Setor industrial é onde os empregados permanecem por mais tempo na empresa
Apesar de Bento Gonçalves ter registrado uma alta no número de empregos formais em novembro de 2024, a dificuldade em preencher vagas continua sendo um desafio. Com mais de 507 vagas, sem pretendentes, disponíveis, o comércio, a indústria e o setor de serviços lidam com a falta de mão de obra qualificada e a alta rotatividade de trabalhadores. Para entender as razões para esse fenômeno e quais soluções estão sendo buscadas, a reportagem do Semanário levantou os dados pertinentes de cada setor, e conversou com algumas das principais lideranças de Bento Gonçalves, e instituições que oferecem cursos técnicos para especialização de mão de obra, que compartilharam seus pontos de vista a respeito.
Cenário atual
Carlos Lazzari, presidente do Centro da Indústria, Comércio e Serviços (CIC-BG), reflete acerca da situação atual do mercado de trabalho em Bento. “Estamos vendo um momento de aquecimento nas atividades econômicas do nosso município, em especial, pelo fato que a economia local não é concentrada em poucos segmentos, mas sim em uma grande diversificação de atividades econômicas, o que gera uma alta demanda de oferta de trabalho”, debate.
Ele decorre. “As empresas estão em busca de profissionais que atendam às especificações e exigências das vagas abertas, mas infelizmente, ainda não há um número insuficiente de pessoas preparadas para preenchê-las. Essa é uma realidade já conhecida e um desafio contínuo que estamos trabalhando para superar, por meio de programas de capacitação como o ‘Qualifica Bento’, por exemplo”, diz.
Perfil do trabalhador que busca emprego em Bento e disponibilidade de vagas
Vanderlei Alves de Mesquita, coordenador da Agência da Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social (FGTAS/Sine), detalha qual o perfil do trabalhador que busca auxílio na agência. “Geralmente é o que trabalha no setor primário, de produção em fábricas, de transportes, normalmente como auxiliar ou motorista e setor hoteleiro (camareiras e cozinheiras, setor hospitalar higienizadores, camareiros, recepcionistas, cozinheiros, frigoríficos, corte e separação de carnes)”, destaca.
Ele continua, explicando os fatores que ocasionam alta demanda e pouca mão de obra. “Nesta faixa de mercado, entendo que a distância dos locais de trabalho bem como salários baixos tem feito o mercado estar com muita oferta e pouca mão de obra, hoje estamos com 507 vagas em aberto, sem que haja pretendentes”, pontua.
Mesquita detalha a situação das vagas. “Há 50 para profissionais com ensino médio, e essa também é uma faixa em que temos dificuldades para preencher, sendo que inclusive temos convênio com a secretaria de educação, Sesi e Senac para a conclusão do ensino médio. Os setores mais afetados são os já citados: empresas de móveis, supermercados, transportadores, frigoríficos, ou seja, setores básicos e de produção. Hospitais e hotéis também”, ressalta.
Ele encerra pontuando as políticas adotadas pela agência para que as vagas de emprego sejam preenchidas. “Mantemos diariamente contato com empresas da cidade e região bem como disponibilizamos local para entrevistas na nossa agência, além disso realizamos feirões de emprego na nossa agência e em outros locais, inclusive em parceria com o Poder Público Municipal”, finaliza.

Situação no setor comercial
Daniel Amadio, presidente do Sindicato do Comércio Varejista (Sindilojas) Regional Bento, esclarece seu ponto de vista a respeito da dificuldade para o preenchimento de vagas no mercado de trabalho. “Minha visão quanto a isso é que faltam candidatos jovens para inserção no mercado. O perfil deles é diferente por se preocuparem mais com os estudos do que propriamente ingressar logo no trabalho. Por outro lado, com as oportunidades aumentando mais que o surgimento de candidatos, o mercado fica com poucas opções”, frisa.
Amadio também projeta 2025, e detalha os fatores que enfraqueceram o mercado de trabalho. “Devido aos fatos climáticos ocorridos no ano que passou, muitos postos de trabalho fecharam, pois o comércio foi afetado diretamente ou em sua maioria, indiretamente, pois os consumidores se retraíram em gastar, preocupados com a situação. A tendência para 2025 é a reabertura de vagas e quem sabe se a economia colaborar, o aumento de oportunidades de colocação para o trabalho. Cabe a todos buscarem maneiras de trazer profissionais para o mercado e também em paralelo, a utilização da tecnologia disponível onde possa ser aplicada para que o negócio continue crescendo”, diz.
