Com a chegada do inverno, as temperaturas caem e, paradoxalmente, a umidade dentro de casa pode aumentar, criando um ambiente propício para a proliferação de mofos e bolores. Mais do que um problema estético, essa dupla indesejável representa uma ameaça silenciosa à saúde dos moradores e à integridade da estrutura do imóvel.

O que é mofo
De acordo com a Doutora em Biotecnologia Marli Camassola, professora de biotecnologia da Universidade de Caxias do Sul (UCS), os mofos são fungos microscópicos que se reproduzem por conídios (vulgarmente também chamados de esporos). Eles costumam crescer em ambientes com pouca ventilação e úmidos. “No inverno, as pessoas costumam manter portas e janelas fechadas para conservar o calor, o que reduz a ventilação e aumenta a umidade interna, criando um ambiente ideal para o crescimento desses fungos”, explica ela.
Além da ventilação, outro fator que contribui para a formação do mofo, segundo Marli, são: “vazamentos ocultos ou infiltrações, roupas úmidas secando dentro de casa e temperatura interna mais elevada que a externa, favorecendo a condensação em paredes e a retenção de umidade”.

Marli Camassola, professora de biotecnologia da Universidade de Caxias do Sul (UCS)

Tipos de mofo
Segundo Marli, existem três tipos de mofos mais comuns de se encontrar em residências, sendo eles:

  • Aspergillus: comum em poeira e sistemas de ventilação. Em casa, pode ser encontrado em cortinas, colchões, sistemas de ar-condicionado e paredes úmidas. Pode desenvolver-se nas vias aéreas, especialmente em pessoas com o sistema imunológico comprometido. Sua coloração é preta (A. niger) e amarelo-esverdeada (A. flavus).
  • Cladosporium: aparece em tecidos, madeira e superfícies úmidas; pode desencadear alergias. É tolerante a baixas temperaturas (cresce a 4°C). Possui pigmentação oliva a marrom-escuro.
  • Stachybotrys (“mofo preto”): cresce em materiais celulósicos muito úmidos (gesso, papel); associado a problemas respiratórios graves.
  • Penicillium: cresce em geladeiras, pães, frutas e cantos de paredes externas. Coloniza superfícies frias (até -5°C em freezers). Possui coloração azul-esverdeada.

Como saber se a casa apresenta mofo
Além da umidade visível, existem outras formas de saber se a residência tem mofo, como:

  • Cheiro forte e característico de “mofo”, causado por compostos orgânicos voláteis liberados pelos fungos. Muitas pessoas têm alergia a esses odores devido às substâncias que estão presentes;
  • Manchas escuras em cantos, tetos ou atrás de móveis;
  • Pintura descascando ou bolhas nas paredes;
  • Reações alérgicas frequentes em moradores (espirros, tosse, irritação nos olhos);
  • Manchas brancas em roupas.

Como prevenir
Os mofos podem ser evitados, como explica Marli, a partir de algumas medidas tomadas, tais como:

  • Aumentar a ventilação (abrir janelas opostas por 10-15 minutos por dia);
  • Usar desumidificadores ou aquecedores com função de secagem;
  • Usar absorvedores de umidade do ar à base de cloreto de cálcio, ideais para áreas pequenas (armários, baús) por sua alta capacidade higroscópica (absorvem cerca de 200% do próprio peso em água). No entanto, é preciso ter cuidado, pois o líquido resultante é corrosivo;
  • Sílica gel: eficaz em eletroeletrônicos e pequenos espaços, com a vantagem de ser reutilizável após secagem em forno (150°C por 2h).

Importância da ventilação
É fundamental adotar estratégias inteligentes de ventilação que garantam a circulação do ar sem sacrificar o aquecimento. Para isso, algumas práticas simples podem fazer toda a diferença. “Para garantir uma ventilação adequada durante o inverno sem perder muito calor, recomenda-se adotar uma ventilação rápida e eficiente, abrindo totalmente as janelas por cerca de 10 minutos, preferencialmente pela manhã e após o banho ou preparo de alimentos. É indicado abrir apenas um cômodo por vez, para minimizar a perda de calor em toda a casa. Também é útil utilizar exaustores ou sistemas de ventilação mecânica controlada em áreas críticas, como banheiros e cozinhas. Manter as portas internas abertas ajuda a promover a circulação do ar entre os ambientes. Além disso, o uso de desumidificadores pode ser uma estratégia eficaz para controlar a umidade do ar e prevenir o surgimento de mofo”, salienta Marli.

