É como ir à praia em dia nublado. Está tudo cinzento, ameaçando chover, mas a água continua azul. Não se trata do chocolatão de Tramandaí ou de Imbé. É feito o mar do Caribe, quilômetros de azul turquesa que, em certo ponto, fica verde esmeralda. Tem coisa mais linda?
Então a gente coloca o dedão do pé na água pra sentir a temperatura e não sofrer qualquer colapso. Vai experimentando devagarinho, sentindo as vibrações, ousando mais um pouco, porque a vigilância é implacável e as recomendações são inquestionáveis: “Vovós, não saiam do seu quadrado!” Mas já fora do quadrado, a gente sente que o marzão está uma delícia e então coloca o pé todo até afundar na areia, depois entra até a canela e, quando vê, se mergulhou de cabeça. E a gente se enche de luz!
Pronto! Aconteceu! Depois de meses de separação, deu-se o abraço. Com máscara, sem máscara, com álcool gel, sem álcool gel… E tudo volta ao normal… Quase tudo!
Na verdade, nada é como antes. Nesse período de ausências, muita coisa mudou. Cada vovó percebe que seus dengues já passaram pela fase do “guti-guti”. As meninas substituíram as brincadeiras melosas por aventuras mais dinâmicas, pois galgaram outro nível na escala evolutiva social. Os meninos se achegaram a super-heróis vingadores, ninjas, vilões, zumbis e estranhos desenhos tipo Drongo e Mongo…(Onde foram parar os inesquecíveis Faísca e Fumaça?). As coisas mudam rápido demais. Não se pode perder de vista o mar e seus mistérios…
Dia desses, procurei descobrir as preferências atuais do menininho de cinco anos e meio ano que me chama de “vó”. E ele me contou que adora desenho animado de terror, mas que não era pra eu assistir, senão me assustaria. Me segredou que, na casa de um amiguinho, a dupla fugiu da vigilância materna, se escondendo dentro de um guarda-roupa pra ver uma historinha dessas. E me recomendou que eu não fosse dedo duro.
Depois, em momento de concentração no “trono”, o reizinho passou a refletir sobre questões existenciais. Disse estar triste por não ter conhecido a bisa (eu havia feito uma referência à minha mãe), e deixou cair uma lágrima… Tentei desviar o assunto, mas ele já o havia linkado a outro, em que, certa vez, se aconchegara e dormira no colo do tio-avô, agora falecido. E mais duas lágrimas rolaram pela face do pequeno. Confessou que não gostava “muito, muito, muito do papai do céu”, porque ele havia levado embora seus afetos.
A pureza das crianças! Naquele momento compreendi a amplitude da fala de Jesus: “Vinde a mim as criancinhas!” E “mergulhei no mar” outra vez…