Onde deixamos para trás a simplicidade do pouco e a beleza do simples? Cadê os aniversários em casa, com cajuzinhos enrolados nas mãos, torta grande e quadrada, refrigerante de garrafa, chapeuzinho de papel e convite feito à mão? Onde foi que paramos de enfeitar nossas casas com as luzes de Natal, de dar uma moedinha para as crianças no Ano Novo, de ir à igreja, de ter porta-retratos nas estantes e cores e flores espalhadas pela casa? Onde foi que trocamos as roupas simples para a academia por roupas caras, de marcas que nem podemos pagar? Onde estão os Fuscas, Opalas, Chevetes, que agora parecem desaparecer? E os discos, CDs, DVDs, aqueles que eram parte da nossa vida? E as lembranças do Orkut? Tantas comunidades, perfis que mostravam o quanto éramos amigos, como éramos considerados especiais, com depoimentos de quem nos amava.
Onde foi que deixamos de ter filhos por medo do trabalho, mas humanizamos demais os animais? Onde perdemos a autoridade como pais e nos tornamos permissivos, quase submissos aos nossos filhos? Onde foi que deixamos de lado a fé, de acreditar em coisas simples, e nos tornamos sábios de tudo, mas vazios de essência?
Onde se perdeu a admiração pelas coisas simples da vida? As férias são agora em Jurerê ou na Disney, brinquedo precisa ser caríssimo e as roupas, sempre de marca. Cadê as costureiras da nossa época? O “não” virou sinônimo de frustração, e ninguém pode mais se frustrar. Tudo é bullying. Se algo não me agrada, eu saio. Se alguém pensa diferente de mim, brigo. Se a pessoa não estudou, teve um passado difícil, prefiro me afastar. A hipocrisia tomou conta.
Perdemos o prazer de brincar na rua, de explorar a natureza. No lugar disso, avançamos para o celular, e com ele, nos perdemos. Poucos amigos, muitos seguidores. Pouca realidade, muito fake. Será que não podemos pensar fora da caixa?
A essência das pessoas se tornou pouco valorizada. Hoje, querem saber sua profissão, onde mora, o carro que tem. É o famoso “De chi sito fiol?” de antigamente. Perdemos o que realmente tinha graça. O filó ao redor da mesa à noite, as cartas jogadas entre risos, a simplicidade da vida. Perdemos as receitas da vovó porque já não sabemos mais cozinhar. Máquinas fazem tudo por nós, o cérebro quase não precisa mais pensar. Muita informação, pouco conhecimento, e quase nenhuma crítica. Todo mundo sabe de tudo. Mais que o médico, mais que o professor. Nos formamos no Google. E, assim, o viver no presente parece um peso.
Eu trocaria tranquilamente essa era por alguns anos atrás. Anos 90, talvez. A escola era pública, os amigos eram da rua. Ser rico era ter uma piscina de mil litros e um Nintendo em casa. Eu nunca tive isso, mas não havia problema. Eu tinha a mãe que ficava em casa, o pai que jogava bola comigo, o irmão que me ajudava com a escola, avós que moravam ao lado, cachorros, parentes na colônia. Isso era minha maior riqueza.
Pobre é quem pensa que ser rico é outra coisa. Na ilusão de ganharmos, perdemos e muito do que realmente importa. Não conseguimos transmitir os valores que recebemos, temendo que isso gere traumas, sem entender o que a falta de valores e limites pode causar. Tem gente que é tão pobre que a única coisa que tem é dinheiro. Onde foi que nos perdemos?