Com o ‘veranico’ de julho, floração dos pessegueiros iniciou de 10 a 15 dias antes do período normal. Caso ocorra geada, é possível que os agricultores percam os frutos e tenham prejuízo
A agricultura e as condições climáticas andam juntas. Além da uva, todas as demais culturas dependem da temperatura para se desenvolverem bem, até chegarem à mesa dos consumidores. Em Pinto Bandeira, a Capital Estadual do Pêssego de Mesa, e em outras regiões próximas, o ‘veranico’ em julho causou preocupação aos agricultores.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores Familiares de Bento Gonçalves, Monte Belo do Sul, Santa Tereza e Pinto Bandeira, Cedenir Postal, destaca que o calor antecipado é realmente preocupante. “Os agricultores estão todos apavorados. O problema é uma geada depois que a brotação já estiver em andamento. O pêssego vai ser atingido se acontecer isso nos próximos dias”, aponta.
O viticultor e enólogo da Emater, Thompsson Didoné, afirma que a cultura do pessegueiro está presente também em Bento Gonçalves, Monte Belo, Farroupilha, Caxias do Sul, Campestre, São Marcos, Antônio Prado, Flores da Cunha e Veranópolis. “Na Capital do Vinho a gente tem em torno de 130 hectares plantados de pêssego, sem contar ameixa”, menciona.
Didoné salienta que as árvores de pêssego, este ano, floresceram de 10 a 15 dias antes do período normal. “Isso ocorreu por conta, primeiramente da seca e, depois, pela diminuição do frio, este veranico que aconteceu. Nesta semana, a maioria dos pessegueiros de ciclo precoce, super precoce e ciclo médio estão florescidos ou em plena floração, e os de ciclo tardio ainda estão em inchamento de gema”, explica.
O chefe do escritório da Emater em Bento sublinha que o pessegueiro emite primeiro a flor, e depois vêm o fruto e as folhas. “Cuidados especiais que a gente chama atenção agora é em relação a doenças que são provocadas pelo vento frio, como é o caso da crespeira verdadeira, e também, é recomendável que se faça o controle de uma doença fúngica chamada podridão parda”, aconselha.
Sobre a qualidade dos frutos, Didoné frisa que a floração está muito bonita. “Porém, a gente sempre fica naquela dúvida de que se a gente tiver frio tardio, possa ocorrer algum prejuízo”, expõe.
Panorama em Pinto Bandeira
O prefeito de Pinto Bandeira, Hadair Ferrari, ao falar sobre produção deste ano, frisa que o clima está sendo um pouco diferente dos outros anos. “Agora já está começando a brotar tudo. Com esse calor a fruta vem antes. Nas árvores de pêssego precoce, o pessoal já está esvaziando, estão tirando do pé o que tem em excesso para poder ter uma melhor qualidade da fruta e que ela venha mais graúda”, relata.
Por outro lado, Ferrari esclarece que tem outras variedades que ainda estão com a flor da fruta, que é a maioria. “Temos que rezar a Deus que não dê geada, porque se der vai ser ruim para quem lida com essa cultura. Se gear, congela a flor, ela cai e não vem o pêssego”, sublinha.
O chefe do Executivo pinto-bandeirense esclarece que, na cidade, há aproximadamente 1.100 hectares plantados e a média de produção fica em torno de 18 milhões de quilos de pêssego. A tendência, entretanto, é superar as expectativas. “O pessoal está investindo cada vez mais. Nós da prefeitura, por exemplo, estamos tendo uma demanda gigante, porque temos uma parceria com o agricultor. Fornecemos 60% do custo das horas-máquina (retroescavadeira e trator), e o agricultor paga 40%”, ressalta.
Neste ano, prefeitura vai investir R$ 800 mil na agricultura e, a maior parte desse investimento, é voltada para limpeza ou automatização. “Como no ano passado a gente investiu muito também, a produção do pêssego tende a crescer cada vez mais. Se não tiver geada, vai dar uma superprodução”, acredita.
Na pele dos agricultores
O agricultor de Pinto Bandeira, Leandro Ferrari, destaca que a expectativa para a safra é sempre boa, mas também anda preocupado com a brotação antecipada. “É perigoso que a gente tenha problemas com esse adiantamento da floração. Esse calor está em torno de 15 dias adiantado”, reitera.
A princípio, o produtor prevê que será uma safra normal, com bastante frutos. “Para nós a colheita começa no finalzinho de outubro e início de novembro e vai até 15 de janeiro”, acrescenta.
De acordo com o agricultor de São Pedro, interior de Bento Gonçalves, Rene Cozak, a expectativa para a safra deste ano é excelente se as condições climáticas continuarem favoráveis. “Mas, como a agricultura conta muito com o fator ‘tempo’, a gente tem até receio de falar. Há dois anos atrás tudo se encaminhava para uma boa safra e no dia 20 de agosto deu uma geada e ocorreu um grande prejuízo”, lembra.
Ele afirma que o frio intenso de maio e junho e o calor de julho fez com que as plantas saíssem da dormência. “Teve variedades de pêssegos que brotaram até 20 dias antes do normal. Com essa umidade, se ocorrer geada, por mais que a temperatura seja positiva, a perca pode ser grande. Agora é rezar para que o tempo fique nublado ou que tenha vento, mas há bastante preocupação”, relata.
Cozak também menciona os custos elevados de produção deste ano, que o fazem querer ainda mais que a safra seja boa, para recuperar ao menos uma parte daquilo que investiu. “Chega a estar 30% mais caro que no ano passado. Quando a gente vai vender a fruta, geralmente não ganhamos o valor para, pelo menos, cobrir o custo de produção. O que mais dói hoje é ver a população pagar R$20 no quilo de um pêssego importado e ‘chorar’ para pagar R$ 5 ou R$ 6 no nacional. Vários fatores fazem com que a gente pense se continua ou se para”, pensa.
Previsão climática é desfavorável
A meteorologista Ludmila Pochmann realça que a preocupação dos agricultores é totalmente coerente. “Após vários dias de um bloqueio atmosférico, uma frente fria chegou ao estado, provocando temporais. Atrás dela vem uma grande massa de ar frio polar que vai, nos próximos dias, derrubar as temperaturas em todo o Rio Grande do Sul. As mínimas vão chegar a 0ºC e isso é um panorama muito propício para a ocorrência de geada”, evidencia.
Fotos: Thamires Bispo