Desumidificadores
Os equipamentos, ao contrário do que muitos pensam, são eficazes, ajudando no controle da umidade relativa do ar dentro de casa, evitando, assim, mofos. “Os modelos com capacidade de 10 a 20 litros por dia são ideais para residências médias. Eles ajudam a manter a umidade relativa do ar entre 50-60%, ideal para evitar mofo. Devem ser usados especialmente em banheiros, quartos e porões. Claro que sempre é preciso verificar se o equipamento dá conta de retirar a umidade do espaço”, enfatiza Marli.

Como remover mofos
Muitas vezes os mofos aparecem sem que as pessoas os vejam, e isso faz com que procurem alternativas para tirá-los. “O mofo visível deve ser removido com um pano umedecido em uma solução de água sanitária diluída (uma parte de água sanitária para três partes de água) ou com vinagre branco puro. Após a aplicação, é importante deixar o produto agir por cerca de 10 minutos e, em seguida, secar bem a superfície. Deve-se evitar misturar produtos químicos, como água sanitária com amônia, pois essa combinação libera gases tóxicos. Além disso, pintar sobre o mofo sem removê-lo adequadamente apenas encobre o problema, sem resolvê-lo. Em casos de superfícies porosas, como madeira, pode ser necessário lixar o material para eliminar os fungos que já penetraram nas camadas internas”, explica a especialista. Segundo ela, é de extrema importância a utilização de equipamentos de proteção, tais como:

  • Luvas
  • Máscara
  • Óculos
    Quando a proliferação de mofo é recorrente, ela orienta procurar ajuda de um profissional. “É recomendado buscar ajuda profissional se o problema estiver afetando áreas estruturais da casa, como paredes, tetos ou elementos de madeira. Também é necessário buscar auxílio técnico quando o mofo estiver associado a problemas respiratórios graves entre os moradores, ou ainda se houver suspeita de infiltrações, vazamentos ocultos ou falhas no isolamento térmico que favoreçam o acúmulo de umidade”, salienta.

Mitos sobre mofo
De acordo com a biotecnóloga, existem alguns mitos sobre o mofo que são importantes desmistificar, tais como:

  • “Mofo só aparece em casas velhas” – Falso. Casas novas e bem fechadas também acumulam umidade;
  • “Basta pintar sobre o mofo” – Errado. Isso apenas o esconde temporariamente;
  • “Mofo é só estético” – Não. Pode causar problemas respiratórios, alergias e intoxicações;
  • “Ar-condicionado elimina umidade”: nem sempre. Apenas os modelos com função “dry” (modo desumidificador) são realmente eficazes na redução significativa da umidade do ambiente. Além disso, é fundamental realizar a limpeza e a manutenção regular dos filtros do ar-condicionado, tanto em residências quanto em veículos. Esses filtros acumulam umidade, poeira e esporos de fungos, criando um ambiente ideal para o desenvolvimento fúngico. Quando negligenciados, podem se tornar fontes importantes de contaminação por fungos no ar, afetando diretamente a qualidade do ambiente e a saúde dos ocupantes.

Como o mofo pode prejudicar a saúde
Longe de ser apenas um problema estético ou um mero indicativo de falta de limpeza, esse fungo silencioso representa uma séria ameaça à saúde, capaz de desencadear e agravar uma série de doenças. Suas manchas escuras e o cheiro característico são apenas a ponta do iceberg de um problema que pode comprometer o bem-estar de toda a família.
De acordo com o médico Dagoberto Vanoni de Godoy, Médico Pneumologista e Professor adjunto do Curso de Medicina da Universidade de Caxias do Sul (UCS), os mofos podem estar diretamente ligados a problemas respiratórios. “As principais doenças e condições respiratórias associadas à umidade e mofo na Serra Gaúcha (RS) são a rinite alérgica, asma brônquica, sinusites de repetição, infecções virais (resfriados e gripe), bronquites e pneumonias bacterianas. A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), composta por enfisema pulmonar e bronquite crônica, tende a ter piora dos sintomas (tosse, expectoração, falta de ar) no inverno úmido, com mais infecções e exacerbações”, explica Godoy.