No relatório do CIC-BG, divulgado em 8 de janeiro, alguns setores do comércio destacam-se com saldo positivo, com mais admissões do que desligamentos novembro de 2023 e 2024: Supermercados (+61), Atacado Máquinas e Aparelhos Equip. (+31), e Cosméticos e Perfumaria (+26); entre os com mais demissões do que admissões, estão: Móveis, Colchões e Iluminações (-21), Produtos Farmacêuticos (-14); e Livros, Jornais, Revistas e Papelaria (-13).
No geral, no período citado, o comércio registrou 5.115 admissões e 5.089 desligamentos; um saldo positivo de 26, e uma taxa de rotatividade de 5,6%; o mês com o maior número de admissões registradas foi abril de 2024, com 515; julho de 2024 foi o período com o maior número de dispensas no setor comercial: 484.
Marcos Carbone, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL-BG), analisa o cenário atual do setor. “O comércio em Bento Gonçalves tem se mostrado uma excelente oportunidade de carreira para muitos profissionais. Embora algumas pessoas ingressam no setor como o primeiro emprego, muitas delas acabam construindo uma carreira sólida no comércio, devido às diversas possibilidades de crescimento dentro desse segmento”, pontua. Carbone segue. “O comércio local oferece oportunidades de desenvolvimento profissional, seja em cargos de vendas, gestão, ou até mesmo na área de logística, o que mantém uma parte significativa da força de trabalho no setor. A dinâmica do comércio, com sua proximidade com o público e a variedade de funções, atrai trabalhadores que veem nesse setor uma carreira com oportunidades de estabilidade e crescimento”, afirma.
Segundo os dados do CIC-BG, o período onde houve o maior saldo negativo entre admissões / desligamentos no setor comercial de Bento, foi em dezembro de 2023, -100. Carbone destaca. “A sazonalidade é um fator natural no comércio, especialmente em períodos como o Natal, mas não acredito que ela seja um grande obstáculo para a retenção de funcionários”, reitera.
Ele também ressalta que muitos funcionários contratados temporariamente para a época de festas de fim de ano, acabam sendo efetivados. “Devido à escassez de mão de obra, muitas empresas tentam reter os profissionais que contratam durante essas datas, porque sabem da dificuldade em encontrar trabalhadores qualificados para manter suas operações o ano todo. Além disso, muitos dos profissionais que começam em datas sazonais acabam sendo efetivados, pois o setor exige mão de obra constante”, conta.
Rotatividade no mercado de trabalho
Amadio compartilha sua visão sobre o que poderia ser feito para manter o empregado por mais tempo na empresa. “Não há indicadores que o comércio seja o setor com a maior taxa de rotatividade de funcionários. Outros setores também sofrem com isso, principalmente pelo perfil dos novos profissionais que chegam ao mercado. Porém estamos sempre buscando uma negociação da Concessão Coletiva de Trabalho (CCT) condizente com a realidade e buscando valorizar o profissional para que ele permaneça no emprego por mais tempo, ao mesmo tempo estamos organizando formas de divulgação das vantagens de trabalhar no setor, motivando com isso sua contratação ou mesmo permanência conosco”, enfatiza.
O relatório do CIC-BG, aponta que o tempo médio de um trabalhador empregado em Bento Gonçalves é de 16,5 meses; número que está abaixo da média nacional (18,5 meses) e da média estadual (18,9 meses).
Em Bento, no saldo de empregos acumulados em 2024, o setor com a situação mais crítica é o da Agropecuária, com uma variação de -212,6% no comparativo de 2023 / 2024. Este setor, também é o com a menor média de permanência de um funcionário empregado: 1,4 mês.
O setor onde os empregados permanecem por mais tempo, é o industrial: 19,7 meses; e o com a maior variação positiva 2023 / 2024 é o de construção: 659,5%. O comércio encontra-se em um meio termo, depois da Agropecuária, é o com a menor duração do vínculo empregatício de um funcionário: 12 meses; e ocupa a terceira posição na taxa de rotatividade: -29,2%.
Carlos Lazzari, presidente do CIC-BG afirma. “Para reter talentos, é fundamental que as empresas invistam em programas pertinentes, como por exemplo benefícios flexíveis entre outros, onde os profissionais possam escolher aquilo que vem mais ao encontro de suas necessidades”, destaca.
