Em 30 de junho deste ano, Maristela Carvalho deu vida à Ethiane novamente
O sistema público de saúde do Brasil lidera o ranking mundial, com o maior número de transplantes realizados. A conquista foi possível após a criação de Lei n° 9.434 de 4 de fevereiro de 1997, que passou a permitir a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo para fins de transplante e tratamento.
Em alguns casos, o transplante ocorre ainda em vida, quando o doador é o responsável pela anuência da transferência. Em outras situações, ela pode ocorrer depois do falecimento da pessoa, e nesse caso a família é responsável por dar a liberação.
Uma história emocionante de doação em vida é a de Maristela Carvalho, 54 anos, mãe de Ethiane Magda Prestes, 38 anos. A autônoma, moradora da cidade de Garibaldi e natural de Santo Ângelo, doou um rim para sua filha no final do mês de junho deste ano.
Ethiane foi diagnosticada com diabetes aos 13 anos e, desde então, foram anos de luta constante. Em 2008, aos 14, teve um foco de infecção e os médicos demoraram para descobrir que a causa. A colecistite, doença diagnosticada na época, consiste em uma inflamação da vesícula biliar, geralmente decorrente da obstrução do duto cístico provocada por um cálculo.
Ela foi internada no Hospital Tacchini, em Bento Gonçalves, e depois encaminhada para o Hospital Pompéia, em Caxias do Sul, para a realização de um exame, quando teve duas paradas cardíacas. “Os médicos me falaram que ela só tinha 1% de chance de sobrevivência. Ficou por quase 40 dias na UTI (Unidade de Terapia Intensiva). “Nunca perdi a esperança e a fé”, lembra Maristela.
Após esse período, mais uma luta às esperava: a insuficiência renal. A mãe conta para a reportagem do Jornal Semanário que, em 2009, iniciaram as consultas no complexo da Santa Casa de Porto Alegre, e foi neste momento que o médico cogitou a possibilidade de um transplante, o qual poderia ser de um doador pós-vida ou de uma pessoa viva, que fosse compatível e se propusesse a fazer a doação. “Sem pensar duas vezes, disse que seria a doadora”, conta.
Juntas, mãe e filha iniciaram a realização dos exames, mas nesse meio tempo, mais uma boa notícia: o rim da garota estabilizou e não houve a necessidade do transplante na época. Somente no início de 2022, a equipe médica descobriu que os rins estavam parando e ela precisou começar o processo chamado hemodiálise, no qual uma máquina filtra e limpa o sangue, fazendo parte do trabalho que o rim doente não pode fazer.
O médico que acompanhava Ethiane na Santa Casa, disse que o transplante seria a melhor solução e, novamente, a mãe se ofereceu como doadora. “Realizei todos os exames e deu tudo certo”, recorda Maristela.
No dia 29 de junho, foram para Porto Alegre, e Ethiane foi internada no Hospital Dom Vicente Scherer. No dia seguinte, 30 de junho, foi realizado o transplante. A cirurgia foi um sucesso e o rim já começou a funcionar no momento em que foi implantado.
Durante a entrevista, Maristela se emociona e agradece a todos os profissionais da saúde que estiveram presentes e que foram essenciais para esse acontecimento tão importante na vida de sua filha. “Aos médicos, enfermeiros e todos envolvidos, minha gratidão eterna. A todo momento, muito atenciosos, cuidadosos e nos deram o seu melhor dentro das suas profissões, verdadeiros anjos de Deus!”, ressalta.
De acordo com a doadora, as duas estão bem, se recuperando na casa de parentes, no interior de Garibaldi. “Tivemos o apoio da família e de muitos amigos, pessoas que nem nos conheciam pessoalmente estavam fazendo corrente de orações, novenas e promessas. A fé de todos e o nosso amor venceram mais essa batalha. Minha filha é um exemplo de força, nunca desistiu e sempre passou por todos obstáculos crendo no melhor, ela é o verdadeiro significado de guerreira’, afirma.
Maristela também lembra a todos sobre a importância de ser doador de órgãos. “O fim pode ser algo bom, pode ser o começo para outro que luta e espera por isso todos os dias”, finaliza.
Doação de Órgãos em Vida
Atualmente, não é mais necessária a manifestação por escrito sobre o desejo de ser um doador de órgãos, basta informar sobre a escolha, preferencialmente para os familiares mais próximos.
Todos são doadores em potencial. Poucas são as situações que impossibilitam a doação, como casos de câncer avançado. Portanto, a grande maioria das pessoas pode ser doadora.
Em vida, pode-se doar alguns órgãos, como um rim, parte do fígado, parte do pulmão ou a medula óssea. Contudo, esta doação depende de compatibilidade genética e, em geral, é realizada entre parentes próximos.
Já quando ocorre morte encefálica, podem ser doados os rins, coração, pulmão, intestino, fígado, ossos, córneas e pele. Ela acontece quando há parada definitiva do encéfalo, que é o cérebro e tronco cerebral, provocando assim, a falência de todo o organismo. Poucos pacientes terão critérios de exclusão devido à própria doença que levou ao óbito. Contudo, a imensa maioria poderá doar, desde que autorizado pelas suas famílias.
A enfermeira e coordenadora da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante (CIHDOTT) do Hospital Tacchini, Ana Turmina, conta que a Comissão tem como missão implantar e promover ações integradas, conforme diretrizes do Ministério da Saúde. “Para incentivar e divulgar a doação, nós realizamos campanhas, palestras em empresas e escolas, entrevistas, além da venda de camisetas e moletons em nome do Hospital Tacchini”, finaliza a enfermeira.