O pecadilho invariavelmente presente nas confissões da infância tinha a ver com “nomes feios”. A penitência – um pai-nosso e uma penca de ave-marias – era o álcool/gel espiritual da época. A gente saía da igreja com a alma higienizada, mas assim que afrontados, nova saraivada de palavrões nos escapavam, mesmo estando sob a jurisdição divina. E o velho confessionário, que ficava próximo aos bancos onde a ala mais curiosa ajoelhava, nos recebia outra vez, num círculo vicioso, como é a vida.  

Mas aí concluímos o quinto ano. Nova etapa da nossa ainda curta existência exigia decisões radicais. No meu caso, um ônibus apinhado de gente, que me torturou por três horas e meia, selou meu destino: aqui cheguei e aqui fiquei.

Obviamente os nomes feios foram varridos do meu cotidiano, mas as celebrações e rituais religiosos não, até porque um dos objetivos do colégio de freiras era manter as internas na linha, senão o capeta pegava.

Então chegou o dia “D”, e, na hora “H”, fomos à Igreja Matriz. (Para quem já conhece a história, por favor, ria de novo!) Estava eu com toda a minha experiência religiosa (tinha feito a Primeira Eucaristia aos seis anos e meio) na fila dos pecadores arrependidos. Enquanto aguardava, fiquei intrigada com o tempo de confissão das minhas colegas. Imaginei, com uma pontinha de inveja, que elas eram veteranas na “arte de pecar”. Fiquei preocupada. Se eu não listasse algumas transgressões, seria um “vapt  vupt”, que me deixaria mal diante delas, mas nada me vinha à cabeça.

 E chegou a minha vez. Não estava pronta, por isso tive de improvisar com orações decoradas durante o catecismo. Parei um instante para ouvir a voz do padre. Nada. Fui tocando em frente como o Almir Sater… Mas eu não conhecia as manhas. Então parei. Que merda era aquela? Sorri. Tinha pensado num nome feio pra confessar. De repente, uma portinhola se abriu. Só então, senti a presença do sacerdote e entendi o esquema. O confessionário abrigava dois penitentes de cada vez, um em cada lado. E o confessor se virava de um lado pra o outro, abrindo e fechando as portinholas.

Belo truque!

Repeti tudo que nem papagaio e com repentina pressa. Queria zarpar logo daí, porque os corpos cetônicos da respiração, liberados pelas longas horas de jejum do confessor, se propagavam através dos furos da janelinha.

Ufa! Bafo quente é de amargar.