Dagoberto Vanoni de Godoy, Médico Pneumologista e Professor adjunto do Curso de Medicina da Universidade de Caxias do Sul (UCS)


Segundo o médico, estudos locais indicam que a região pode ter mais quadros de problemas respiratórios. “Registros de serviços de saúde e relatos epidemiológicos indicam que rinite alérgica e asma são significativamente mais prevalentes na região da Serra Gaúcha do que na média nacional, justamente pela combinação de: alta umidade ambiental, presença constante de mofo e ácaros, ambientes fechados no inverno, construções pouco ventiladas e com isolamento térmico precário”, enfatiza.
Ambientes internos úmidos e com pouca ventilação podem impactar significativamente a qualidade do ar, prejudicando assim a saúde. “Níveis de umidade relativa do ar acima de 60–65% favorecem a proliferação de mofo e de ácaros. Pode haver diminuição drástica da renovação de oxigênio. A falta de ventilação intradomiciliar adequada leva ao aumento de dióxido de carbono (CO²), monóxido de carbono (CO) e de partículas alergênicas”, de acordo com Godoy.

Grupos de risco para as doenças
Segundo o especialista, os principais grupos são as pessoas que estão nos extremos da vida: bebês, crianças e idosos. “Os pacientes afetados por doenças respiratórias ou cardíacas crônicas (asma, rinite alérgica, sinusites, bronquites crônicas, DPOC, insuficiência cardíaca, hipertensão arterial sistêmica e arritmias) e por condições que causem imunodepressão (quimioterapia para câncer, transplantados, pessoas com HIV/AIDS ou em uso de medicamentos imunossupressores) também estão entre as pessoas mais ameaçadas. Além disso, mulheres gestantes também são mais suscetíveis a esses efeitos nocivos”, salienta. Os principais sintomas, como explica o pneumologista , são: “ tosse persistente, seca ou produtiva, espirros, chiado no peito ou falta de ar, crises de asma, rouquidão ou dor de garganta recorrente”, pontua.

Sintomas
Segundo o médico, as manifestações dos sintomas podem ser variadas:

  • Olhos vermelhos, ardência ou coceira ocular persistente;
  • Coceira sem lesões aparentes, urticária ou erupções cutâneas, especialmente em locais de dobra como o pescoço e as axilas;
  • Fadiga crônica;
  • Irritabilidade;
  • Ansiedade;
  • Alterações de humor.

Roupas mofadas podem ser utilizadas?
A proliferação de mofo em ambientes internos pode afetar diversos tecidos, tornando-os igualmente mofados e prejudiciais à saúde. “Quando a mancha persiste após a lavagem, isso pode significar a presença de esporos viáveis ou fragmentos fúngicos. Dependendo do tipo de lavagem, podem permanecer esporos vivos, fragmentos de hifas ou proteínas alergênicas, que ainda são biologicamente ativas, mesmo que o fungo não esteja mais crescendo. Mesmo que os fungos estejam mortos, podem ser liberados fragmentos deles. Esses fragmentos são suficientes para desencadear reações alérgicas, crises de asma, rinite e dermatite em pessoas sensíveis. Portanto, roupas com manchas persistentes após lavagem podem representar risco, especialmente para pessoas com asma, rinite alérgica, dermatite atópica ou DPOC”, explica o médico.
Ao contrário do que muitos pensam, caso a peça apresente mau cheiro e manchas, especialmente em tecidos com contato direto com a pele, o indicado é descartar. “A continuação do uso pode causar crises respiratórias recorrentes ou problemas dermatológicos crônicos”, conclui Godoy.