Presidente do Simmme-BG aborda sua trajetória profissional, dificuldades e conquistas do setor, bem como sua visão sobre tecnologia, a cidade e expansão industrial
O empresário e presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Bento Gonçalves (Simmme-BG), Juarez José Piva, tem uma ampla trajetória na comunidade. Formado em administração, Piva começou a trabalhar como entregador de jornal. Posteriormente, após atuar por 16 anos em uma empresa, fundou em 1989 a Piva Comércio e Indústria LTDA, que fabrica acessórios de alta qualidade para móveis.
No sindicato, Piva já atuou como diretor, vice-presidente e está à frente da entidade como presidente há 15 anos, desde 2007, estando em seu quinto mandato.
Principais conquistas
Foi um trabalho, com uma bela diretoria, que fizemos grandes realizações, principalmente a defesa e a construção do setor; o desenvolvimento da nossa região, especialmente pela diversidade de empresas e uma tecnologia diferente. Trabalhamos em uma cultura de inovação, até pela necessidade de mudarmos um pouco o perfil do setor metal mecânico, que é sobre rodas, quando falamos do automobilístico, e fomos criando uma nova cultura de envasamento, que nos deu um leque grande de oportunidades.
Hoje, no envase, vemos empresas para tanques, para o setor vinícola, para o segmento de bebidas, de água, de produtos químicos, entre tantas outras variedades. Isso foi uma bela experiência e nós continuamos lutando por isso. Construímos também a nossa sede, que é um belo exemplo para Bento Gonçalves e principalmente para os colegas de outros sindicatos, que vem aqui se espelhar, isso é muito interessante que o nosso associado possa aproveitar toda essa infraestrutura.
Participação na FIERGS
Fui convidado a fazer parte da FIERGS (Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul) e já fazem anos que faço parte da diretoria e hoje sou o secretário. Acho que toda representatividade em uma federação, onde discutimos todos os setores, é importante. Muitos falam que precisamos pensar só na economia, mas temos diversos problemas que estamos discutindo, como as NR’s (Normas Regulamentadoras), a fiscalização, a tributação, a exportação, que ainda continua com muita burocracia, e temos ainda um empecilho sério de Dumping, que estamos brigando e mostrando que está errado.
Temos outro problema sério que o mercado todo foi tão enraizado em proteções, que o setor industrial ainda padece de alguns anos de liberação. Nós tivemos alguns avanços, em fazer mudanças, realizar uma evolução no sistema trabalhista, que deu uma oportunidade entre os colaboradores e os empregadores discutirem aquilo que é interessante para cada um, e isso também é uma cultura que vamos precisar amadurecer.
Objetivos
Temos diversos objetivos. Há anos viemos lutando por uma reforma tributária, que começamos a defender em 2008 e não saímos do papel. Temos uma estrutura de impostos mantida em cima da indústria e isso dificulta o investimento, a inovação, a tecnologia. Existe ainda um processo de alteração, desse emaranhado de complicações. Conseguimos tirar muitas coisas que estavam lá desde 1950, para simplificar e assim mesmo ainda temos muito o que mudar.
Temos, também, um problema de incentivo à inovação. Uma grande meta nossa é entrarmos mais nas universidades, para que elas saiam de suas instituições e venham realmente para a comunidade. No entanto, um dos principais objetivos do sindicato, é realmente fortalecer o setor industrial, para que possa crescer, fazer uma distribuição de rendas fortes, propícias, com desenvolvimento humano. Que nossos associados cresçam, tenham conhecimento e a expertise de se tornar o empreendedor do seu próprio negócio.
Principais dificuldades
Temos enfrentado problemas do dia a dia, na verdade continuamos ainda com coisas pequenas e que já podiam ter sido superadas pelos nossos setores, que ainda ficamos presos a uma consciência, a uma cultura, a uma desinformação. Precisamos que uma mudança aconteça no setor empresarial e automaticamente junto com nossos colegas trabalhadores, possamos evoluir em todos os sentidos.
Tenho notado nos últimos anos, no nosso caso aqui que temos um envolvimento grande, que o próprio sindicato dos trabalhadores está preocupado para que os colaboradores fiquem cada vez mais formais, se tornem empreendedores, se nota essa consciência que precisamos ter esse passo a mais. As vezes discutimos o salário, mas ao mesmo tempo já discutimos como ele pode progredir nisso. Notamos essa consciência por parte do sindicato, mas esbarramos um pouco no colega que está conosco, porque as vezes oferecemos curso, palestras, e ele não se engaja em participar.
Falta de mão de obra
Realmente a gente vem percebendo a falta de profissionais, ao ponto que já existe um movimento de voltarmos a contratar as pessoas com mais de 50 anos, que já têm uma cultura que se formaram, trabalharam, procuraram, do que os mais jovens, que daqui a pouco ficaram muito mais estagnados, ou pela facilidade da informação, ou vivem muito conectados na tela do celular e aí as oportunidades passam na frente e ele fica presos em seu aparelho telefônico.
