subjetividades em deliberações recentes. Além disso, ajustes no Regimento Interno serão necessários caso a proposta seja aprovada.

Uma proposta semelhante já havia sido protocolada em 2022 (PLO nº44/2022), pelo vereador Anderson Zanella. Na época, a medida até chegou a ser sancionada pelo prefeito Diogo Siqueira, mas posteriormente, acabou sendo inviabilizada devido a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin).

Posicionamento da Prefeitura
A diretora do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (IPURB), Melissa Bertoletti Gauer assegura que o projeto não afetará a preservação de prédios e patrimônios históricos. “Não modifica nada nesse aspecto. Esses imóveis, paisagens e outros elementos de interesse histórico, estão contemplados no Plano Diretor. Inclusive, a obrigatoriedade das edificações em passar pela análise do conselho está prevista no plano diretor também”, diz.

Ela também reforça o posicionamento da Prefeitura em relação ao projeto. “O projeto de lei foi motivado pela necessidade de corrigir a insegurança jurídica gerada por decisões subjetivas observadas em deliberações do conselho”, afirma.

Melissa destaca que o Município entende que a proposta está em conformidade com o Estatuto da Cidade, uma vez que o Plano Diretor e seus anexos 5.3 e 5.4 estabelecem critérios claros para a preservação do Patrimônio Cultural e definem os procedimentos necessários, incluindo o encaminhamento ao Conselho.

A diretora do IPURB finaliza reconhecendo o “papel fundamental do IPHAN na preservação de bens culturais de relevância nacional”.

Atualmente, o Plano Diretor contempla como patrimônios tombados seis edificações na área central: Igreja Matriz de Santo Antônio, Antigo Banco da Província, Antigo Banco Meridional, Prédio da Prefeitura Municipal, Antigo Tabelionato Garcez e a Igreja Metodista; além do Museu do Imigrante, no bairro Planalto; e da Casa Merlin, no distrito de São Pedro. A cidade também conta com diversas construções inventariadas pelo IPHAN; e áreas destinadas à preservação da paisagem natural, e da paisagem ferroviária.

Antiga estrutura do Tabelionato Garcez e prédio Prefeitura Municipal estão entre os patrimônios tombados no município

Conselho do COMPAHC repudia o projeto
O projeto não agradou os conselheiros do COMPAHC, que divulgaram uma carta aberta com posicionamento contrário ao PLO.

De acordo com a carta divulgada, a mudança pode impactar a forma como as decisões sobre o patrimônio histórico e cultural do município são tomadas. Eles argumentam que o Estatuto das Cidades (Lei nº 10.257/2001) prevê a gestão democrática do planejamento urbano, com participação de órgãos colegiados. A carta destaca que o COMPAHC é composto por representantes do poder público e especialistas da área, que atuam na preservação da memória e do turismo local.

Os membros do conselho também apontam a ausência de diálogo prévio com o órgão antes do envio do projeto e defendem a realização de debates técnicos ou audiências públicas sobre o tema. Além disso, questionam a justificativa de que o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) seria exclusivamente consultivo, afirmando que sua atuação envolve análises técnicas fundamentais para a preservação cultural.

A carta solicita que a proposta seja discutida amplamente antes da votação e reforça a importância do conselho na preservação do patrimônio do município, ressaltando seu papel na manutenção da identidade histórica e turística da cidade.

Posicionamento do chefe do Legislativo
Anderson Zanella, presidente da Câmara Municipal de Vereadores de Bento Gonçalves, comenta sobre o andamento do projeto. “Seguirá o rito legislativo padrão e será encaminhado às Comissões Permanentes para análise. Caso o projeto seja considerado apto, será incluído na Ordem do Dia para discussão e votação”, esclarece.

Ele também ressalta. “Cabe destacar que, na qualidade de Presidente do Poder Legislativo, não exerço direito de voto nas deliberações e somente votarei em caso de empate durante a votação do projeto na sessão”, cita.

Contudo, Zanella relembra que anteriormente já havia protocolado uma proposta semelhante. “Vale lembrar que, em 2022, protocolei um pedido para que o Conselho fosse transformado em consultivo. A proposta foi aprovada, mas, infelizmente, foi inviabilizada devido a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), que questionou um vício de iniciativa — ou seja, a proposição de um projeto de lei que, por sua natureza, deveria ser iniciada exclusivamente por um dos Poderes, mas foi apresentada por outro”, lamenta.

O presidente da câmara reforça seu posicionamento. “Sou favorável à transformação de todos os conselhos, que não sejam criados por exigência de lei federal, em órgãos de caráter consultivo. Acredito que, quando já existem órgãos competentes para deliberar sobre determinados temas, não há justificativa para a manutenção de conselhos com poder de decisão”, afirma.

Zanella finaliza, também reforçando que a proposta não impactará a preservação patrimonial. “Importante ressaltar que essa medida não compromete a proteção do patrimônio histórico, que continua sendo preservado e resguardado por legislação federal específica. Não há qualquer intenção de permitir a destruição, alteração ou modificação de bens históricos protegidos por lei”, encerra.

A solicitação para acompanhar o andamento do projeto pode ser feita por qualquer cidadão no site da Câmara de Vereadores de Bento Gonçalves. Atualmente, a proposta está em tramitação. Apesar da repercussão mista, ela não é classificada pela câmara como uma matéria polêmica.

A próxima sessão da Câmara é nesta segunda-feira, 10, onde no decorrer, o projeto deve ser votado.

Imagens: Augusto Arcari