A volta às aulas presenciais tem sido um assunto polêmico e recorrente, desde que o governador Eduardo Leite informou, por meio de transmissão ao vivo em sua rede social, o novo calendário de retorno.
De acordo com o Governo do Estado, os primeiros a retornar seriam os estudantes da Educação Infantil, em 31 de agosto. Os demais níveis seriam em setembro: Ensino Superior, dia 14; Médio e Técnico, 21; anos finais do Ensino Fundamental no dia 28 e os anos iniciais a partir de 8 de outubro. Segundo a proposta, somente as regiões com bandeiras amarela ou laranja poderiam seguir essas datas.
A professora e vice-diretora na Escola Estadual de Ensino Médio Imaculada Conceição, Rita da Silva, afirma que a maioria dos professores com quem tem contato não acredita que seja o momento de retornar. “Nós temos vários fatores que influenciam nessa tomada de decisão, muitos profissionais no grupo de risco, poucos funcionários na escola e não recebemos ainda as verbas para comprar o material de proteção”, aponta.
A vice-diretora explica que o risco é tanto para os educadores, quanto aos estudantes. “Penso no caso dos professores de área, que circulam entre salas durante um turno. Pela manhã, entram em quatro salas e têm contato com vários alunos. Se esse professor testar positivo, as turmas inteiras terão que entrar em quarentena, e os familiares em isolamento”, explica.
Além disso, os usuários da plataforma online de ensino, segundo Rita, já estão adaptamos ao novo método. “Não é o caso de nos colocarmos em risco, o sistema híbrido está funcionando. Começamos no final de junho, nos apropriamos da ferramenta. A gente posta as aulas, os alunos respondem, fazemos lives explicando o conteúdo, atendemos pelo celular. Na verdade, a escola está dentro da casa de cada professor de uma forma mais segura. Se voltarmos agora vai ser um experimento insano, já estamos adaptados”, argumenta.
Apesar de sentir falta do contato com os alunos, a professora acredita que manter o distanciamento é o mais importante, no momento. “Prefiro estar na sala de aula, olho no olho, atendendo, auxiliando, interagindo. Está sendo mais difícil para mim trabalhar assim, mas é a forma mais segura”, argumenta Rita.
Além do receio dos professores, os pais também estão com medo de permitir que os filhos vão à escola. A fisioterapeuta Martiele Fachi da Costa decidiu que não vai deixar o filho participar das aulas, caso realmente retornem dia 31. “Tanto eu, quanto meu marido achamos que não é o momento para voltar, pensamos que se lá em março, quando nem tinham casos de covid-19 na cidade, as aulas foram canceladas como forma de prevenção, como vamos abrir as escolas no momento em que nossa cidade continua com alto índice de contaminação?”, indaga a mãe.
Martiele afirma também que todos apenas terão segurança quando a vacina for descoberta e as crianças se imunizarem. “Esse vírus está por todo lugar, não temos controle dele. Nós, adultos, que sabemos usar todas as formas de prevenção, ainda estamos sujeitos a nos contaminar. Não existe como estar 100% protegido, o tempo todo. Imagine as crianças”, observa.
A dona de casa Natani Calvi explica que, apesar de ter confiança na diretora e professoras da escola na qual o filho estuda, não há chances de permitir que a criança vá às aulas antes de tomar a vacina. “Nenhum lugar onde tenha aglomeração de pessoas está sendo seguro. Qual a criança que irá ficar com uma máscara no rosto durante um turno inteiro, ou não vai levar as mãos nos olhos, boca e nariz? Como os professores vão conseguir controlar uma turma inteira?”, questiona a mãe.
Além disso, Natani afirma que não compreende o motivo de a Educação infantil ser a primeira a retornar. “As crianças menores não têm noção do que é um distanciamento”, conclui.
A análise preliminar da pesquisa online desenvolvida pelo Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS), “Educação e Pandemia no RS”, aponta 1,7 mil direções, educadores, mães, pais e estudantes participantes. Destes, 86% responderam que não acham possível retomar as aulas antes do advento e disponibilização de uma vacina eficar contra a Covid-19. 6% responderam que é possível, e os demais não souberam responder.
Os dados foram consolidados pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Famurs não apoia volta às aulas
A Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) reafirmou em reunião por videoconferência nesta quarta, 19, com o Estado, Ministério Público (MP) e Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS), a posição contrária sobre o calendário escolar que o governo do Rio Grande do Sul propôs.
A Federação aconselhou, ainda, que neste momento o Executivo estadual não deixe aos prefeitos a responsabilidade sobre a decisão de acatar o cronograma. Se a decisão ficar a cargo do governo do RS, as cidades gaúchas poderão ou não adotar medidas mais restritivas sobre o retorno das aulas.
A secretária de Saúde, Arita Bergmann, afirma não haver previsão de queda dos números da doença. Entretanto, a Farmurs sugeriu que o debate sobre a retomada das aulas seja dado quando o número de casos da covid-19 diminuírem.
Para que as escolas privadas de Educação Infantil não fiquem desamparadas, a Federação sugeriu que o Banrisul disponibilize uma linha de crédito para financiamento com juros subsidiados até o fim do ano.
“A posição da entidade, neste momento, é de inviabilidade. Nós temos uma preocupação com o risco que alunos e professores irão correr, não há notícias de diminuição de casos para as próximas semanas e inúmeras questões práticas que preocupam os gestores, como transporte escolar e contratações”, explicou o presidente da Famurs, Maneco Hassen.
Prefeitos não apoiam calendário do Estado
Se a decisão de volta às aulas ficar a cargo dos prefeitos, não haverá retorno tão brevemente.
Em pesquisa realizada pela Famurs com 442 gestores de cidades gaúchas, 93,73% afirmou não achar o momento viável para o retorno das aulas, conforme calendário proposto pelo governo do RS. Este contingente representa 418 do total questionado.
A maioria, ainda, também acredita que o retorno deve ser apenas após a vacina. Além disso, apenas 5,72% acredita que devem voltar primeiro as crianças da Educação Infantil.