Temos discutido na FIERGS, que falta alunos no SENAI, falta gente no SESI, para que estudem, progridam. No SENAI, por exemplo, às vezes conseguimos fechar a turma, mas não dá 15 ou 20 dias depois e ouvimos que “não é isso que quero”, “não entendo”, “é muito difícil”, e abandonam, simplesmente.
Estamos tentando fazer um trabalho sério para que as pessoas tenham um pouco mais de vontade, para que no primeiro desafio, na primeira dificuldade, não desistam, com toda a oportunidade que têm de aprendizado.
Há algum segmento que a carência de profissionais é mais acentuada?
Está em todos os setores da indústria, seja da alta à baixa tecnologia. Temos dificuldade para contratar auxiliares de produção, um projetista, um engenheiro, pessoas que tenham capacidade de liderança, de conhecimento, de não apenas o estudo da universidade, mas a prática, o enxergar, o viver uma transformação ou a criação de um produto. Parece que estamos um pouco desconectados, não conseguimos fechar a engrenagem no Brasil, infelizmente.
Tecnologia
É um paradigma ou uma reflexão que todos vamos ser atingidos por isso. De que forma? A tecnologia não tem mais volta. Discutimos, mas não estamos nos aprofundando no que está acontecendo no mundo. Literalmente no presente, não podemos dizer que ela será o futuro, porque é o hoje. A tecnologia, a informação, a vivência com esse conceito. A realidade se transformou e talvez não estejamos entendendo muito bem isso.
Digo que daqui a dois ou três anos, vamos ter um robô andando na fábrica e trabalhando junto com os outros funcionários. E quando falamos no conflito entre tecnologia e perda de mão de obra, entramos na questão que não temos mais ninguém para trabalhar. Tu falas com um agricultor, ele não consegue alguém para ajudar na poda. O produtor do pêssego, não consegue ninguém para fazer a colheita. O empresário não consegue funcionários para a fábrica. A dona de casa não consegue alguém para fazer, pelo menos uma vez por semana, uma limpeza. Então, a necessidade faz você achar uma solução.
Me lembro quando chegaram os primeiros computadores, foi um baque. E hoje alguém vive sem o computador? “Vai gerar desemprego”, era o que ouvíamos, mas na verdade gerou mais oportunidades em outros setores. As coisas mudaram, a tecnologia, a inovação, a pesquisa, a vontade, a criação, é a oportunidade de cada um de nós, desde que nos preparemos pra isso. Então, o sindicato e as entidades têm promovido debates, encontros, trazendo o máximo de conhecimento para que cada um possa fazer essa transição da melhor maneira possível.
Expansão industrial
Se pegarmos os últimos anos, principalmente a nossa região, em termos de desenvolvimento, de mudança de cultura e conceito, somos privilegiados. Estamos crescendo ano a ano. Temos uma série de dificuldades na indústria que nos impossibilita de avançar mais. Não queremos incentivo, queremos menos burocracia. Quando falamos em reforma tributária, não quer dizer que queremos parar de pagar impostos, queremos o inverso, precisamos de uma distribuição dos impostos que toda uma cadeia pague e não somente um segmento.
O setor industrial automaticamente quando paga imposto, quando ele faz o custo do produto, ele coloca lá, e quando compramos um carro, uma TV ou uma máquina de lavar roupa, quem está pagando somos nós consumidores. Com isso, não somos competitivos no mercado internacional e temos uma carga tributária que é mais alta do mundo.
As amarras do setor precisam ser desfeitas e tenho certeza de que quando isso acontecer, vamos produzir muito mais, de forma mais econômica e principalmente vamos gerar mais imposto, não pelo percentual, mas pela larga escala de produção em que vamos ter no mercado.
Visão do setor em Bento
Temos uma capacidade diferente do resto do Brasil, que fez com que nos transformássemos naquilo que somos hoje: referência no mundo em envase. Como é que a gente começou a fazer isso? Pela vontade de criação. O empreendedor é um gênio por natureza. Ele tem a sua vocação, o seu desprendimento de fazer. Essa é a nossa cultura, a nossa vantagem dos demais setores do Brasil.
Se falarmos do Sul, principalmente da nossa região que começamos com a imigração italiana, sem nada, com fome, dificuldade para todos os trabalhos, sem ferramentas, com garra construímos a nossa região pela vontade e pela necessidade. Foi essa adversidade inicial que nos tornou em algo especial. Aqui, por diversas vezes já falamos que não temos estrutura para a mobilidade, nossos custos são altos, temos que trazer matéria-prima, às vezes, do Centro do país e depois devolver essa mercadoria. No Rio Grande do Sul, temos apenas um porto ainda, que está lá em Rio Grande, e trazer um container para cá tem um custo altíssimo para nós.
Paralela a toda essa dificuldade, com todas essas amarras persistentes aqui no Rio Grande do Sul, que a gente não consegue se soltar para ser criativo e se desenvolver, temos um potencial enorme, a nossa criatividade, a vontade, a expertise é o que mantém o Rio Grande do Sul cada vez mais forte. Temos um diferencial que é a vocação de empreendedores. Olha o nosso vinho, o turismo, as indústrias de móveis, o parque fabril metal mecânico, o comércio, a gastronomia, feito por quem, pelos trabalhadores.
