Líderes empresariais enxergam os jovens como empolgados e conhecedores de tecnologia, mas acreditam que falta entrosamento com os mais experientes
A linguagem é altamente tecnológica, as gírias estão presentes na maior parte dos diálogos, juntamente com abreviaturas e figuras. Assim é a comunicação da chamada “Geração Z”, formada por jovens gerados entre o fim da década de 90 e 2010. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), em 2019, este grupo representava cerca de 31,5% da população mundial e se destaca especialmente por serem mais adeptos ao uso de novas tecnologias, o que é indispensável na configuração globalizada.
Embora conhecedores dos avanços tecnológicos, de sistemas e equipamentos moderno e extremamente úteis e importantes para o avanço das empresas, cerca de um terço destes jovens, que se encontram na faixa dos 20 anos, tem dificuldade de se expressar verbalmente, desconhece as funções que deverá desempenhar no mercado de trabalho e sofre com a falha na comunicação, geralmente de responsabilidade do gestor.
Ainda conforme a ONU, essa geração apresenta um rápido modelo de se desenvolver no dia a dia, cumprindo as atividades com facilidade e tem uma grande flexibilidade para atuar em diferentes cargos, ao mesmo tempo que possuem uma dificuldade de se adaptar às mudanças organizacionais, uma vez que foi condicionada ao mundo virtual.
O que se percebe claramente é que a Geração Z já está impactando a cultura organizacional de diversas empresas. “É uma geração extremamente diferente, audaciosa em um sentido e não em outro. É completamente diversa ao que estamos acostumados”, destaca o presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Bento Gonçalves, Juarez José Piva.
O Presidente salienta que a maior dificuldade encontrada ao trabalhar com estes jovens é o conflito de interesses entre as gerações. “A antiga gostava mais de fazer, de crescer, de desenvolver, assumir liderança, questionar. Quanto maiores os desafios, melhores as oportunidades. Já a Geração Z não está muito preparada a enfrentar desafios, desistem com facilidades, não têm aquela ânsia pelo crescimento profissional. São pessoas que pensam um pouco mais na vida, diferentemente de nós, que tínhamos o desejo de acumular e crescer. Esta é uma das barreiras no relacionamento. Por outro lado, são muito criativos e têm uma visão diferente do mundo. Creio que tudo fluiria melhor se ouvissem um pouco mais, se fossem mais receptivos à geração mais antiga, o que proporcionaria o crescimento de ambas”, acredita.
À medida que essa geração ingressa no mercado de trabalho, se torna clara a necessidade de que as estruturas estejam preparadas não somente para a chegada, mas principalmente para a integração. Embora a Geração Z compartilhe algumas características com as gerações mais antigas, ela também apresenta novos padrões de comportamento. Portanto, os gestores precisam compreender não apenas a melhor forma de gerir jovens inexperientes, mas também as características únicas desta geração moldada pelas suas experiências ou inexperiências.
O presidente da Associação das Indústrias de Móveis do Estado do Rio Grande do Sul, Euclides Longhi, destaca a rotatividade nas empresas como uma problemática que precisa ser resolvida. “Segundo dados do Ministério do Trabalho, profissionais de 18 a 24 anos têm uma média de apenas nove meses de permanência nas empresas. É um comportamento bastante diferente das gerações anteriores, que mantinham visão de longo prazo e almejavam uma carreira construída por etapas, subindo um degrau de cada vez conforme adquiriam experiência. Agora, com frequência, os empregadores precisam buscar profissionais para preencher vagas, realizar treinamentos. É compreensível que a Geração Z veja a impermanência como algo positivo, no sentido de experimentar diferentes áreas e ocupações, mas o mercado de trabalho exige dedicação e compromisso para avançar fase a fase”, pondera.
Longhi afirma, ainda, que as empresas precisam se adaptar à realidade e criar mecanismos atrativos para este público. “As empresas ainda estão se adaptando a essa realidade mais dinâmica trazida pela Geração Z, por isso a importância de uma equipe de RH bem estruturada, atenta aos movimentos do mercado de trabalho para tornar o ambiente profissional receptivo e colaborativo, integrando novos e antigos colaboradores”, diz.