Ele também ressalta. “Além disso, a oferta de benefícios competitivos, oportunidades reais de crescimento e qualificação contínua são essenciais. Quando o profissional vê que há perspectivas de evolução na carreira e que ele está sendo valorizado, a tendência é que ele se mantenha na empresa por mais tempo, reduzindo a rotatividade”, avalia.

Setor industrial
Setor com a maior média de permanência de funcionários, é o que apresenta o maior saldo positivo no número de admitidos / desligados entre novembro de 2023 e 2024, 950; é também o que mais contratou (10.566) e mais demitiu (9.616) trabalhadores no período analisado, o que lhe confere uma taxa de rotatividade de 4,4%.
O sub-setor com o maior saldo, é o moveleiro, +534; com destaques também para o de Máquinas e Equipamentos (+137) e Produtos de Metal (+123). Nos negativos, encontram-se: Metalurgia (-18); Couro e seus Artefatos (-8) e Extração de Minerais Não-Metálicos (-4).
Cíntia Weirich, presidente do Sindmóveis-BG, detalha o cenário atual do setor moveleiro. “Neste momento a expectativa é de reposição de vagas, ou seja, não exatamente crescimento no saldo geral de empregos. Precisamos entender como o mercado vai andar durante o ano. Custo de matérias-primas e logística; tributação, e consumo no varejo são alguns dos fatores que influenciam diretamente no desempenho das indústrias e consequentemente, na geração de empregos”, afirma.
Ela assegura as mobilizações do setor para especialização dos empregados. “Profissionais com experiência prévia tendem a ganhar prioridade nas mais diversas funções, mas as indústrias do polo também costumam dar oportunidade a quem está iniciando no setor. O programa Qualifica Bento, do CIC, e o Senai, por exemplo, oferecem cursos de capacitação relevantes. Neste momento o Senai está com inscrições abertas para o curso técnico especializado em produção moveleira, que é uma excelente oportunidade para quem busca desenvolver a carreira no setor”, afirma.
Cíntia finaliza destacando que o tempo de permanência na empresa é relativo. “Depende caso a caso. Fatores como cultura organizacional, plano de carreira e relação do RH com os colaboradores podem refletir na permanência dos funcionários nas empresas. Vale destacar que o perfil das novas gerações também mudou, no sentido de não se estender por muitos anos no mesmo emprego”, encerra.
Cursos técnicos para aprimoramento da mão de obra
O SENAI destaca quais cursos possuem a maior demanda em Bento Gonçalves. “Os mais procurados são da área da metalomecânica, principalmente os técnicos em Eletromecânica e Mecânica. Além disso, cursos profissionalizantes de soldagem, torneiro mecânico e eletricista também figuram entre os mais buscados”, diz o SENAI.
O instituto também ressalta o que é ofertado para especialização no setor moveleiro. “Nosso principal curso nesta área é o Técnico em Móveis, com nova turma prevista para iniciar em 24 de fevereiro. Além deste, temos Leitura e Interpretação de Desenhos de Móveis, Metrologia Aplicada à Fabricação de Móveis e Tecnologias e Processos Aplicados à Fabricação de Móveis”, pondera.
Por fim, o SENAI faz um chamado. “Temos parcerias com todo o setor industrial. Dessa forma, funcionários de empresas têm 10% de desconto em nossos cursos”, indica.
A CDL também dispõe cursos para especialização, no setor comercial. O presidente Carbone destaca: “Para 2025, temos trabalhado em diversas iniciativas para qualificar e atrair novos trabalhadores. A nossa grade de cursos e qualificações continua a ser uma ação permanente, tanto para os donos de empresas quanto para os profissionais que atuam no setor. As qualificações oferecidas abrangem uma ampla gama de áreas, como atendimento ao cliente, gestão de vendas, e até mesmo cursos voltados para o uso de novas tecnologias no comércio”, reforça.
Lazzari, presidente do CIC, também reforça a importância de cursos especializantes. “Estamos trabalhando fortemente junto ao SENAI, na ampliação dos cursos, sensibilizando a classe trabalhadora em conjunto com os empresários, para que incentivem seus colaboradores para se qualificarem”, garante.
Ele também explica onde está o foco. “Em áreas chave, como a indústria metalmecânica, moveleira, elétrica e de tecnologia, essenciais para o crescimento econômico de Bento Gonçalves.”, afirma.
Reportagem: Augusto Arcari