As amarras do setor precisam ser desfeitas e tenho certeza de que quando isso acontecer, vamos produzir muito mais, de forma mais econômica e principalmente vamos gerar mais imposto, não pelo percentual, mas pela larga escala de produção em que vamos ter no mercado.
Infraestrutura da cidade
A infraestrutura é um gargalo que Bento Gonçalves e nossa região têm. Bento passou anos com a intenção de fazer uma perimetral, para pensar em um circuito viário para a nossa cidade, foi passando o tempo, foram diminuindo as ruas, e agora virou um gargalo, que realmente precisa de uma expertise muito grande, até diria que um bom estudo rodoviário tem que ser feito.
Temos melhorado bastante em termos de capacidade de internet, mas precisamos pensar também na qualidade de vida do cidadão, que isso automaticamente interfere na manutenção dos empreendedores. Quanto mais a gente vai evoluindo em termos de capacidade, de conhecimento e de finanças, em todo o ambiente que se encontra, você também quer um lugar onde pode viver tranquilamente com segurança, com saúde e com informação.
Bento está virando uma cidade de concreto?
Eu até não diria cidade de concreto, tenho medo que ela está ficando muito adensada. Isso me deixa muito triste em ver em uma cidade, porque ela ficou toda concentrada. Talvez no passado, devia ter sido feito um estudo para saber para que lado ela ia crescer, tendo um estudo de impacto das ruas, do esgoto, e aí ganharíamos muita área e muita qualidade.
Hoje ficou meio vago e se discute o assunto, onde todos tem razão e ninguém tem razão. Mas não vemos pessoas comprometidas a fazer um estudo de para onde vai Bento Gonçalves, porque se começarmos a construir prédios onde hoje temos as casas, logo vai ficar uma cidade de concreto.
Qualidade de vida
Eu diria que a cidade vai ter que caminhar para isso até porque a população vai exigir de cada um de nós essa transformação. Vai acontecer de qualquer maneira. Se as pessoas que têm essa facilidade ou a pertinência de fazer isso não fizerem, a comunidade vai cobrar. É pertinente ao ser humano de querer se transformar e, por mais demorado que vai acontecendo, ela vai caminhando para que tenhamos uma sociedade cada vez melhor. Precisamos mudar muita coisa, mas percebo que hoje as pessoas já estão mais preocupadas.
Algumas mudanças são necessárias, sim. Há alguns anos, tive a oportunidade de discutir, mostrei no meu plano de governo quando concorri a prefeito, de ter uma área verde grande, um parque realmente, já pensando no futuro para manter a arborização.
Temos a capacidade, daqui a pouco falta apenas sentar na mesa todas as pessoas que realmente têm uma vocação, uma inteligência, uma vontade de pensar no próximo e não em si, e fazer uma transformação que Bento tanto precisa.
Liderança sindical empresarial, qual é o maior ônus que recai sobre ela?
O maior ônus são as cobranças, às vezes por não entenderem e não participarem. Acho que o maior erro do empresariado e da sociedade é não participar de algo. No grupo dos pais e mestres dos colégios, porque o pai e a mãe não participam junto com os filhos na educação? Por que não vão na escola junto ajudar os professores a entender as dificuldades, os elogios, as pertinências, e ver quanto cresce uma criança quando você está lá presente? São particularidades que as pessoas têm que começar a viver. Nos sindicatos, os empresários não se deram conta, com a modernização trabalhista, a convenção que assinamos junto com os trabalhadores, que podem participar, que tem uma influência muito maior, que eles têm uma capacidade de discutir o futuro das empresas, dos colaboradores, da sociedade toda.
Como você vê o futuro dos jovens e qual conselho você daria pra eles?
Diria que eles têm uma oportunidade única. Eles têm uma capacidade, uma interlocução, o conhecimento, a facilidade, o intercâmbio, a troca de ideias, a vontade de fazer, vocês têm algo que nós não tivemos no passado. Tivemos bastante garra, força, e vocês podem ter a inteligência que daqui a pouco faltou para nós. Vocês têm um mundo pela frente se abrindo e se mostrando com novas tecnologias, com novas interferências, com gerências diferentes, com uma cultura de conhecimento.
Não caiam no primeiro desafio, não percam. Vocês acham que nós não caímos no meio do caminho? Continuamos caindo todos os dias e se levantando e dizendo, amanhã vai ser melhor. Aprendemos, apanhamos de novo. Na indústria, no comércio, em qualquer lugar, todo dia a gente aprende.
Diria que tenho inveja da época de vocês que tem essa qualidade de vida e essa facilidade que está disponível. Aproveitem isso. Deixem de lado tanto os celulares, comecem a ler. Então, estamos dando o mundo para vocês pouco engasgado de um lado, melhor no outro, mas com a ajuda de todos tenho certeza de que vamos transformar o Brasil em uma potência. Mas espero que nos ajudem muito com conhecimento, com abundância, com vontade e com garra.
Fotos: Reprodução/ Laura Kirchhof