Para a presidente do Sindicato das Indústrias do Mobiliário (Sindmóveis), Gisele Dalla Costa, já durante a pandemia, o distanciamento social mostrou que muitas funções podem ser desempenhadas de casa, sem necessidade de deslocamento até o local de trabalho. “Se por um lado o home office facilita o dia a dia de muitos profissionais, por outro, dificulta os relacionamentos entre colegas. Já faz alguns anos que as novas gerações evitam contatos mais espontâneos, como telefonemas e até mesmo encontros presenciais, mas acontece que as trocas entre pessoas são essenciais para a integração da equipe”, comenta.
Embora a falta de entrosamento, Gisele vê pontos positivos na Geração Z e acredita que os dois públicos são extremamente importantes para as empresas. “Entre as características positivas que encontramos nos profissionais da Geração Z estão agilidade, facilidade para utilizar tecnologias e proposição de ideias. É muito importante termos pessoas jovens e mais velhas atuando em parceria nas empresas, porque essas trocas permitem reavaliar processos, estratégias, posicionamento, mix de produtos e até mesmo impulsionar a inovação”, garante.
Administrando o tempo entre o trabalho e o estudo
O jovem Lian Razador, 23 anos, trabalha com o pai desde que completou 17 anos, e divide o tempo com a atividade de monitor em um cursinho pré-vestibular e as aulas a que se dedica para ingressar na tão sonhada faculdade de Medicina.
Seu dia inicia muito cedo, por volta das 5h ou 5h30min da manhã, quando acorda para estudar, antes mesmo de tomar café e se dirigir à sede do cursinho que frequenta há cinco anos, em um esforço para estar entre os melhores alunos e conquistar uma vaga para Medicina através do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), ou então com aprovação numa universidade federal.
No mesmo local, Razador atua como monitor, auxiliando na parte tecnológica, com a gravação das aulas, organização das salas e suporte aos professores e alunos. Com o pai, o jovem utiliza aplicativos de celular para emissão de pedidos, notas fiscais e resolução de problemas administrativos e contábeis.
“No cotidiano, a tecnologia exerce grande influência no que faço. A facilidade de poder resolver assuntos burocráticos é de extrema importância. Atualmente, a grande ferramenta de trabalho que utilizo é o celular, seja por intermédio de aplicativos para conversar com clientes ou pessoas da empresa, bem como outros, essenciais para o desenvolvimento do meu trabalho”, conta.
O jovem frisa que o pai tem dificuldades em lidar com as tecnologias, então, sua atuação diante dos negócios se torna ainda mais relevante. “Como auxiliar administrativo, resolvo as questões com agilidade e ajudo meu pai que tem dificuldades em utilizar a tecnologia. No meu dia a dia recebo muitos elogios, pois mesmo tendo pouca idade, sou responsável, simpático, comprometido, porque começo e concluo o que faço. Não deixo nada pela metade, cumpro horários e obrigações. Ouço de muitas pessoas que isso é raro na minha geração e vejo que, realmente, falta esforço entre os jovens, que querem que tudo seja fácil. Nada na vida é fácil. Tudo é uma construção. Falta paciência, persistência, diálogo, falta saber lidar com as pessoas mais velhas. Falta também saber lidar com questões burocráticas, contabilidade, legislação. Resumindo, falta muita coisa”, conclui.
Mais de 10% da população brasileira é da geração Z
Segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população brasileira entre 15 e 29 anos ultrapassa os 21,1 milhões de pessoas. É nessa faixa etária que se encontra a Geração Z, composta por indivíduos nascidos entre 1997 e 2010, representando mais de 10% dos 203 milhões de habitantes do país. Estes jovens estão em fase de transição para o mercado de consumo, sendo estudantes, universitários, recém-formados ou em busca de oportunidades profissionais e novas experiências.
O mercado tem direcionado seu foco para esse público com razão. O Relatório de Economia Bancária do Banco Central revela um crescimento de 50% na abertura de contas bancárias por jovens entre 15 e 24 anos ao longo da última década. Esse aumento coincide com o surgimento e a expansão dos bancos digitais, que se beneficiaram do fato de a Geração Z ser composta por nativos digitais, familiarizados com as tecnologias de informação e comunicação.